27 de julho de 2017

O Homem que passeia. Jiro Taniguchi (Devir)

Em boa-hora é relançado este título junto ao público português, numa nova tradução (e novo título), e num formato melhorado, ou pelo menos, individualizado, do que a anterior edição da própria Devir através da colecção Série Ouro com distribuição do Correio da Manhã, há mais de dez anos. Todavia, precisamente por termos feito uma leitura, que esperamos ainda pertinente, da mesma obra então, a esse texto remetemos, deixando aqui considerações de outra natureza. 

O objecto é em si tem outras diferenças substanciais. Materialmente falando, tem uma capa mais atraente e que se prevê ser um projecto gráfico sustentado na nova colecção de mangá da editora, com trabalhos de maior maturidade e para um público mais generalista. Poder-se-ia ter imaginado numa encadernação mais robusta, próxima da colecção Écritures, da Casterman (com a qual partilha o mesmíssimo formato), mas haverá razões substanciais para esta opção. Em termos de conteúdo, porém, a escolha da Devir é bastante feliz. Em primeiro lugar, não temos aqui uma edição que reconstitua as páginas numa ordem de leitura ocidental e em que cada vinheta se mantém idêntica mas numa posição relativa da prancha invertida, e muito menos as antigas edições “flipped”, em que pura e simplesmente se apresentava uma inversão de toda a prancha. É uma edição tal qual a original japonesa, permitindo esta magia visual tão própria da banda desenhada e passível de ser desfrutada pelos leitores não-japoneses (de resto, prática da casa). (Mais)

24 de julho de 2017

Adeus & Hello.


A partir de hoje, o Lerbd não continuará a sua actividade nos mesmos moldes. Neste espaço, escreveremos quase exclusivamente sobre material que seja publicado em língua portuguesa, nacional, brasileira ou traduzida, de banda desenhada e ilustração, ou outros assuntos que tenham lugar entre nós. Mas a esmagadora maioria das publicações estrangeiras a que vamos tendo acesso, inclusive ensaística e académica, será canalizada para as várias plataformas com as quais colaboramos ou para o novo blog em língua inglesa, que aqui anunciamos. O mesmo ritmo manter-se-á, possivelmente, mas repartido em vários locais.
Mais uma vez agradeço aos leitores pacientes e interessados.
O Yellow Fast & Crumble está já disponível.

Veículo. D. W. Ribatski (Roax Press)


Este pequeno pró-zine de Ribatski não é seguramente um livro que coloque o nome do autor num espaço de grande visibilidade junto a um público mais alargado e convencional, por três razões imediatas: porque o autor tem outros projectos que asseguram essa posição, por este ser um objecto de menor circulação (uma publicação de 24 páginas, um panfleto) e pela sua matéria ser controversa, no seu sentido etimológico: isto é, a de ir numa”direcção contrária” àquela que é habitual.

Aparentemente, a narrativa parece focar num episódio algo estranho na vida banal de um empregado de escritório. Tímido, solitário e trivial na sua vida diária, Jonas vê a sua vida subitamente invadida por uma mulher que não conhece, a qual se posta no seu apartamento, nua, e que de certa forma se predispõe a que ele beba dos seus seios um líquido que jorra sem cessar, o qual ele compara com mel. Não há cenas de relações sexuais, mas de nudez, mímica de mamar como uma criança, e conflitos com outras personagens causadas pela confissão de Jonas desta situação. Todas as perguntas que adviriam deste “mistério” são, no fundo, goradas. (Mais)

11 de julho de 2017

Paiment accepté. Ugo Bienvenu (Denoël Graphic)

“Escolher e isolar constituintes do real, de lhes dar, através de uma estrutura, um sentido, um novo dia.” Esta é umas “confissões de arte” do realizador Bernet, o modo como ele explicita a sua função e visão dos filmes que faz e quer ainda fazer. Independentemente do género, da inscrição temporal, das circunstancialidades de produção do filme, o cerne está, portanto, nestes “constituintes do real”. Paiment accepté é uma espécie de ensaio sobre que elementos se preservam mesmo no meio da perda de controle de todos os meios de produção. (Mais)

10 de julho de 2017

Clube Mediterrâneo. J. P. Mésseder, A. Biscaia., J. Monteiro (Editora dos Tipos/Xerefé)

Imaginemos. Daqui a quarenta, cinquenta anos, olharemos para trás e assinalar-se-á o “Dia do Holocausto do Mediterrâneo”. Talvez a palavra seja outra, uma vez que se pretendem exclusividades mesmo na hora do sofrimento, da morte e da barbárie humana, lançando a ideia de escândalo pela comparação, excusando-se o mesmo peso de responsabilidades e invertendo os factores de vitimização. Far-se-ão monumentos, documentários, filmes ficcionados, obras de literatura, palestras, discussões, sobre uma das maiores catástrofes (esperemos) do início do século XXI, já que também temos direito aos nossos próprios horrores. E então fantasiaremos... “Se tivesse vivido na altura....”, “Se pudesse, tinha feito...”, “Como é que não se agiu a tempo?”. E sentir-nos-emos melhor, e continuaremos as nossas vidas. (Mais) 

7 de julho de 2017

Coisas de adornar paredes. José Aguiar (Polvo)

Este livro segue uma estrutura clássica de hipodiegese, isto é, de existirem histórias dentro de uma outra história, de maneira que tanto poderíamos encarar Coisas de adornar paredes como a colecção dos oito breves contos que ocupam a parte de leão do volume, e procuremos entender como é que se coordenam tematicamente entre si, como antes compreender o esforço de Chico, protagonista na narrativa enquadradora, em os construir, e ver cada um deles como expressão e peça do pretende reflectir sobre ele mesmo. Uma vez que surge a oportunidade de ver uma discussão metatextual sobre os “contos” pelas personagens, o seu autor, Chico, e seus interlocutores, Ana e Caio, os sentidos previstos ou potenciais dos primeiros acabam por ser tornar tão explícitos como ambíguos no nível superior. (Mais)

3 de julho de 2017

4 títulos Sociorama. AAVV (Casterman)

A propósito de Chantier Interdit auPublic, explicámos o contexto de produção e publicação dos títulos desta colecção, Sociorama, que, dizendo-o de modo simplista, são adaptações de trabalhos de cariz académico na disciplina da sociologia. Daí que se compreenda que as capas revelem não somente o nome dos autores artísticos que lavraram estas bandas desenhadas, mas igualmente o dos investigadores, de forma a que se sublinhe a precisão e instrumentos dessa pesquisa original. Alguns desses trabalhos foram já publicados em volume, outros existem ainda sob a forma de teses universitárias. Seja como for, são resultado da instrumentação teórica, prática e desenvolvida no campo, em ambos os sentidos, disciplinar e de contacto com o terreno, desse saber das ciências humanas, que, de uma maneira ou outra, reflecte uma verdade de experiência das pessoas com quem contacta. Sendo os objectivos gerais da sociologia a compreensão do indivíduo e dos grupos que possa completar inseridos na tessitura social e externa, não se trata tão-somente de entrevistas a esses mesmos indivíduos, mas à criação de toda uma contextualização global que tanto integra como destaca a experiência que se está focando. (Mais)

1 de julho de 2017

Curso de banda desenhada na Nextart.

Serve o presente post, tal como ocorreu no ano passado, para indicar que estão abertas as inscrições para os cursos de Verão na Nextart, entre os quais se encontra um curso breve de introdução à linguagem, estruturas e criação de banda desenhada, ministrado por este vosso criado. A primeira fornada ainda tem algumas vagas.

Caso estejam interessados, as portas estão abertas. Ou passem palavra.  

Mais informações directas aqui.
Nota: imagem de Hugo Maciel (estudos para projecto em curso).

Vies de Marko Turunen. Marko Turunen, com Tea Tauriainen (Frémok)

Por várias ocasiões, falámos aqui dos territórios movediços e ambivalentes da autobiografia, a auto-ficção, a auto-fantasia, e outros descritivos que tanto assinalam como ofuscam o acto de recontar a sua própria vida sob uma forma qualquer artística, seja a literária, a cinematográfica, a teatral, as das artes visuais ou a da banda desenhada. Cada acto, na verdade, tem sempre os seus próprios contornos, pequenas redistribuições dos elementos expectáveis ou familiares, cada gesto as suas próprias contribuições únicas e aproveitamentos de semelhanças com outros textos. E, assim, ao pensarmos em constelações variadas que abarquem Miné Okubo, Justin Green, Aline Kominsky, Guido Buzzelli, David B., Emmanuel Guibert e as suas fontes, Ana Cortesão, Marco Mendes, Francisco Sousa Lobo, vamos encontrando uma mancha tão informe quanto expansiva quanto ainda complexa e numa mutação constante. Que pensar do último projecto do autor finlandês Marko Turunen? (Mais)