
Como já havíamos notado, Moore é um autor alvo de muitos livros e estudos, tal como o recente Storyteller. Sendo esta uma colecção - mas não “mera” - de entrevistas dadas pelo autor, é possível que aqueles que tenham acompanhado essa bibliografia não encontrem aqui muitas novas informações, mas encontrarão pelo menos, concentradas, novas abordagens, e para mais, na voz, como dissemos, directa, do próprio autor. Há sem dúvida um indelével “valor e utilidade numa colecção de entrevistas que atravessam a carreira de Moore ao longo de trinta anos” (pg. xiii), entrevistas tão recuadas quanto 1981, feita pelo próprio David Lloyd quando ambos trabalhavam em V for Vendetta, até 2009, em que se discutem leituras, influências, posicionamentos face ao mercado, às adaptações cinematográficas (desastrosas e desfiguradoras) do seu trabalho e o seu novo romance ainda a ser escrito, mas há muito aguardado, Jerusalem.
É natural que o interesse por autores como Moore (e Kirby, e Morrison, e McCay, conforme volumes académicos publicados há pouco e de que daremos conta atempadamente) se vejam multiplicados em várias frentes e vertentes, tendo em conta o tipo de impacto e resposta popular que eles engendram. É verdade que num panorama mais alargado e equilibrado, também haveria monografias dedicadas a outros nomes menos populares mas tão impactantes e significativos na proliferação de vozes e valores na banda desenhada, por hipótese, e para falar de nomes que nos serão mais caros, Baudoin, David B., Fabrice Neaud, Dominique Goblet, Bem Katchor, já para não falar de autores portugueses, mas compreende-se perfeitamente, no mundo em que estamos, que se entenda Moore como “a mais importante figura singular a mudar o equilíbrio de poder e influência na banda desenhada mainstream do artista para o escritor” (vii). Isso é totalmente verdade no panorama norte-americano, onde emergiria a aura de estrelato a autores-escritores como Gaiman, Morrison, Rucka, Millar, Ellis e outros, já que a esmagadora maioria da fama era repartida pelos artistas (p. ex., Bob Kane e não Bill Finger) e os só-escritores viviam nas margens dessa produção (cf. Pekar).

Moore explicita repetidamente o quão importante é o trabalho de colaboração (algo que havíamos sublinhado quando da leitura de Storyteller), tecendo elogios e descrevendo com sapiência e admiração o trabalho dos seus colaboradores, ou melhor, co-criadores, e descrevendo a forma como incorporava ideias, apontamentos e tratamentos dos mesmos na condução da sua obra. Por exemplo, nas suas divertidíssimas desconstruções do trabalho de Chris Claremont em X-Men, que muitas vezes escrevia à margem do trabalho imagético, Moore, tomando como exemplo Eisner, declara que “penso que se podem criar boas personagens na banda desenhada. Não o escritor, mas o escritor e o artista” (15, sublinhado no original). No entanto, e como correlato de tudo o que se disse, muitos dos seus seguidores - à margem de Barthes e Foucault - seguem-no a ele, o escritor, e o seu universo de referências - seja ele trazido a lume pelas magníficas linhas de Campbell ou pela mediocridade de um Jacen Burrows.
A lume, então, a sua voz.
Nota: agradecimentos à editora, pela oferta do livro.
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