15 de outubro de 2012

FIBDA 2012 - Autobiografia

É já de notícia pública que o próximo FIBDA (Festival Internacional de Banda Desenhada da Amadora) tem como destaques principais exposições de Cyril Pedrosa, Ricard Cabral e Paulo Monteiro (que assinou o cartaz), entre outras. Mas o que une esses três autores e a exposição central é um princípio comum, ainda que elástico, a saber, o da autobiografia em banda desenhada. Foi com grato prazer e honra que fomos convidados a comissariar essa mesma exposição central, a qual se pauta mais por princípios institucionais, de clareza de informação e equilíbrios internos do que uma mais decidida - e, porventura, limitada - escolha pessoal. Assim sendo, esperamos que a multiplicidade desse "sub-campo" (como lhe chamamos e argumentamos no texto do catálogo) seja demonstrada através da arte original, reproduções e mostra bibliográfica que se apresentará. Fica aqui uma das versões (longas) do texto de divulgação, também assinado por nós.
"A autobiografia é um género que no modo de expressão da banda desenhada se consolidou por volta dos anos 1960 e 1970, quer nos Estados Unidos, sobretudo com os autores afectos ao movimento dos underground comix, quer em França com pequenas experiências pelo humor irrisório de Gotlib, Mandryka, Gire ou mesmo Jean Giraud.
“Existem exemplos que podem ser colhidos ao longo da história da banda desenhada, e no caso português a menção de Rafael Bordalo Pinheiro não seria, como sempre, descabida. Contudo, enquanto género próprio, ou até possibilidade de criação, apenas emerge na contemporaneidade. Autores como Justin Green, Robert Crumb, Aline Kominsky, Edmond Baudoin, Carlos Giménez, Keiji Nakazawa e Harvey Pekar são fundamentais e influentes na abertura dessa possibilidade.
Os anos 1990, mais uma vez nos três pólos principais da produção de banda desenhada global (França, Estados Unidos e Japão) marcariam uma viragem e exposição substancial: aí poderíamos destacar nomes tais como Seth, Chester Brown, David B., Julie Doucet, Jean-Christophe Menu, Yoshiharu Tsuge, Fabrice Neaud, Debbie Drechsler, Howard Cruse, Marjane Satrapi, Craig Thompson, Alison Bechdel, entre tantas outras possíveis referências num universo muito alargado.
“Portugal, por todas as vicissitudes e especificidades da sua história particular da banda desenhada, tem uma presença no campo da autobiografia mais tímida, mas não seria errado pensar nos nomes de Fernando Relvas ou Ana Cortesão nesse balanço. Mais recentemente, autores como Marcos Farrajota e Marco Mendes exploram esse território de um modo explícito e criativo.
“Tendo em conta que a história da banda desenhada, sobretudo no século XX, foi ocupada sobretudo por géneros infanto-juvenis e associados a géneros fantasiosos, escapistas ou delimitados por regras de expectativas mercantis, a autobiografia foi um dos géneros que mais e melhor contribui para uma sua abertura e desenvolvimento cultural. Quer dizer, a paulatina mas assegurada consolidação da banda desenhada como uma arte ou modo de expressão passível de ser empregue para quaisquer fins, narrativos, artísticos, estilísticos, políticos ou filosóficos, que sejam desejados pelos autores, encontrou nesse género em particular uma das vias de expansão. É aí que encontramos um contributo decisivo para o aparecimento de editoras alternativas dedicadas à produção não apenas de revistas mas de livros (a canadiana Drawn& Quarterly e a francesa L'Association poderão servir de exemplos maiores), e que influenciariam igualmente editoras mais tradicionais, assim como é graças a esses novos autores e essas obras que a banda desenhada ganha um espaço mais digno e crítico na recepção crítica cultural, levando mesmo à sua inclusão em prémios literários prestigiados, bolsas de desenvolvimento artístico, residências, convites aos autores para participarem em encontros transdisciplinares, já para não falar do enorme ímpeto que deram aos estudos académicos de banda desenhada”.
A exposição compreenderá uma mostra integral do fundamental Binky Brown Meets the Holy Virgin Mary, de Justin Green, e apresentará os seguintes núcleos: núcleo central, "o corpo", "a família", "memória histórica", "memória alheia", "diário de viagem" e "auto-ficção".
Agradecimentos a toda a equipa do FIBDA e CNBDI.

3 comentários:

  1. Estou em pulgas para ver a exposição (sobretudo os originais do Justin Green). Parabéns, Pedro!

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  2. Para quem costuma como eu ser muito crítico do FIBDA principalmente por considerar que poderia ser muito mais do que é e evoluir, devo dizer que este ano as críticas que tenho a fazer são todas positivas, e que para as mesmas contribuíram por um lado a gentileza do responsável em substituir-me na obtenção de autógrafos de dois autores estrangeiros (motivo pessoal como podem entender), à exposição em geral, e em particular a ter tido a oportunidade de ouvir do responsável deste blog e comissionário da FIBDA deste ano a sua apresentação guiada sobre o tema da FIBDA, que ainda teve companhia de dois autores estrangeiros, resumindo foi excelente e muito interessante e para mim fez com que como visitante tivesse visto as minhas expectativas superadas, que as FIBDAs dos próximos anos sejam como a deste ano. Parabéns!
    João Antunes

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  3. Caro João,
    Obrigado pelas palavras, e sinceramente espero que tenha sido agradável (já que quando começo a falar, tenho dificuldade em terminar!). Como expliquei antes, a minha responsabilidade limitou-se à organização dos elementos necessários para respeitar o tema da "autobiografia", proposto pela direcção do FIBDA. No entanto, se me for permitido, desde que comecei a colaborar com o Festival que tenho insistido na importância e valor que haverá em contactar agentes externos ao FIBDA para pensar, organizar, diversificar e comunicar a banda desenhada. Espero que isso continue a acontecer, tal como espero poder estar envolvido de quando em vez noutras acções.
    Obrigado e até breve!
    Pedro Moura

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