tag:blogger.com,1999:blog-7498791.post4539082600273069059..comments2024-03-21T07:34:30.258+00:00Comments on Ler BD: Drawing on Tradition. Manga, Anime, and Religion in Contemporary Japan. Jolyon Baraka Thomas (University of Hawai’i Press)Unknownnoreply@blogger.comBlogger3125tag:blogger.com,1999:blog-7498791.post-51738967145129689572013-11-01T10:50:57.456+00:002013-11-01T10:50:57.456+00:00Caro José,
Confesso que tenho alguma dificuldade e...Caro José,<br />Confesso que tenho alguma dificuldade em seguir todos os pontos da tua argumentação, já que me parece haver alguns saltos menos claros. A ideia da "identificação" proposta por McCloud é a de que as personagens principais, quanto mais simples são, mais rapidamente nos sugam para o interior da história, e mais essa tal "identificação", que nunca é explicada cabalmente, tem lugar. O problema é que o processo a que se dá o nome de "identificação" nunca é explicado, e tendo em conta que ele tem sobretudo dois grandes significados de dois campos distintos, não se percebe: na psicanálise, "identificação" é um processo em que o analisando acaba por identificar-se como centro de todas as atitudes e palavras do analista, levando a projecções, confusões, malentendidos, etc., que devem e são utilizados no processo de terapia. É o único caso em que há, de uma forma simplista, uma confusão entre quem eu sou e outra pessoa. Na semiótica, porém, "identificação" tem simplesmente a ver com a economia dos meios: uma determinada personagem é principal porque aparece mais vezes, as acções são comandadas por ela ou gravitam em seu torno, há um maior tratamento de caracterização dela, e por aí fora. Por isso, mesmo que achemos mais fascinantes o Darth Vader do que o pãozinho sem sal Luke, é este último a personagem principal de "Star Wars". Ora, eu não "desprezo essa teoria", porque NÃO É UMA TEORIA. São apenas ideias confusas e simplórias, onde "identificação" quer dizer que os espectadores, leitores, etc., "vestem" as personagens principais como luvas, colocando-se no seu lugar. Mas sem qualquer explicação de como é que isto funcionaria. E, seja como for, isto não é totalmente verdade. Há uma gigantesca diferença entre empatia e simpatia, entre compreensão da diegese e confusão dos sentimentos. Quando vejo o "meu" herói a sofrer, nutro um forte sentimento pelo seu sofrimento, mas não sofro com ele. A narratologia cognitiva tem muitos estudos sobre estes mecanismos que não corroboram essa "teoria".<br />Volto a repetir: o McCloud tem lições importantes e esquemas extremamente iluminadores, mas tem outros aspectos que são mesmo muito fracos, como por exemplo a sua total falta de compreensão histórica, das necessárias contextualizações concretas de determinadas obras, da integração de mais exemplos alheios - em vez de os inventar ad hoc -, e de uma análise mais séria que não se entregue ao exercício, vão, de separar "forma" e "conteúdo".<br />Também continuo a não compreender totalmente a comparação ou uso do sermão, já que os seus recursos retóricos não têm nada a ver com os esquemas de que estamos aqui a falar, mais próximos de narrativas lineares, etc. <br />De resto, nunca virá a ser possível que contemos seja o que for sem retórica, já que esta não se limita a metáforas, expedientes ou embelezamentos: ela é a própria organização do discurso. Não existe sequer a possibilidade de um "discurso objectivo". Ou não seria discurso.<br />Haveria muito a debater, decerto, mas fico-me por aqui.<br />Obrigado pelas palavras.<br />Pedro Mourahttps://www.blogger.com/profile/13850102500313668884noreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-7498791.post-49919281317747425402013-11-01T08:52:45.575+00:002013-11-01T08:52:45.575+00:00Já agora, mais acrescento que o Scot McCloud infan...Já agora, mais acrescento que o Scot McCloud infantiliza ou nivela o leitor por baixo quando despreza a evolução e educação do gosto adquiridos pela multiplicação e diversificação de leituras feitas ao longo de uma vida. Será possível comparar, no meu caso particular, a identificação que encontro ao ler o ultrarrealista Harvey Pekar? Paralelamente a este argumento, o que dizer do desenho do mesmo Pekar pelos vários desenhadores? Devo sentir uma identificação crescente quando é desenhado pela Rebecca Huntington, pelo Crumb e depois pelo Chester? Ou devo sentir ambivalência de Cerebus entre os desenhos do Dave Sim e do Gerard? Seria necessário um novo gráfico tridimensional (tretadimensional, pelo trocadilho)que avaliasse essa distorção determinada pelo "estatuto" do leitor, ponderado pelo multiplicador do desenhador da personagem? Este axioma, em matemática, seria arrasado pela comunidade científica, pelo vezes para a qual não funcionaria. É natural que seja aceite como axioma pelos amadores, pelos comentadores, mas exige-se (percebo(-te)) uma maior elaboração por parte dos críticos da 9ª arte.<br />Prometo não voltar ao assunto.<br />JoséJosé Sánoreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-7498791.post-55250229566821334872013-11-01T00:25:21.708+00:002013-11-01T00:25:21.708+00:00Caro Pedro,
Ainda no seguimento do post e comentá...Caro Pedro,<br /><br />Ainda no seguimento do post e comentário anterior e nova referência ao "erro de identificação McCloud" (este apelido não pode ser por acaso :-), confesso estou muito baralhado e já não sei se terei interpretado muito mal a minha leitura do "Understanding Comics", pois compreendi na altura que a ideia que se pretendia transmitir era a de que a "iconização" da personagem permitiria ao leitor, através do distanciamento, atingir uma maior aproximação , não necessariamente da personagem em si, mas da verosimilhança da história ou, melhor ainda, uma maior eficácia na aceitação da mesma. Como no exemplo que dei do Santo António a pregar aos peixes, não é esse um caso em que “o uso eficiente e efectivo do exagero e da hipérbole ajuda a dissolver as fronteiras entre a personalidade da personagem e as do espectador"?<br />Podemos não concordar com esta "teoria da identificação", mas se, como dizes, J B Thomas escreve que aceita a máscara do "amigo" no 20th Century Boys como algo que providencia o afastamento que (lhe) permite o envolvimento na história, isso parece-me coerente com a interpretação da teoria e não uma falha de coerência na mesma.<br />A teoria nem é original, a mesma terá certamente sido utilizada para explicar técnicas de identificação noutras formas de expressão artística. Recordo-me, como exemplo, da banalização coreográfica da violência na 7ª arte, quer para os filmes do horror do "real/social", quer do do "ficcionado" ("Assassinos Natos" ou "Braindead", imensos outros). Lembro-me particularmente destes, porque na sala de cinema cheia eu devia ser uma das poucas pessoas que não ria, não porque não estivesse a apreciar os filmes, mas talvez por não me sentir confortável nesse processo de "identificação".<br />Penso, ou assim espero, compreender o teu desprezo muito justificável por esta teoria. Aceitá-la como regra, conforme é apresentada num gráfico em pirâmides de eixos cartesianos (se estou bem recordado), será sempre apontar um caminho redutor à produção de histórias de BD ou, já agora, de qualquer outra forma de expressão artística. Não precisamos que todas as histórias nos sejam contadas através de alegorias, parábolas e metáforas. Poderá o ego atingir um grau de emancipação, de secularização, face a estes expedientes litúrgicos de comunicação? Será o ideal de qualquer forma de expressão, a sua evolução final, o abandono do recurso aos mesmos? Seremos algum dia intelectualmente autossuficientes para que consigamos discutir valores e bem-estar social sem que precisemos de evocar personagens estranhas como peixes e santos e super-homens? (sim, poderemos também abandonar algum dia a retórica? :-)))))) <br />Mas se até Nietzsche usava metáforas...<br />Parabéns pela crónica e pelo teu talento e erudição, obrigado pelo teu blogue e pela generosidade com que o escreves. <br />Abraço,<br />JoséJosé Sánoreply@blogger.com