27 de dezembro de 2013

Mar, Sombras e Bestial. AAVV (Pato Lógico).

A Pato Lógico já tem os seus livros a circular entre nós há algum tempo, e trata-se de uma plataforma que, em conjunto com outras (Planeta Tangerina, Bags of Books, Oqo, Bruáá, Kalandraka, Mini Orfeu, Tcharan, entre poucos outros) procura um rigor não apenas na criação dos seus objectos como na sua produção física, e mais, como algumas das citadas, está intimamente associada a princípios de auto-edição (no caso presente, associado ao veterano ilustrador André Letria), como forma de procurar um trabalho sustentado e correctamente respeitando os seus autores, numa significativa diferença de editoras mais convencionais, as quais, independentemente da quantidade ou “experiência”, têm procurado conformar-se mais a uma ideia generalizada de “mercados” e “estudos de marketing” do que se dedicarem genuinamente à criação de material original. Além do mais, também se parece aproximar de toda uma quantidade de elementos dispersos, estilísticos e narrativos, que têm pautado tendências contemporâneas, verificadas em porta-estandartes como a Nobrow ou a Anorak. A atenção para com aspectos de design, de escolha de materiais, de fabricação do livro, o entrosamento entre texto e imagens, mas também da beleza inerente das imagens que se coaduna a toda uma série de outras realidades da cultura visual (e não fórmulas “infantis”), e até os programas éticos do que é proposto, tornam estes livros em gestos cuidados, inteligentes e que aumentam a “massa crítica” e de qualidade do território.

Como havíamos dito a propósito do “guia” Children’sPicturebooks, de M. Salisbury e M. Styles, enquanto pais, educadores e até mesmo cidadãos de alguma forma preocupados com a educação das crianças, devemo-nos preocupar com o tipo de leituras, livros, objectos culturais a que elas têm acesso e pelos quais são conduzidas tanto quanto nos preocupamos com a sua alimentação, saúde e outras necessidades básicas. Esta discussão abre dois grandes problemas principais, quase evidentes. Por um lado, a questão de classe social, ou de enquadramento sócio-económico, uma vez que não nos podemos deixar esquecer que ao acesso ao livro é ainda largamente um privilégio de um número reduzido de crianças no mundo, e mesmo com a existência de programas de leitura e bibliotecas (o que nos deve pôr alertas para defender a rede das Bibliotecas Municipais de Lisboa) haverá ainda muito por batalhar. Daí a importância da dita “Declaração de Oxford” da World Literacy Summit. Ora isto complica-se ainda mais quando os preços dos livros de que temos falado são usualmente elevados (para as condições das famílias de classe média portuguesa), mas que são um garante da sustentabilidade do projecto editorial e autoral, tornando a concorrência de livros baratos em supermercados, grandes livrarias ou outros dispensários não apenas desleal como eticamente reprováveis, já que muitas vezes o trabalho estético, literário e dialéctico é, pura e simplesmente, nulo, por vezes sem sequer se atribuir a autoria dos desenhos, etc.

Mas por outro lado, e eis uma questão que menos do que paralela se entrosa na primeira, uma ideia debatida passionalmente, está a discussão sobre até que ponto as leituras (e a cultura em geral) influenciam os seus utilizadores. Sem querer entrar no imo dessa discussão, que implicaria mais conhecimentos do que podemos alguma vez aportar, apenas podemos sentir que a resposta se encontrará num equilíbrio de bom senso. Se toda e qualquer criança tem a sua própria personalidade e configuração cognitiva, e um qualquer grau de independência, inclusive intelectual, ela só pode medrar se tiver todas as condições para isso, desde físicas a culturais. Ora se for exposta sistematicamente a um universo contido de referências heteronormativas, socialmente conservadoras, ambientalmente irresponsáveis e culturalmente estreitas – que é o que ocorre “normalmente”, mesmo nos ambientes escolares (onde distribuir cromos do Noddy ou de futebolistas é visto como um processo de sociabilização normal e “natural”, mas levar uma criança a uma exposição de arte contemporânea num museu ou galeria ou a um concerto ao vivo de jazz é apodado de “presunçoso” e “seca”) -, não poderemos esperar que as crianças possam desabrochar como cidadãos mais bem preparadas para enfrentar o mundo real e diverso. Ver um documentário como Consuming Kids: The Commercialization of Childhood (Barbaro e Earp, 2008) é assustador, mas a compreensão de que durante o século XX existiram muitos projectos que expandiam, pelo contrário, as possibilidades de expressão, criatividade e liberdade das crianças (um projecto como Century of the Child, catálogo de 2012 do MoMA, pode ser um excelente antídoto e guia), é fulcral. Ora, estamos em crer que um projecto como o da Pato Lógico se encontra precisamente do lado desta “correcção” ou contributo.

Os três livros que nos são dados a ler são Mar, uma enciclopédia de entradas escritas por Ricardo Henriques, ilustrada por André Letria, e dois livros sem texto verbal de André da Loba e Marta Monteiro.

O primeiro livro integrar-se-á numa vetusta tradição da história do livro, inclusive passando pelos primórdios do que viria a ser chamado de “literatura infantil”, que são as enciclopédia visuais, e que remonta a 1658, ano em que Johannes Amos Comenius publicou aquele que é considerado o primeiro livro ilustrado para crianças, o Orbis Sensualium Pictus. A organização alfabética de Mar, as suas entradas relativamente curtas, uma paginação que convida à leitura esporádica, de consulta, e à mercê da busca livre, ajuda a essa vinculação. No entanto, a ausência de categorias claras que não a associação ao mar (temos espécies animais, termos náuticos, referências culturais, informações históricas e curiosidades mitológicas, palavras obscuras e pregões) e o tipo de humor empregue (como a possibilidade de um jogador de futebol que jogue ao mesmo tempo no Sporting e no Marítimo ser chamado de “leão-marinho”) vai inscrevê-lo ao mesmo tempo numa categoria mais aberta e fluida de livros infantis “pós-modernos”, isto é, conscientes da sua própria natureza e estrutura tradicionais, mas também das possibilidades de desvio delas.

Em que medida as ilustrações de Letria “aumentam” o que está previsto nos textos de Henriques? Na verdade, não será essa a relação estabelecida entre umas e outros. As primeiras surgem numa configuração e espacialização na página que recorda precisamente as “spot illustrations” de enciclopédias e dicionários. Além disso, há toda uma variedade de abordagens. Nem todas as entradas têm imagens, e se há um número substancial de imagens iconográficas, representando todo o objecto (animais, tipos de barco), Letria apresenta uma abordagem heteróclita. Existem imagens sequenciais, sobretudo para ilustrar uma qualquer experiência a tentar pelos leitores. Existem outras apresentadas em série para dar conta de uma diversidade de uma categoria, seja a sinalética de bandeiras ou o tipo de barbas de marinheiro. Algumas são apresentadas em acção, outras atingem mesmo níveis de grande espectacularidade (o Kraken), e outras ainda munidas de sinais infográficos que ajudam à navegação pelos pormenores informacionais. Algumas encontram-se bem centradas, num qualquer lugar ortogonal, outras parecem invadir a página ou dela se eclipsam. Uma vez que os textos também vogam por nomes próprios, nomes comuns, termos náuticos ou práticas e objectos (um poema, um prato, uma canção, uma terra, uma expressão), as relações das imagens vão assumir uma grande diversidade: instrutiva, explicativa, exemplar, irónica, anedótica. Letria emprega aqui duas cores, preto e azul, de uma forma muito equilibrada e mínima, parecendo usar técnicas de pochoir ou riscos de pastel grosso, mas possivelmente alteradas no tratamento digital posterior (ou que as cria, desde logo), que trazem uma qualidade muito gestual e texturada para imagens que se concentram na sua económica qualidade icónica de “dicionário”.

Se a enciclopédia recordará, até por razões etimológicas, uma noção cíclica, recorrente, a verdade é que ela é igualmente uma forma de progresso, do tal avanço cognitivo e cultural a que aventámos no início, para o qual os movimentos de Mar são uma potente energia. O seu formato imenso também implica um manuseamento especial, monumental, informativo, com a canga simbólica de algo que vai trazendo vários saberes.

Quer Bestial quer Sombras, respectivamente de André da Loba e de Marta Monteiro, parecem pertencer a uma mesma série, pelo idêntico formato. Eventualmente tratar-se-á de uma colecção aberta à colaboração com artistas diversos que possam apresentar um projecto monográfico congruente com o projecto geral da Pato Lógico. O livro de da Loba recorda duas coisas: os chamados imagiers, ou livros que coleccionam formas e objectos sem grandes comentários e servem para introduzir uma espécie de biblioteca de imagens básica para as crianças, e toda uma linha de desenvolvimentos de metáforas visuais, que atravessam a história da publicidade, da propaganda da primeira metade do século XX, até experiências mais concretas, dos posters cinematográficos polacos das décadas de 1960 e 1970 à obra de Brian Cronin. O que se apresenta aqui é um bestiário – o que por si só o liga a outra linha ainda - com dezanove animais, a esmagadora maioria deles apresentados em spreads, e apresentando um animal compósito com um objecto (um camelo com bossas em forma de montanhas nevadas, um dachshund-rio, um sapo com pernas de compasso), desenhados quase sempre em silhueta com pequenas intervenções pontuais (olhos, nariz, guelras, as manchas) ou o objecto cruzado em cores contrastivas. Desta forma, criam-se vívidas imagens impossíveis, que não buscam qualquer tipo de ilusão, mas bem pelo contrário encontros (quase) fortuitos que pretendem sublinhar a sua discordante natureza. E tal como no caso, já longínquo, do livro de Cotrim e Worm, O homem bestial, a palava do título do livro presente parece assumir ambos os sentidos possíveis na sua qualificação das criaturas.

Já no que diz respeito ao projecto de Marta Monteiro, é por demais clara a vontade em criar uma unidade mais narrativa entre as imagens. Se aquilo que surge aqui é uma colecção de acções disruptivas levadas a cabo pelas sombras em relação ao que os seus donos fazem, não estamos porém perante um livro-jogo (recordamo-nos de um projecto que brinca com as expectativas das formas criadas pelas sombras e a revelação dos objectos) nem tampouco no reino de uma fantasia, como no caso de Shadow, de Suzy Lee. Acompanhamos um dia, quiçá banal, de um polícia de giro, e uma realidade em que as sombras dos transeuntes, e dele mesmo, parecem exprimir melhor os seus desejos íntimos. Porém, a dado momento, essa barreira entre “mundos”, um pouco à Peter Pan, parece romper-se, e as sombras ganham vida própria e independente das acções dos seres de que partem, criando uma esfera paralela de vida. Talvez a lição esta na reviravolta de que são alvo deixam de ser reflectidas para revelar outra coisa.  

Ambos os livros abdicam, de modos bem diversos, do acompanhamento verbal escrito/inscrito, mas em nenhum aspecto dirimem a potencialidade do desdobramento imaginativo, mesmo através das palavras, seja criando exercícios de nomeação com as criaturas de da Loba (“Molamula” ou “Chaleironte”, por exemplo) ou uma narrativização/explicação pela trama do de Monteiro (é a sombra dorminhoca ou atrasada, fantasma intangível ou projecção de vontade?). Como escreveu a filósofa Suzanne Langer, “a criação de imagens é (…) o modo do nosso pensamento liberto [untutored], e os seus primeiros produtos são as histórias”. Estes livros poderão servir de tutores, sem dúvida, mas sê-lo-ão de um modo ainda assim bastante livre. E se Mar convida à consulta, Bestial e Sombras convidam a manipulações e subversões sucessivas da sua própria matéria.

Ainda recuperando algumas lições de Salisbury e Styles do livro citado, encontramos no projecto autoral e livre da Pato Lógico (mas a cujo esforço se poderiam aliar outros projectos, como vimos, não obstante as especificidades, aqui mais próximas da exploração visual, gráfica e de design, e menos “literária”, digamos assim), uma preocupação em fornecer os seus leitores com livros que contribuem de forma substancial e integrada para a “compreensão cognitiva, estética e emocional” das crianças. Ou melhor, dos leitores.

Nota final: agradecimentos à editora, pela oferta dos livros. 

5 comentários:

  1. "os preços dos livros de que temos falado são usualmente elevados (para as condições das famílias de classe média portuguesa"
    Olá Pedro,
    Desculpa não falar de banda desenhada, ou pouco desta vez, mas a frase acima desperta-me para a forma como certas expressões foram sendo retiradas do seu contexto e são hoje popularmente utilizadas para definir o que não são, muitas vezes com um fim perverso e conspiratório por mais que me custe seguir por essas linhas de pensamento. Se alguns políticos falharam retumbantemente na tentativa de substituir a expressão "sexo oral" por "conduta imprópria", há outros casos de relativo sucesso, como o de transformar os "trabalhadores" em "colaboradores".
    De todos os que me recordo, o mais exemplar para mim pelo seu alcance é o do termo "classe média" que - desculpa-me -utilizas nesta entrada de forma inapropriada, na minha opinião.
    Quando estudava economia nos anos 90 - curso que abandonei a meio por mexer com as convicções que me foram anteriormente transmitidas pelos meus pais e pelos meus melhores professores - todos sabíamos e aceitávamos a definição de "classe média" e que corresponderia a um grupo que seria a antecâmara das classes superiores e que era constituído por indivíduos que ocupariam funções de quadros médios e superiores numa empresa e que teriam um poder aquisitivo superior que permitiria a fruição de bens e serviços e acesso à cultura razoáveis e distante das "classes baixas". Nos dias de hoje estaremos a falar, por exemplo, de um director operacional, de um juiz de carreira, etc. que possuindo rendimentos líquidos mensais superiores a 3 mil euros, uma poupança não inferior a 100 mil euros e habitação e viaturas da sua total propriedade... Ao que antigamente se chamaria de "a burguesia".
    Esta "classe média", apesar de aumentar após o 25 de Abril, foi sempre residual em Portugal, e nunca alcançou os 5%, ou como eu prefiro chamar, a vigésima parte :-) da população portuguesa, não representando, contrariamente ao que se pretende em muitos fóruns, a figura do português médio, esse sim de classe baixa de rendimentos.
    Estatisticamente, não é segredo que a média é um mau indicador para aferir da capacidade aquisitiva de um povo, mas, por teorias da conspiração ou da habitual preguiça intelectual de que todos sofremos quando falamos de temas que não dominamos "medianamente" :-), acabámos por ignorar outras formas de amostra que nos dariam uma adequada percepção das ordens de grandeza (de rendimentos)acessíveis à maior parte dos portugueses. Uma aproximação pode ser sempre feita através da página do INE e de uma pesquisa ao significado e origem dos indicadores "classe mediana" - quanto ganha o português 5 milhões - e, para mim mais importante, a "classe modal - em que intervalo de rendimentos se concentram o maior número de portugueses - que representa verdadeiramente o que se pretende com a "classe média".
    Nesta "classe modal" em que me incluo e a 66%, ou como prefiro dizer, 2 terços :-) dos portugueses, os nossos rendimentos não permitem o acesso a bens de cultura que se distanciem muito dos disponibilizados nas prateleiras das grandes superfícies.
    Como história pessoal que é só uma metáfora bacoca da desigualdade de oportunidades que acompanha a desigualdade de percursos que os pais da "classe média" podem oferecer em oposição aos da "classe modal" aos seus filhos, depois de ler a tua entrada recordei o meu primeiro livro de banda desenhada - Petzi e o seu navio - oferecido pela biblioteca da escola. Que pessoa eu seria hoje se os meus pais (pertencentes à classe modelo :-)me pudessem oferecer os livros de ilustração apresentados nesta entrada?
    Desculpas e Abraços,
    José
    P.S.: Nesta manhã de dia de Ano Novo o tempo renovou as horas e os minutos, quais recém-nascidos ainda estão muito vagarosos, deixam-se apanhar com muita facilidade, dando a oportunidade de pôr a conversa em dia.

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  2. Olá, José,
    Compreendo perfeitamente a paixão com que respondes, e talvez o problema tenha sido o de eu ter empregue a expressão "classe média" num sentido corrente, popular, e não científico. Eu também estudei estatística (não estou a puxar de galões, simplesmente quero solidarizar-me por quem foi torturado dessa forma), e o meu professor magnífico deixou-nos com esta definição: "a Estatística é a arte de provar matemática e quantitativamente aquilo que se quiser".
    Mas independentemente da argúcia e correcção desse adágio, e de podermos confrontar interpretações quer do INE, da PORDATA, quer de certas Fundações (precisamente a Francisco Manuel dos Santos), o que pretendia era apontar para a indelével realidade de que estamos num patamar muito melhor hoje do que antes do 25 de Abril em termos de acesso à habitação, educação, serviços de saúde, já para não falar de democratização do poder político e da cultura (com plena consciência de que há ainda muito por fazer). Num artigo do "Diário de Notícias", encontro esta frase de Elísio Estanque: "As mudanças a que assistimos são mais o resultado da alteração da estrutura económica e não tanto da existência de oportunidades que cada indivíduo consegue para si próprio". Isto é, negar que as nossas vidas (dos nossos pais, nossas, e nossos filhos) estão melhor agora do que há 30, 40 anos, é impossível, mas essas mesmas condições devem servir para que entendamos duas coisas: 1ª, a de que temos ainda que batalhar para melhorar a cultura geral da população portuguesa, ainda atreita a princípios muito tacanhos no que diz respeito à arte, à educação, à abertura das mentalidades a experiências diversas das nossas; 2ª, a consciencialização de que muitas dessas melhorias verificadas nas últimas décadas têm diminuído de intensidade e de que se corre o risco de vir a perder alguma da mobilidade social entre gerações. O ataque coordenado contra a cultura e a escola, por exemplo, terá graves consequências já daqui a uns anos. A falta de uso das bibliotecas de um modo mais massivo aponta desde logo a hábitos que deveriam ser corrigidos. A preferência dos pais de levarem os miúdos a um supermercado para comprar livros ou levá-los a um megaespectáculo do Panda em vez de procurarem eles próprios compreender a oferta literária existente ou de apoiarem espectáculos locais (juntas de freguesia, bibliotecas, grupos, etc.) leva a uma pobreza sistemática da diversidade. A ignorância não é argumento para não se compreender a qualidade existente.
    Mas já misturo assuntos...
    Abraços,
    Pedro

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  3. José Sá4:21 da tarde

    Permite-me um último (juro :-)comentário breve: o uso corrente que se dava há 20 anos atrás à expressão "classe média" coincidia com o uso científico. Onde eu pretendia chegar era que a mudança de paradigma da expressão popular dever-se-á a uma deriva conjuntural orientada pelos orientadores da opinião. Ou será que quem trouxe esta nova "classe média" para o discurso corrente foram as vozes da rua? Não me parece...
    José

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  4. Essa é uma excelente observação, mas sou demasiado ignorante para a responder, e não tenho experiência própria, não tendo vivido o Prec "em consciência". Por algumas noções e observações que faço a um determinado período, houve de facto um fortalecimento muito forte de uma certa classe intelectual, sobretudo de esquerda, que foi moldando os discursos a partir de toda uma série de ideias, axiomas e mesmo dogmas, esperando que a "revolução mental" fosse de imediato acompanhada por quem teria de antes conquistar outras necessidades básicas. Alimentar pobres com Brecht não funcionava. Não funciona ainda. Mas penso que chegámos a um momento em que os pais, chamemos "burgueses" no sentido em terem algum poder de compra além-supermercado, no que diz respeito aos livros, tem não apenas o direito mas o dever de procurarem melhorar a dieta literária dos seus filhos, preparando-os desde já como cidadãos do amanhã. Poesia? Nem pensar, é ler já "Todos Fazem Tudo" como leitura obrigatória. Fascismo cultural? Talvez. Mas virá algum mal maior daí?

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