31 de janeiro de 2015

Participação em “Encontros com o património: Cottinelli Telmo".

Serve o present post para informar que, por ocasião da exposição “Os Arquitectos são poetas também”, dedicadas à obra e vida de Cottineli Telmo, patente no Padrão dos Descobrimentos, projectado por ele-mesmo e o escultor Leopoldo de Almeida, participámos no programa radiofónico da TSF, “Encontros com o património”.

Conduzida por Manuel Vilas-Boas, o programa espelhou a carreira multifacetada do autor português, focando-se o cinema com a presença de João Mário Grilo, a dimensão da banda desenhada e ilustração com este vosso criado, e, claro está, a espinha dorsal do programa, a sua vida como arquitecto com duas historiadoras de arte, Joana Brites e Ana Mehnert Pascoal. (Mais) 

Dada a centralidade da sua obra arquitectónica, que não apenas constituiu o cerne da sua vida profissional e acesso a muitas das vias do seu trabalho, para além das ligações familiares que estabeleceu com tantas outras disciplinas (sobretudo o cinema), a banda desenhada, e a nossa intervenção, centra-se apenas em dimensões amplamente estudadas e apresentadas pelos historiadores desta arte no nosso país, como António Dias de Deus, João Pedro Ferro, Carlos Bandeiras Pinheiro e João Paiva Boléo, tendo estes dois últimos editado o volume O pirilau que vendia balões e outras histórias de Cottinelli Telmo, em 1999, através da Bedeteca de Lisboa e a Baleiazul, ainda hoje o volume de referência que agrega a obra banda desenhística, mas além dela, do autor.

A exposição, sendo apresentada num espaço tão exíguo, procura articular todas as dimensões multidisciplinares de uma forma integrada, mas não deixa de ser surpreendente encontrar ali a presença de muito (todo?) o material de Cottinelli Telmo nestas áreas, desde capas de livros ao incontornável e fundamental ABC-Zinho, mas incluindo-se mesmo desenhos que, sendo “soltos”, fizeram um imaginário muito próprio do autor. Deixamos algumas fotos [sem qualidade].

Estes historiadores, e outros, já apresentaram de forma consabida os dados biográficos, bibliográficos e estéticos que há a apontar, e dos quais bebemos. Resta-nos apenas acrescentar que, sendo Cottinelli Telmo um autor importantíssimo, de charneira mesmo, importa também compreender a sua plena integração num tempo particular, em que o acesso geral à cultura, às disciplinas expressivas, à possibilidade de criar, não era de forma algum nem um dado adquirido nem uma possibilidade simples, mas antes um caminho estreito. Isto significa que a sua integração num panorama mais alargado, europeu, é significativo, sendo possível associá-lo a tendências estilísticas que já vinham sendo cultivadas noutros países no mundo da ilustração de imprensa, caricatural e ensaística até, e que passaria em parte pela banda desenhada. Ainda assim, com Stuart e, depois Botelho, Nunes, e outros artistas, trata-se de uma geração que se encontra antes daquela linguagem “clássica” e “apurada” que se tornaria a norma com advento dos, posteriores, Saint-Ogan e Hergé.

Além disso, se há dimensão do “modernismo” que há a apontar de forma vincada, será menos a multidisciplinaridade do autor – inegável, mas tanto fruto das circunstâncias sócio-históricas do Portugal do primeiro quartel do século XX como recorrentes nos círculos artísticos desde longa data – do que a eleição da superfície como o plano principal do seu trabalho no desenho com vista à publicação, da ilustração e banda desenhada. Ao lermos Pirilau, A fita americana ou as outras histórias curtas, o mais surpreendente é a sua espécie de recusa à ilusão de profundidade, de aceder à “janela” de Alberti e Brunelleschi, mas antes à criação de um mundo totalmente bidimensional, de um prazer da linha habitando a superfície opaca do papel, o que se nota igualmente pelos seus dons de composição de capas, de desenhos soltos, de colagens, etc., enfim, numa noção primeira de design, que não em funções de projecção (cinematográfica, arquitectónica, etc.). Se já a sua “escrita” - mais tarde, já abandonados os “bonecos”, cumprido por outros mestres da bd portuguesa – poderá parecer algo antiquada, datada e reveladora das perspectivas sociais do seu tempo (mas também, aqui e ali, demonstrando alguns princípios de vislumbre de uma diferença positiva), as suas pranchas continuam, a nosso ver, a estar pejadas de uma verve imagética irrefragrável.

O programa é transmitido hoje às 12h10, com repetição à 1 da manhã. Para aceder ao programa em podcast, visitar aqui.


Estamos gratos à equipa do programa pelo convite. 

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