O texto que se segue é da autoria
de Thierry Groensteen. Tendo nós publicado o nosso artigo sobre o último livro
de Renaud Chavanne, Composition de la bande dessinée, e a entrevista então feita, no mais recente número do International Journal of Comic Art, em inglês,
naturalmente, Groensteen teve acesso a ele. Nessa leitura, o teórico francês
apercebeu-se de incorrecções na discussão tida, e exerceu o seu direito à
resposta. É ela que se apresenta aqui em baixo. Traduzimo-la para inglês, para
que venha a ser publicada no próximo número do IJOCA, mas aproveitamos também para a disponibilizar junto ao nosso
público, considerando ser justo fazê-lo, ainda que não acrescentemos quaisquer
comentários, exceptuando esta nota inicial. Esperando que os mal-entendidos aqui
implicados não tenham sido suscitados ou agravados pela nossa má interpretação
ou intervenção, ficam as palavras de Groensteen.
“Na entrevista que
Renaud Chavanne deu a Pedro Moura, publicada no último número do IJOCA, o meu colega estabeleceu
paralelos entre a sua obra, Composition
de la bande dessinée (2010), e o meu estudo anterior, Système de la bande dessinée (1999).
“Uma vez que não me
reconheço totalmente na maneira como o Sr. Chavanne dá conta das minhas
propostas teóricas, desejaria providenciar aqui – sem qualquer polémica –
alguns esclarecimentos, e agradeço à redacção do IJOCA por acolhê-los.
“Para começar,
permito-me apontar o quão surpreendente é que Renaud Chavanne, no seu livro,
jamais faça referência aos conceitos propostos pelos seus predecessores que já
haviam estudado a questão da ocupação do espaço da página, em particular Benoît
Peeters e eu mesmo. Poderíamps esperar
que ele debatesse as nossas propostas, mas ele prefere reinventar o seu
aparelho teórico ex nihilo, como se
fosse a primeira pessoa a inclinar-se sobre o assunto.
“Já havia escrito
em Bande dessinée et narration (2011)
que achava lamentável que Chavanne tivesse escolhido o termo ‘composição’ para
designar aquilo que é usualmente chamado em francês de mise en page [lit. “construção da página”]. Essa escolha lexical
leva, com efeito, ao inconveniente de tornar essa palavra, composição, indisponível para designar a disposição de motivos no interior da imagem, a oposição de
massas, a organização de linhas de força, etc., que é o seu emprego usual.
“Na entrevista com
Pedro Moura, Chavanne dá a impressão de acreditar que ‘composição’ é o
equivalente daquilo que eu havia chamado de ‘espácio-topia’ [spatio-topie], e que a ‘mise en page’ é,
nos meus escrito, a transcrição concreta, para cada prancha, das escolhas que revelam
da espácio-topia. Essa apresentação, porém, não é de todo exacta. Para começo, a
espácio-topia não é, nos meus escritos, um conceito operacional. É tão-simplesmente
uma palavra composta, uma categoria abstracta que se propõe num momento
preciso, para ter em conta em conjunto
duas dimensões que são de diferente natureza: aquela do espaço (caracterizada
por um formato e uma superfície) e aquela de um lugar (que designa uma
colocação precisa na página e no livro). Como tentei demonstrar que essas duas
dimensões eram complementares, precisava de um termo que permitisse frisar essa
articulação. Daí, espácio-topia. Mas
para tudo aquilo que revela da organização da página (a que Chavanne chama de
composição), o meu conceito é realmente, desde o início, o da mise en page, o qual entra num paradigma
coerente com os outros dois conceitos que são a découpage [o “corte”] e a tressage
[o “entraçamento”].
“Eu falo do sistema
espácio-tópico quando examino, uma a uma, as unidades espaciais da linguagem da
banda desenhada: a vinheta, o balão, a página, porque com efeito estas
unidades, quando juntas, fazem um sistema.
“Em suma, na sua
apresentação das minhas propostas teóricas, Chavanne procura introduzir
confusão onde ela não existe.
“O ponto forte do
livro de Renaud Chavanne, a que me naturalmente curvo, é a magnífica
multiplicidade de exemplos de pranchas que ele convoca e analisa. É verdade que
Système de la bande dessinée tem
muitas poucas análises de caso. Mas essa é uma questão que, em primeiro lugar,
deveu-se a circunstâncias editoriais: a colecção que acolheu o meu livro não
costuma ter ilustrações nenhumas, e foi preciso batalhar para conseguir
introduzir uma dezena. (Foi o editor que escolheu colocar o meu livro nessa
série, não eu). De seguida, os objectivos dos nossos livros diferem (Chavanne
trata de uma questão precisa, ao passo que eu abordo questões bem mais
diversas). E finalmente, sobre o plano metodológico, eu acho mais interessante
regressar várias vezes sobre os mesmos exemplos para poder fazer leituras
parciais sucessivas que mostram tudo aquilo que se pode tirar de uma mesma
página de banda desenhada.
“Chavanne aponta o
facto de que eu não reciclei muito os meus próprios conceitos nos meus escritos
que se seguiram. Na verdade, faço a distinção entre obras teóricas, livros de
arte (L’Art d’Alain Saint-Ogan), e
obras de vulgarização (La bande dessinée,mode d’emploi), ou aquelas que se dedicam a um tema iconográfico preciso
(como o rosto humano no caso de Lignes de
vie). Penso que não seria muito elegante da minha parte forçar por todos
eles um arsenal teórico complexo que teria de explicar a cada passo. Mas ele
pode ficar descansado: eu sirvo-me deles quando a ocasião se proporciona ou
quando a necessidade se faz sentir. Por exemplo, no meu estudo de The Cage, de Martin Vaughn-James, eu
mostro como essa obra se constrói como nenhuma outra sobre a operação a que
havia chamado tressage, um conceito
sobre o qual, de resto, me encontro precisamente a escrever para um novo estudo
que a expandirá e explicará com maior clareza.
“Uma última
rectificação, para terminar: nunca fui director do CNBDI, mas apenas director
do Musée de la bande dessinée, que é um dos departamentos que compõem o CNBDI.”
Pedro näo tinhas nada melhor para postar aqui?
ResponderEliminarparecem aquelas mesquinhices do- sr- disse- que disse- que coisa mais chata e inútilmente teórica;
mise en page ou composition...
porquois pas? se o resultado final é sempre um composto?
pensa nos hibrídos
teóricos burocráticos...ide para o inferno com as vossas paraquestöes
Thierry Groensteen é aqui referencia constante...lá por escrever coisas enfadonhas sobre bd passou a papa?
Olá, Teresa.
ResponderEliminarNão sei muito bem como responder. Penso que não seguiste bem a conversa. A resposta de Th. Groensteen vem no seguimento de um artigo e entrevista que foi feita por mim, logo tenho uma parte de responsabilidade nesta situação. Tal como anteriormente, em relação ao que se passou entre Ann Miller e Éric Lanvanchy, coloquei aqui uma nota de explicações, é o que se passa aqui. Não tem a ver com o Groensteen ser um "papa", se bem que respeite muito o seu trabalho, como já notaste, pelo comentário.
Quanto ao inferno dos teóricos burocráticos com paraquestões... bom, não mostra ser o lerbd um espaço infernal mesmo? Mas se isto é assim tão unútil, enfadonho, etc., porque te irritas e perdes tempo a ler este texto? Vês o que que é, e avanças.
Mas isto vai continuar a ser um inferno... cada vez pior!
Pedro