29 de outubro de 2013

The Daniel Clowes Reader. Ken Parille, ed. (Fantagraphics)

Quando falámos de MetaMaus e de The From Hell Companion referimo-nos à possibilidade de edições críticas de banda desenhada, e essa palavra surge na capa deste livro (v. subtítulo). Mesmo que nos arrisquemos a dizer que a sua precisão ainda não é total, é muito salutar que se tornem disponíveis este tipo de edições. Mais reveladoras do que as “edições de luxo” (em tamanhos descomunais, de capas duras, com caixas arquivadoras, com “extras” que pouco adiantam ao texto propriamente dito, ou com colorações digitais muitas vezes paupérrimas, e muitas vezes caríssimos e, também, de uma praticabilidade reduzida), que servem uma parte importantíssima do mercado, estas outras abordagens visam um público distinto, mais preocupados em ler melhor as obras em questão, e por vezes mesmo em lê-la “ao quadrado”, como diria Borges, uma expressão que pode ser empregue com muita naturalidade num contexto educativo.

É óbvio que esta é uma questão extremamente complicada, uma vez uma definição curta e consensual de edição crítica não é possível mesmo nos seus campos mais habituais, como a literatura ou, a origem, os estudos bíblicos. Por exemplo, a escolha do aparato crítico (notas de rodapé, notas finais, variações, manuscritos, notas contextualizadoras, glossários, etc.) pode ser discutível, ou a inclusão ou não de ensaios especializados ou uma longa introdução. O próprio texto original pode levar a dimensões diferentes, se se está a falar de um texto obscuro que precisa de uma grande contextualização (ex. Alan Dunn), ou de algo que teve tantas versões que precisa de uma navegação específica (a questão ne varietur, se se mergulha na crítica dita “genética”, se se presta atenção para com a transmediação, etc., ex. as versões de Tintin), ou até de algo que pensamos ser muito familiar mas precisa de um reenquadramento (quando existe uma história de recepção complicada, por exemplo, A Contract with God). Numa entrevista dada a Tom Spurgeon, Parille afirmou o seguinte: “Queríamos usar o termo ‘reader’ [antologia] e ‘edição crítica’ porque estas palavras significam alguma coisa junto a algumas pessoas. Mas porque elas não significam nada para outras, usámos o nosso subtítulo para explicar os conteúdos: este livro tem banda desenhada, mas também ensaios, entrevistas, e notas. Uma vez que este tipo de antologias é algo novo na banda desenhada/crítica de banda desenhada - a maior parte das antologias ou juntam materiais primários (banda desenhada) ou material secundário (ensaios, etc.) - tínhamos de ser explícitos. E uma vez que Ghost World é a obra mais conhecida de Clowes e ele está no The Reader, também aparece no título”. Por isso Parille optou por incluir excertos ou citações de entrevistas, ensaios anteriormente publicados ou novos para a colecção (com abordagens pessoais, históricas, técnicas, que mergulham na teoria literária, em interpretações psicanalíticas, etc.).
Sendo Ken Parille autor de toda uma série de textos que revelam uma brilhante capacidade de análise, como já havíamos notado a propósito da sua participação em The Art of Daniel Clowes, Modern Cartoonist, de facto, não é apenas o seu trabalho de edição, revelando fontes, desdobrando referências relativamente obscuras, explicando citações internas, assinalando pistas autobiográficas meio-veladas de Clowes nas suas histórias (sem nunca abusar desse aspecto para a interpretação) que torna este volume numa excelente adição a essa compreensão, mas os seus gestos de close reading, ou deveríamos antes dizer “very” close reading, gestos esses supernos. De facto, como qualquer boa leitura interpretativa e argumentada de banda desenhada (ou de uma qualquer obra de arte), Parille obriga-nos não apenas a reler a obra, para notar mesmo as pistas que ele desvenda, como a reler sempre qualquer obra com o seu nível de atenção.

Haveria outras obras que poderíamos agregar neste corpus de crítica. Numa discussão entre académicos desta área, propusemos este título e aqueles dois indicados acima, como ainda The Four Immigrants Manga, de H.-Y. Kiyama, editado por F. Schodt (mas altamente criticado por alguns especialistas), a “autópsia” de 120, Rue de la Gare, de Malet-Tardi, o livrinho La construction de La Cage, de Thierry Groensteen, “guia” do livro de Martin Vaughn-James através dos apontamentos do autor, e até mesmo o Dossier Tintin: L’île noire, primeiro volume de uma colecção que nunca aconteceu, mostrando lado-a-lado as três edições desse livro de Hergé. Como contraponto, arrolaram-se ainda todas aquelas colecções que já apelidámos de “recuperação da memória” da banda desenhada, as edições integrais, as colecções completas de séries, desde Krazy Kat, Gasoline Alley, Dick Tracy, Popeye, a Príncipe Valente, Tif e Tondu, Buck Danny, as histórias de Carl Barks na Disney, séries da TBO, etc. Algumas destas edições possuem mesmo introduções ou complementos textuais de grande excelência, que as aproximam da dimensão crítica. Domingos Isabelinho propôs a consideração da existência da noção de catálogos raisonnéss na banda desenhada (mais do que meras checklists ou listas bibliográficas, instrumentos importantes ainda assim), mas isso também dependeria dos instrumentos empregues: serão os dois volumes dedicados a Töpffer por David Kunzle um exemplo disso?

Contudo, de uma maneira ou de outras, ou na nossa perspectiva limitada talvez, elas ainda estão afastadas dessa dimensão. Já The Daniel Clowes Reader apresenta-se como um sério candidato a um modelo quase perfeito das edições que virão num futuro próximo. Ainda assim, talvez devesse este projecto ser entendido menos como crítico do que anotado, que é efectivamente. Se, por um lado, existe uma menção explícita (com um par de exemplos) dos pontos em que Clowes retocou Ghost World da versão original publicada de Eightball no. 11 a 18 (ou seja, de 1993 a 1997) para a versão em livro (em capa cartonada, saiu no mesmo ano que o último capítulo), seria muito curioso pensar em que como é que se poderia publicar uma abordagem crítica que desse conta dessas variações (e compreender, portanto, as razões que presidiram a essas alterações). A esmagadora maioria desses gestos tem a ver com os rostos das personagens, não apenas as protagonistas, que ora se suavizam (no caso de Enid e Rebecca) ora se intensificam em caricatura (em relação a outras personagens); a variação da cor também seria interessante de estudar, uma vez que ela tem um significado interpretável. Autores como Chris Ware revelar-se-iam muito complexos num caminho destes… Mas termos mais acesso, até com comparações visuais, entre essas imagens, ou vermos os objectos (através de fotos) originais das publicações – os comic books em que saíram – seria uma mais-valia. Ler hoje Maus e Ghost World como “livros” é um prazer e uma solidez intelectual insubstituível, mas seria uma má atitude, quer em termos históricos quer em relação às especificidades sociais e mediáticas deste meio, esquecer que esses textos haviam sido serializados em formatos mais “populares” (?).

Por outro lado, e regressando ao início do texto presente, é curioso que se juntem estes trabalhos mencionados. Considerar um campo de referências e até de canonização (apesar dos problemas que isso acarreta) que abarque Maus, From Hell e Ghost World não é de forma alguma estranho: sem querer de forma alguma criar ideias absolutas e válidas para todo o sempre e em qualquer contexto, estamos aqui perante um corpus de obras maiores, sem dúvida (outras haverá, decerto). E essa decisão nem sequer parte somente do mundo da academia. Também a série The Simpsons havia considerado esta tríade como importante, para os que se recordam da League of Extraordinary Freelancers.

Como escreve Parille, Clowes é um “artista igualmente realizado em formas longas [da banda desenhada] como a ‘graphic novel’ [cujo termo o artista não gosta, mas aceita como descritivo], mas também histórias curtas, bandas desenhadas de uma página, e o formato da tira de jornal” (25). Talvez seja essa a razão de dividir o livro em três secções, depois de uma introdução já em si variada. A primeira secção é dedicada a Ghost World, mas também ao seu tema principal, a da adolescência, sobretudo feminina. Reúnem-se entrevistas, ensaios pessoais, ensaios críticos ou históricos, e material de referência, como glossários ou notas. Alguns dos materiais são coligidos de publicações anteriores, outros são inéditos. A segunda secção concentra-se em histórias curtas, providenciando-se as histórias (e suas anotações respectivas) “Blue Italian Shit”, “The Party” e “Black Nylon”. A terceira secção é dedicada a histórias ainda mais curtas, algumas de duas ou uma ou mesmo meia-página, revisitando-se a famosa “Art School Confidential”, por exemplo (que foi adaptada ao cinema, num resultado algo mediano). Esta divisão em formatos ou escalas é justa, já que há uma claríssima dificuldade em dividir a obra de Clowes de acordo com os mais regulares princípios do género, pois eles acabam misturados: é “Art School Confidential” estritamente autobiográfico? Ou é uma curta sarcástica que apresenta uma galeria de estereótipos? Ou é antes humor, simplesmente? E Ghost World será descritível suficientemente como “não-ficção”, quando esse termo pouco significa? Funcionará Bildungsroman quando a economia sexual do livro mas também a ausência de um evento dramático retira muita da força com que esse termo literário muitas vezes se reveste? Será que apelar para designações superficiais e circunstanciais é iluminador: “geração X”, “hipsters”, “slackers”?

Em retrospectiva, é incrível compreender que Ghost World já vai a caminho da sua segunda década de existência, quando em muitos sentidos ainda é um título actual, “fresco” até, na sua humana representação da solidão, mesmo que se esteja acompanhado, da impossível total comunhão da amizade e do amor, mesmo que pareça haver a afinidade total, ou do desespero do futuro que os adolescentes sentirão, mesmo que pareça haver espaço para todas as “oportunidades” ou, como quer fazer o discurso oficial, qualquer “empreendorismo”. Se bem que as diferenças também sejam significativas - basta pensar que a presença da internet veio alterar radicalmente os paradigmas das subculturas e comunidades imaginadas -, pensamos que, se alertar para essas diferenças é fundamental para a contextualização (um dos papéis da crítica), tornar-se-á ainda mais reveladora a continuidade da sua força. Se Like a Velvet Glove Cast in Iron continua  a ser um marco insubstituível da invasão do absurdo numa banda desenhada mais convencional, Ice Haven um estudo impecável da “heterogeneidade gráfica” de Groensteen, e, cada um a seu modo, Mister Wonderful e David Boring sejam olhares intensos e acutilantes sobre as ilusões que as pessoas criam na busca pela felicidade, e Wilson uma mescla dessas duas vertentes, talvez ainda seja Ghost World o seu livro mais lido, mais conhecido e, porventura, mais amado. Por essa razão também, talvez seja aquele título que mais paródias (algumas muito inteligentes) tenha criado, como a imagem que acompanha este parágrafo, que ao mesmo tempo aponta para as raízes referenciais da criação das personagens de Clowes.

O Reader é feito de toda uma série de materiais heteróclitos que se iluminam entre si, criando um objecto multifacetado e complexo, cujo fito central é, naturalmente, tornar a leitura da obra de Clowes, e sobretudo dos títulos aqui reunidos, mais ancorada. Apenas imaginaríamos o que seria um projecto que abarcasse toda a sua produção. O livro inclui ainda um texto do próprio Clowes, intitulado Modern Cartoonist, originalmente publicado em 1997, e que serve de manifesto ou carta aberta do autor em relação ao estado da arte da banda desenhada (na época), similar portanto ao manifesto de Eddie Campbell, e igualmente contendo quer noções teóricas (mas também pragmáticas) que deveriam ser empregues quer uma abordagem humorística muito reveladora. Aliás, é um texto que a sua introdução revela poder ser lido “séria” ou “comicamente”, na verdade. Em termos cómicos, está o próprio discurso, criado sobre ideias absolutas e hiperbólicas do que constitui este meio, mas mais seriamente está a sua atenção para com a visão de controlo absoluto que a banda desenhada permite aos seus criadores, e a forma como ela se torna portanto um meio o qual, bem longa da ideia de colaboração onde a expressão individual se dilui e desaparece nas decisões colectivas, se torna quase isolada. Porquanto isso possa levar, mais uma vez, aos exageros associados quer ao mito do “autor completo” quer aos perigos do biografismo e das interpretações psicologizantes das obras, tais afirmações acentuam essa carga “eléctrica” (palavra do autor) possuída pela banda desenhada. Muitos dos conselhos do autor, sarcásticos ou não, dados aos “jovens artistas” são preciosos: “Será que ele preferia ser um escritor de romances mas pensa que a forma bastarda da banda desenhada oferece menos competição, e por isso desenvolve um estilo rudimentar para ilustrar histórias a que ninguém ligaria noutro meio qualquer? Será que ela preferia ser uma pintora mas acha que terá mais sucesso se usar as suas ideias cansadas num campo em que os leitores não percebem nada de tendências artísticas? Se sim, ele e ela deveriam casar-se e deixar-nos em paz” (331).

No que diz respeito aos ensaios, recordará uma colecção como The Sandman Papers ou os volumes da Sequart, isto é, uma colecção de textos variados, sobretudo críticos, que focam muito especificamente numa obra, tornando-se portanto no seu conjunto um precioso guia, glossário, mapa, dicionário, ou outros descritivos que ajudam a compreender e navegar a obra original. Alguns dos textos são pequenos ensaios pessoais, como o de Adele Melander-Dayton sobre a sua recepção pessoal de Ghost World, ou o de Joshua Glenn, que pertence à geração que Clowes parodiava em algumas histórias. Estes dois textos, em particular, fazem pensar até que medida seria interessante termos testemunhos, mesmo que breves, mesmo que visuais, de autores influenciados por Clowes ou obras suas particulares, mas isso talvez pudesse abrir as portas a meros gestos de homenagem (de que existem bastos exemplos, e interessantes ou mesmo bons). Não obstante, uma imagem como esta criada por Amanda Konishi, curiosamente intitulada “Charlie  Boring”, abre imediatamente a todo um quadro de referências e mesmo tópicos e noções que, na simplicidade da sua existência, conduzem a pensamentos produtivos, pensamos. Seja como for, muitos dos complementos - quase sempre da lavra de Parille - são assaz informativos (sobre a cultura dos fanzines, sobre o uso particular do mundo publicitário nas histórias, sobre o conceito de adolescência e o seu tratamento no livro, etc.) e outros ainda de interpretações excelentes, como indicámos.
Uma última parte re-apreoveita declarações de Clowes para The Comics Journal sobre o seu processo criativo, onde ele explica os seus métodos desde a escrita à planificação das pranchas, das artes-finais à coloração, passando por todos os materiais técnicos e trabalho final de edição, e até formas de desenhar perspectivas, personagens, dobras de tecidos, sombras e luz. Além de iluminador, e sendo apenas um processo, é igualmente útil, até para reler a sua obra à luz das pequenas informações que nos dá (como o facto de que a arte original tem aumentado de tamanho progressivamente e, portanto, o consequente grau de redução ), obrigando-nos a termos pelo menos a mesma atenção na leitura que o autor teve na sua criação. Portanto, se o título diz Reader, não é de somenos que todos estes materiais coligidos nos façam, sobretudo, reler.

Nota final: agradecimentos à editora, pelo envio do livro.

5 comentários:

  1. José Sá5:44 da tarde

    Caro Pedro,

    O Daniel Clowes desperta o grunho que há em mim e sempre que ouço falar nos livros e no autor só consigo pensar, como se o conhecesse pessoalmente, "não gosto dele" em vez de "não gosto da obra", como seria natural, . A expressão "Boring!", por razões óbvias, também a repito muitas vezes...
    O teu post anterior e este recordaram-me a leitura dos obituários desta semana(as referências ao New Yorker e ao Warhol das tuas últimas entradas fizeram clique). Relaciono-os, sem ter espaço para grandes explicações, às mortes do Lou Reed e do Arthur Danto. Clowes é para mim, enquanto experiência pessoal de aficionado da banda desenhada, a representação do "fim da arte" (neste caso da nona arte :-), no sentido de que a sua criatividade é expressa com uma qualidade artística que se afasta da expectativa que teria de um livro de banda desenhada e que surge como objecto de arte porque a crítica especializada o aponta como ruptura à bd clássica. Também o Lou Reed inicialmente e os Velvet Underground, segundo as crónicas, apesar de ignorados pelo grande público, foram a principal influência à criação das bandas que gozaram de imediata adesão popular (ou mais ou menos). Pessoalmente, nunca prestei atenção aos Velvet e nunca fui grande ouvinte do Lou Reed, mas eu e "99% da humanidade" ficamos-lhe eternamente (que apropriado :-) gratos pelos Joy Division, pelo Bowie e por muitos outros et cetera.
    Neste contexto, sendo o Alan Moore um artista muito mais consensual e que teve êxito imediato (discutível) junto da crítica e grande público, penso que será este Reader um objecto ainda mais útil e necessário à compreensão de um autor e da sua obra que o Companion. Exemplificando no meu caso pessoal, foi muito fácil perceber por que gostei tanto do Sandman do Gaiman porque antes tinha lido o Swamp Thing, mas estou totalmente no escuro (hipérbole :-) relativamente a que autores de quem eu gosto muito e que foram influenciados pelo Daniel Boring. Growing Pains, quem as não tem? Não é isso que nos leva a colecionar banda desenhada desde a juventude até agora? Mais além do processo de identificação, talvez eu consiga encontrar no Reader a explicação ao objecto de arte.(?)
    (momento manteigueiro, mas sempre sincero) Excelente escolha o tema e o título "Semanas Académicas", sinto-me muito académico por frequentar o teu blogue. É a aprendizagem que procuro, essencialmente, quando o consulto e, devo-te esta desculpa, acabo sempre por me deixar entusiasmar em demasia e cometer exageros de opinião, como é o caso presente.
    Obrigado, um abraço.
    José Sá
    P.S. (ainda não acabou :-): não vou ter oportunidade de estar presente na visita guiada da tua exposição no FIBDA (trabalho), será que ela vai ter direito a um post? Deixei um comentário no post do Morro da Favela em que perguntaria ao André DiniZ se alguma vez vê o livro (entre muitas outras visões que tenha) como uma interpretação "antropofágica" invertida do Maus.

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  2. Olá, José Sá,
    As minhas desculpas por não ter sido mais célere na resposta à mensagem anterior, mas tem sido impossível. Muito rapidamente, direi que uma vez que faço a apresentação pública do "Duas Luas", e a visita guiada com o A. Diniz e o P. Franz, introduzirei essa questão, e darei conta dela aqui...
    Duvido que faça um post novo sobre a exposição, talvez apenas enquanto balanço, mas anunciarei uma colaboração com outro blog, e lá poderá haver mais considerações.
    Quanto ao Clowes, e todas as outras considerações entrançadas, partilho de algumas afinidades, exclusive aquela em relação a este autor. É verdade que cada um se terá aproximado de modos diferentes a várias obras, mas conheço o Clowes desde o "Lloyd Llewellyn", muito diverso do que viria a seguir, a partir de alguns números da "Eightball". E achá-lo "aborrecido" é o mesmo que dizer que a nossa própria vida é "aborrecida". Mas como é mais raro que eu combata contra Skrulls - duas ou três vezes - do que ter de me levantar às 6h da manhã, queimar uma sopa ou ter discussões com as pessoas amadas, encontrava mais razões para compreender que Clowes toca as raias da vida do que qualquer tentativa "madura" de outros géneros mais comuns da banda desenhada. Ser-me-á difícil dizer que x ou y são claramente influenciados por Clowes, mas quase todos aqueles autores de que falei na semana dos "art comics", por exemplo, ou muitos dos autores que praticam novelas do quotidiano (as primas Tamaki, Adrien Tomine, os portugueses David Campos ou Marco Mendes) poderão ter passado pela leitura deste autor e compreendido essa possibilidade. E a verdade é que as fantasias de "The Sandman" e "The Swamp Thing" (convenhamos, sendo obras maiores, não deixam de se pautar pelos princípios da espectacularidade dos géneros formatados que os nutrem) convidam de facto à hipérbole e a essa perigosa "compreensão por que se gosta". Se se "compreende", é porque a obra é já familiar e não perigosa; a arte que traz combate e resistência é aquela que nos obriga a ver mais...
    Sobre a questão de Clowes ser o "fim da arte", já discordo. Que o queiram, ou apenas alguns sectores, por ignorância de um maior enquadramento de obras e autores, levantá-lo a "único", é aceitável mas apenas até certo ponto, pois há muitas outras experiências que radicalizam mais significativamente (até no sentido original da palavra "radical", de "raiz") esse tal "limite" (o qual não pode mesmo existir, para aqueles que verdadeiramente crerem que a banda desenhada é uma arte).
    Abraços,
    Pedro

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  3. José Sá2:44 da tarde

    Obrigado pela tua resposta e por considerares colocar a minha pergunta ao André DiniZ, já que mesmo que estivesse presente me faltaria audácia para introduzi-la.
    Abraço,
    José

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  4. KenParille5:00 da tarde

    Pedro,

    Thanks for writing this,

    Ken

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  5. Dear Ken,
    You're more than welcome, this is a great book. You probably checked the discussions over at the Comics Scholars List, where I started an inquiry about critical editions of comics, and mentioned this book. I've used some of the topics here.
    All the best!
    Pedro

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