Uma vez que falámos de
alguns fanzines há dois posts, regressemos a este
território que, independentemente do acesso a novos modos de
produção e distribuição, sobrevivem enquanto formato válido e,
muitas vezes, particularmente reveladores de novas tendências.
Pode-se considerar, esperamos, o Clube do Inferno como um colectivo e
artistas. Se a esmagadora maioria dos seus títulos são a solo,
havendo alguns casos de colaborações cruzadas, e não tendo havido
nenhuma publicação verdadeiramente conjunta, estamos em crer que
todos os passos da produção de cada título conta com o apoio mútuo
de cada membro. Além disso, se as características estilísticas,
visuais, compositivas e até de género são bem distintas, quase ao
ponto de impossível irmanação entre eles, isso também contribui
de forma decisiva à variedade interna do grupo. (Mais)
Deixaremos aqui notas
extremamente breves sobre estes títulos, todos lançados
simultaneamente, com a excepção de Build More Love, que
ficará para uma outra oportunidade.
The Day the Masses
Left History. Astromanta. Tal como no anterior The
Scorcher, Astromanta utiliza a ficção científica para criar
uma pequena parábola em torno dos mecanismos de colonização
societal que o capitalismo emprega sobre toda a realidade. Com um
desenho “tosco” mas bem mais estilizado do que nos títulos
anteriores, algo devedor a Mat Brinkman, nestas oito páginas
acompanhamos The Scorcher e o seu pequeno ajudante, ou literalmente
Aide, na descoberta de novas fontes de petróleo utilizável e numa
passagem para um universo paralelo, que rapidamente utilizam para seu
próprio proveito. No entanto, essa missão não corre como esperado
mas, graças às tácticas previstas e treinadas ao longo de séculos
por este posicionamento utilitário, isso não significa que não se
encontro o melhor caminho para o seu proveito da forma mais rápida.
3 Stories.
Mao. Uma vez que as três histórias indicadas são compostas de
duas páginas em spread cada uma, e serem apresentadas com um
trabalho gráfico e de composição bem diferente entre si, por vezes
no interior de uma mesma “unidade”, a existência de um índice
ao princípio poderia passar por overkill mas é na verdade
útil. Se Radiation havia demonstrado um interesse do autor
pela criação de histórias desprovidas da presença humana e
elegendo criaturas como insectos ou bactérias como passíveis de
tecelagens narrativas, as duas primeiras histórias retomam essa
direcção: a primeira mimando alguma linguagem dos discursos
científicos para colocar uma pergunta paradoxal, a segunda (aqui
reproduzida) demonstrando algum interesse pelas questões formais que
a banda desenhada promove e permite para se colocarem questões sobre
narratividade, actancialidade e temporalidade. Menos uma história do
que uma estruturação de metamorfoses internas de um para-organismo,
o autor aqui aproxima-se ou dialoga directamente com uma longa
tradição de bandas desenhas experimentais. A última é uma espécie
de anedota e comentário meta-textual precisamente sobre a estrutura
da banda desenhada, o que nos convida a reler as três peças como
complementos e comentários uma das outras.
Yonkoma Collection.
Hetamoé. Se nos é permitido dizer tal coisa, mesmo incorrendo
numa argumentação algo incompleta, e até mesmo roçando a
injustiça, pensamos que é esta autora que, no interior deste
colectivo mais tem mostrado uma acelerada “maturação” dos seus
processos de trabalho, quer a nível visual quer a nível discursivo
(já que “narrativo” não seria exacto). Continuando na sua
perseguição de dimensões e afinidades tipificadas por uma
determinada banda desenhada japonesa, a autora escapa daquela
gravidade que levaria a uma mera descrição de “mangá à
portuguesa”, uma vez que as referências para essa aproximação
seriam as de autores post-Garo tais como Oji Suzuki e Seiichi
Hayashi. Isto é, estruturas narrativas em que o onirismo, a
melancolia e a poeticidade menos explorada está patente de forma
decisiva, desviando a banda desenhada para territórios menos comuns,
mas que autores contemporâneos como Aidan Koch, Balise Larmee e Lala
Albert também cultivam. Esta colecção de 17 tiras verticais
atravessa toda a espécie de combinações possíveis, de tiras quase
“silenciosas” - com excepção dos textos diegéticos – a
outras com diálogos, passando por acções concentradas e densas a
estruturas mais espalhadas no tempo e agentes, até mesmo
categorizações de objectos similares, mas que nesse breve arrolar,
consegue fazer excarcerar um qualquer significado inesperado e
produtivo. Como uma poesia feita dos mais simples elementos textuais,
obrigando o leitor a criar associações. E se há uma narrativa
geral mais ou menos coesa (as dores provocadas pelo amor), essas
sensações redimem aquilo que poderia ser visto como um quase
gratuito exercício weeaboo. Não o é.
Hetamoé <3
ResponderEliminarSPLASH!
ResponderEliminar(Balde de água fria).
- Acalma-te!
E segue os links para encomendares cópias. Seria óptimo venderes uns quantos em Coimbra...Destes e dos outros de que tenho falado.