10 de dezembro de 2006
Fato de Macaco: o Símbolo. Rui Gamito (El Pep)
A personagem Fato-de-Macaco, de Rui Gamito, já havia sido apresentada numa outra história, publicada na colecção Lx Comics da Bedeteca de Lisboa (no. 8). Tal como esta aventura agora, O Símbolo, também essa outra era um pastiche dos mais variados géneros da cultura pop e pulp e até pimba. Mas se Fato-de-Macaco (Lx Comics) era um exercício relativamente linear e sem grandes sombras e projecção de significados, apenas o puro prazer de seguir a sequência, Fato-de-Macaco. O Símbolo, apresenta uma pequena dobra que o faz ganhar uma outra dimensão.
A personagem já parece querer dizer muito: precisamente por não dizer nada. Quer dizer, o corpo parece baseado numa mistura entre Conan, o Bárbaro, agentes secretos e o Bruce Willis de todos os filmes acerebrais que faz. Em O Símbolo, depara-se com a ameaça trazida por Ferdinand C. (baseado física e – a modo parcial – filosoficamente no Unabomber), e apenas lhe dirige ora questões, ora afirmações inócuas, ou frases banais de herói... O combate que se dá a punhos e explosões parece servir apenas de pirotecnia histriónica para sublinhar o erro de ambas as partes: as de Ferdinand C. em acreditar que é uma “revolução” que trará a consciência imediata a uma vida mais plena junto às pessoas, o herói, como todos os heróis, em querer manter o status quo (que parte de mãos misteriosas...) mesmo que isso lhe custe o seu próprio discernimento. O símbolo, afinal, é ubíquo e não esconde nada: a inércia das nossas vidas está arreigada a um ponto profundo.
Rui Gamito diverte-se, sem dúvida nenhuma, a criar esta história, pois ela, não se servindo do humor de um modo directo e não nos ofertando humor de uma forma clara, está toda sobre os signo do humor, e um humor que se esconde atrás do óbvio que nos distrai e apenas presenteia quem se esforça por vê-lo. Mais uma vez com a equipa de Virgin’s Trip, este livro sai com a chancela de el pep, mostrando o trabalho em consolidação de, talvez, o único verdadeiro atelier colectivo de banda desenhada do país. A parte de leão desta obra é de Gamito, todavia, e aqui ele deixa os seus largos contornos e traços, de uma aparente simplicidade e rapidez narrativa, serem preenchidos pelas cores e sombras de Rui Lacas, garantindo assim um maior peso à história apresentada. O excelente ensaio de Marte no final sublinha os aspectos panfletários que seriam possíveis, e parece-me acertar na mosca quando mostra, duvidando, o que Rui Gamito “quer mostrar”. É que não pode ser de um modo directo, correndo o risco de se soar um proselitista que além de incómodo é aborrecido; é preferível que seja feito como se se tratasse de uma brincadeira, de um rol de acção e furor de entretenimento, mas que mostra o seguinte: há algo que rebenta o mundo e no mundo para apenas mostrar, depois da poeira assentar, que pouco ou nada mudou. Pirotecnia em vão. Mas não a de Gamito.
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