O título do primeiro capítulo, “Brumário”, é todo um programa. Não apenas se refere à época do Outono, de acordo com o calendário da Revolução Francesa, como necessariamente recorda igualmente o livro de Karl Marx sobre o golpe que veria a emergência do Segundo Império, O 18 de Brumário de Luís Bonaparte, e que no fundo poderá ser lido como uma aplicação da teoria da luta de classes mas igualmente a análise da construção de figuras salvíficas e quase-messiânicas a contrapelo a realidade social, económica e política das acções dessas mesmas figuras. Se no caso de Marx se refere a Luís Bonaparte, em Vale dos Vencidos essa figura é a de António Costa. Quer dizer, parece o António Costa, enquanto Presidente da Câmara Municipal de Lisboa, mas não é o António Costa. É “Pedro Gomes, Presidente da Câmara de Merídia”. E no centro de Merídia há um bairro muito antigo, popular, que foi sempre ocupado pelos mais pobres e marginalizados, subitamente tornado apetitoso em termos de real estate para, palavra que me causa cortiçonite no céu da boca, “empreendedores”. Esse bairro é o Vale dos Vencidos, e este livro é a crónica da sua gentrificação.
30 de dezembro de 2023
21 de dezembro de 2023
"Webs of Self, Webs of Meaning" (artigo na RLEC)
13 de dezembro de 2023
Damasco. Lielson Zeni e Alexandre Sousa Lourenço (Brasa)
Se considerarmos a banda desenhada como não somente nos mostrando um mundo (diegético) mas a própria forma como esse mundo é construído (a formação discursiva) e a materialidade deste é tornada opaca – isto é, não se trata somente de uma plataforma transparente para a diegese mas a própria superfície que se torna significativa –, que estratégias de constructibilidade (constructedness) são visíveis em Damasco? A resposta é dada por uma grande diversidade de estratégias visuais e de composição. Alterações do registo do desenho, a cor diminuta, a variedade da composição das páginas (criando como que “secções”, como veremos), a remediação de outros modos gráficos (videojogo, jogo de tabuleiro, manual de instruções, infografia, etc.). Mas qual a razão para tamanha des/estruturação?
5 de dezembro de 2023
Cthulhu Sadino. Pedro Moura, Marco Gomes, Daniel Maia, et al.
Serve o presente post para dar notícia da existência e disponibilidade do Cthulhu Sadino. Agora que a exposição chegou ao fim, a publicação passa a ter uma existência própria. Este é um projecto de banda desenhada deste vosso amigo, para o qual contou com a camaradagem, paciência e talento dos artistas Daniel Maia e Marco Gomes. É um projecto leve, bem-humorado, espero eu que divertido, e que conta com duas linhas artísticas bem distintas mas espectaculares, complementares e que são justificadas pela narrativa.
Que é Chtulhu Sadino? Bom, descrevi como "paretimologia", em primeiro lugar, porque no fundo responde àquela pergunta que nunca ninguém fez mas tinha no fundo da mente: quem e porquê se desenvolveu a receita do choco frrito em Setúbal? Se reza o mito que essa terra foi fundada pelo neto de Noé, Túbal, haverá alguma relação? Que segredo se esconde na felicidade desse aparentemente simples mas magnífico prato? E é mesmo apenas uma receita? Só? Ou está relacionada com algum ritual antigo? A calçada de Setúbal mostra mesmo ondas, ou serão antes tentáculos misteriosos? No brasão de Setúbal, são mesmo peixes no campo do mar? O tamanho em relação ao castelo não bate certo? Serão monstros marinhos? E aquela vieira em cima, é mesmo uma concha ou é um polvo estilizado com um tentáculo a mais? Muita coisa por explicar, este pequeno compêndio tem as pistas todas... Quando Túbal e os seus intrépidos companheiros chegam à baía do rio Sah-Dom, vieram para ajudar a população de uma ameaça dos fundos dos mares, cuja origem remonta ao avô Noé, no Dilúvio...