1 de abril de 2015

Colecção Novela Gráfica: a colecção (Levoir/Público).

A presença da banda desenhada no mundo editorial português é, no mínimo, residual. Basta compreender que certos géneros literários, mais populares ou menos, têm uma distribuição equilibrada pelas várias editoras, assim como outros tipos de livros não-literários, ensaios ou romances de sucesso crítico. Sem a legitimação e papel cultural que terá a poesia contemporânea, a banda desenhada tem o mesmo tipo de veiculação por um punhado de editores menores e/ou especializados, uma distribuição comercial titubeante e que vive de certos circuitos específicos, e um público algo reduzido. Com a agravante, em relação à banda desenhada, da sua recepção crítica ser extremamente circunscrita, em termos de agentes e espaço na dita mediasfera (de que a blogosfera faz parte mas também poderá ser considerada, dados certos focos, como separada). (Mais) 

Assim, temos editoras maiores, ou integradas nos grupos editoriais concentrados, ora especializados, como a Asa (do grupo Leya) ou mais generalistas, como a Bertrand/Contraponto (primeiro integrando-se no grupo Bertelsmann, mais tarde na Porto Editora), ora temos estruturas editoriais mais pequenas e que tomam a si uma intensa actividade editorial diversificada: Chili Com Carne, Devir, Kingpin, Polvo, entre outros grupos ou editores individuais mais pequenos ainda. Mas no que diz respeito a uma banda desenhada que se reveste de uma certa ambivalência genérica, e que pretende por isso conquistar espaço “literário”, as coisas mudam de figura. A Asa, apesar da sua presença, experiência e catálogo, só muito raramente se vira para títulos mais maduros e, quando o faz, são coisas a meio-gás (Portugal). A Contraponto tentou construir um catálogo sólido e sério, com Persepolis e Fun Home, mas logo o Maus em um só volume voltou ao selo-mãe (impedindo a criação de uma imagem concertada e contínua), e não há notícias até à data. A Biblioteca de Alice, selo da Devir, vai publicando livros significativos, Blankets, Comprimidos Azuis e Habibi (independentemente das controvérsias e escolhos em que o último livro de Thompson se enleia, ele é sem dúvida um gesto significativo), e cabe a editoras “menores” como a Polvo e a Chili Com Carne, afinal, a irem dando continuidade à presença de obras estrangeiras com alguma importância crítica, face aos desenvolvimentos artísticos possíveis nesta forma de expressão.

A Levoir é um caso intermédio, e algo atípico. Especializada em projectos pontuais em colaboração com a imprensa, o seu modo de distribuição, circulação é drasticamente diferente do mercado livreiro. Seja como for, não se poderia de forma alguma falar de “concorrência” (desleal ou outra, como se costuma aventar), uma vez que ocupa um papel a que poucas outras plataformas parecem querer concorrer, precisamente. E se houve até agora uma aposta sobretudo em projectos de aparência mais comercial, como as dos super-heróis da Marvel e DC (publicando, na verdade, alguns dos títulos de maiores conquistas críticas no interior desse campo genérico), esta nova colecção é de um sinal bem distinto, mas mais do que necessário. Por um lado, a Levoir tem poder financeiro suficiente para poder assegurar os contractos necessários destes títulos, nem sempre simples de garantir, por outro, têm a vontade editorial e o conhecimento para poder gerir as escolhas desejadas e possíveis, nas pessoas de José de Freitas e João Miguel Lameiras. Sabemos que os doze títulos da colecção são aqueles garantidos de um quadro mais alargado de obras propostas originalmente, selecção a qual teve de ser burilada e batalhada até no seio de factores tais como a acessibilidade financeira dos direitos, o investimento necessário à sua publicação portuguesa (tradução, design, impressão, etc.), resposta dos detentores dos direitos, considerações de formato, dificuldade de edição, integração num programa coerente, companhia de outras obras no mercado – ponderando, por exemplo, autores mais conhecidos e publicados, obras totalmente desconhecidas, variedade geográfica, etc. Caberá aos jornalistas da especialidade entrevistar os envolvidos para expandir o contexto exacto.

É curioso como as primeiras reacções das notícias desta colecção foram tipicamente reacções de “coleccionadores”, que preferiam objectos mais convencionais e comerciais, ou de típicas listas alternativas. Raramente se abordam os títulos efectivamente propostos. As escolhas, como sempre, são individuais e livres, e pouco importaria fazer um exercício de “se fôssemos nós a editar”, o que além de ser vão, é um desserviço ao trabalho feito. Sobre os títulos, falaremos brevemente mais à frente, uma vez que este ensaio concerne antes a considerações sobre o seu papel no nosso contexto em particular.

A pergunta principal é então, que território é este desenhado por atacado com esta colecção Novela Gráfica?

Um dos primeiros pontos a assinalar é que este território aproxima-se do “literário”, não num sentido de adaptação de textos literários – através de, usualmente, um trabalho de redução a vários níveis, ou mesmo empobrecimento, inclusive o cultural; porém, deveremos notar que pelo menos um títulos, o de Toppi, é uma adaptação, ainda que não se possa dizer que o seja tout court - mas no sentido preconizado por uma revista como a (A Suivre), mais do que qualquer frente norte-americana: a produção de bandas desenhadas em que a estrutura visual é um factor determinante e integrado da narrativa, e que se dirige a um público culto e sofisticado. Não se pretende apresentar uma personagem, por hipótese, flexível e permutável que habitasse várias aventuras, mas antes à criação de uma situação que aceda a uma realidade intelectual, emotiva e expressiva intensa.

Dada a relativa pobreza editorial do panorama português por comparação a mercados como o espanhol, alemão, brasileiro, coreano, italiano, flamengo-holandês, já para não falar do norte-americano e belga-francês (se bem que se poderia argumentar que cada um deles teria falhas, como é natural), quer em termos históricos relativos quer em termos contemporâneos absolutos, o segundo aspecto positivo a apontar, senão mesmo o mais importante, das obras efectivamente disponibilizadas por esta colecção, é o da sua diversidade interna, a mais do que um nível. Vejamo-los, um por um. Comecemos, algo arbitrariamente, pelas datas.

Temos aqui livros que vão desde os anos 1960 (Mr. Natural) passando pelos 1970 (Um contrato com Deus) – e que exerceriam uma influência tremenda em toda uma série de autores e campos desde então - até chegarmos a títulos que conquistaram uma atenção crítica quase inusitada nos tempos actuais (A arte de voar).

Em termos geográficos, temos também uma diversidade inédita. Não se pode dizer que haja aqui uma concentração específica num campo, com apenas dois autores norte-americanos (e não do mainstream, pelo menos Eisner não estará lá graças a este título), quatro provindos de áreas bem distintas do alargadíssimo campo dito franco-belga, e depois autores de quadrantes diferentes, inclusive um autor português. Falta algo? Claro que sim, como na anedota, poderíamos acrescentar um polaco, um alemão, um russo, um chinês e um mexicano, mas esses exercícios de extensão hipotética são infinitos.

Para os coleccionadores hardcore, isto é fetichistas mas sem autonomia, poderá ser algo constrangedor ser confrontado com objectos diferentes entre si, e na verdade a flutuação dos formatos nem sempre segue com exactidão os originais (como no caso d’A louca do Sacré-Coeur, mais pequeno, ou de Um contrato com Deus, menor, deixando a página original a “flutuar” em margens demasiado brancas e vazias). Todavia, suspendendo os reparos que se poderão fazer a títulos individuais, importa notar, para além das diferenças em termos de formatos, tamanhos, e materialidades dos originais (álbuns franco-belgas, comic books norte-americanos, revistas periódicas argentinas ou japonesas, e o mais recente formato universal de “romance”), os modos de produção de cada título. Alguns deles foram publicados à medida de “capítulos” - algo diferente da serialização mais clássica da aventura, que se chamaria por “episódios”, reaproximando então ao objecto literário -, como é o caso de Mort Cinder, que saíra na Misterix, d'A viagem de Baudoin, que saiu na revista japonesa Morning antes da edição francesa. Noutros casos temos uma dilogia ou trilogia de álbuns (Em busca de Peter Pan, A louca) mais tarde reunidas em um só volume; ou histórias individuais, como as de Mr. Natural, agregadas mais tarde, e até para surpresa do autor quando as iniciou. O caso de Will Eisner é particular, já que são três contos separados publicados num livro por vontade do autor, com uma estratégia clara em mente. Apenas metade dos livros, então (e seriam discutíveis os seus passos), foram publicados originalmente como tal.

Dos doze títulos, repare-se na variedade temática. Elaboração de adaptação literária (Sharaz-de). Associação à história nacional (A arte de voar, Foi assim a guerra das trincheiras). A vida quotidiana (A viagem, Um contrato com Deus, O diário do meu pai). Uma biografia (mesmo que seja “do outro”, com A arte de voar). Elementos de géneros populares (Um bando de dois, O livro de Mr. Natural). Cruzamentos do “mundo normal” com elementos fantásticos (Mort Cinder, Beterraba: a vida numa colher, A louca do Sacré-Coeur). E poder-se-ia complicar ainda mais estas distribuições se tivéssemos em conta aspectos relacionados com as estruturas narrativas, as ordenações temporais, as coordenações entre as vozes dos protagonistas versus narradores, já para não falar de especificidades formais da banda desenhada, como as mise en page, o trabalho de linha, de cor, etc.

Finalmente, importará apontar igualmente a questão da autoria. Ao contrário do que poderia pressupor-se, não há uma apresentação exclusiva de autores singulares, seguindo o mito do “autor completo”. De doze títulos, três são colaborações, em que tanto os escritores e os artistas têm outros livros (os artistas também a solo, etc.). E esses autores são absolutamente incontornáveis não apenas nas suas contextualizações nacionais e estilísticas, mas de importância na própria história desta disciplina artística no seu todo. Osterheld não é de facto o melhor escritor de banda desenhada argentino dos anos 1950 a 1970. Como disse Domingos Isabelinho, Oesterheld é um dos melhores escritores de banda desenhada, point. Toppi não é apenas um grande desenhador italiano da escola de Milão. É uma referência fulcral para qualquer leitor de critérios agudos e conhecimentos integrados numa história da cultura visual alargada. Baudoin é um dos melhores poetas que alguma vez gracejou esta arte. Altarriba deu um contributo indelével ao modo como a autobiografia, a biografia do outro e a agência política se podem misturar de forma poderosa. Taniguchi reescreve a ideia da mangá enquanto retrato da experiência da memória humana.

Estes não são meros “autores bons”. Cada um destes livros, em graus diferentes é certo, com intensidades bem distintas e até importâncias discutíveis, são passos que interessam no crescimento da banda desenhada enquanto disciplina artística em diálogo com a cultura em geral, e não somente a sub-cultura de adolescência tardia e consumismo intermediático. A qual, diga-se, não nos enganemos, tem a sua importância, os seus prazeres e as suas conquistas, que também seguimos, mas é necessário compreender as diferenças a partir de uma perspectiva informada por um certo contexto artístico, alargado à diversidade do mundo.

A presença de alguns destes volumes finalmente em português é um gesto extremamente significativo e enriquecedor. Em termos da história alargada desta arte temos aqui finalmente acesso a livros que jamais devem estar ausentes de quaisquer listas de aprendizagem séria e balançada.

Nesta faceta da discussão, pouco importa anunciar as “faltas”, pois elas sempre existem. Em termos cronológicos, não seria impossível recuar para trás dos anos 1960, mas ao mesmo tempo compreende-se a necessidade de alimentar os mitos, começando com Will Eisner. Porém - porém, porém... -, importará talvez notar uma dimensão de ausência. É que não há uma única autora mulher (para não discutirmos outras linhas atentas a outras distribuições sociais, étnicas, sexuais, etc.). Se bem que “já” tenhamos acesso a Marjane Satrapi, Alison Bechdel e, mais recuadamente, Claire Bretécher, em português, a verdade é que o território da criação feminina tem autoras perfeitamente capazes de ombrear os autores aqui reunidos, bastando recordar Chantal Montpellier, Posy Simmonds, Linda Barry, Zeina Abirached, Miriam Kaitin, Carla Speed McNeill, Carol Tyler, Jessica Abel, Clamp, Gabrielle Bell, Moto Hagio, Melinda Gebbie, Robert Gregory, Julie Doucet, Megan Kelso... e tantas outras (e só para indicar “autoras completas” com trabalhos no “género literário”). Se bem que estamos informados que houve tentativas nesse sentido, o cômputo final e efectivo da colecção ficou aquém das expectativas desse lado, o que poderá contribuir à ideia feita de que os “mestres” todos são homens (e sabemos que não é esse o entendimento dos editores).
Feitas estas ressalvas, esta colecção, portanto, deve ser entendida como não desejando de forma alguma “corrigir” o total desaparecimento do mercado das revistas com material em pré-publicação, nem integrar-se somente à “sub-cultura” bedéfila, mas antes responder de modo efectivo, diverso e inteligente à circulação e integração no diálogo intercultural permitido nos circuitos literários, adultos, cultos, sofisticados. Todavia, essa mesma circulação tem um preço, contra a ideia de banda desenhada, e que se prende, em parte, com o termo que dá nome à colecção.

Não faremos aqui o complexo historial do termo “graphic novel”, que não tendo nascido com Eisner em 1978, com A contract with God, é com ele que ganharia, em retrospectiva, uma presença e uso indelével. Fazer a história desse termo em particular é, em si mesma, uma novela! Apenas na viragem de 1986, com Maus, The Dark Knight Returns e Watchmen, é que a discussão começaria fora dos circuitos usuais, e seria preciso esperar pelo final dos anos 1990, com a distribuição em redes livreiras e emergência de uma mais lata crítica “literária”, para que a sua consolidação fosse total. No contexto europeu, esse termo seria estranho, já que a circulação de objectos tais como os álbuns remontavam ao século XIX, com muitas transformações. E no Japão a existência de “livros” que não os tankonbon nem hoje é assegurada.

A verdade é que o seu uso corrente, nos Estados Unidos, leva muitas vezes a complicadas distinções. Academicamente há quem tente construções tais como “graphic literature”, “graphic narrative”, “graphic fiction”, cada qual com os seus contornos específicos e problemáticos, mas sempre na ideia de os distinguir de “comics”, o que nos parece tão disparatado como distinguir de forma essencialista “cinema” de “movies” ou “film”, mesmo que se queiram distinguir níveis societais de linguagem, a materialidade do meio, um termo mais afecto à discussão estético-filosófica, etc. Os próprios autores sempre tentaram termos algo estranhos e que jamais ganharam circulação: picto-novella ou boovie! Outros ganharam presença, mas em usos específicos, como comix. Na Europa, e noutros locais, existem termos vários, o que sempre significou um dos problemas para a emergência de facto de uma comunidade global desta arte, ao contrário de outras disciplinas artísticas, mesmo as mais “jovens” (mas não imaturas intelectual e conceptualmente). No que nos diz respeito pessoalmente, preferimos dizer sempre “comics” e “banda desenhada”, conforme os idiomas.

O problema deste nome da colecção é duplo. Em primeiro lugar, está a tradução, algo literal de “novel” por “novela”, que de um ponto de vista da ciência literária está errado. “Novel” é romance, e um romance distingue-se de uma novela por vários factores, sendo o “tamanho” usualmente o central (mas que implica vários modos de organizar a dimensão temporal, actancial, etc.), ainda que ambas as classificações genéricas digam respeito, as mais das vezes, à ficção. Dos doze livros presentes, um pelo menos não o é de todo (A arte de voar). Muito dificilmente também se poderiam considerar novelas os livros de Eisner (três contos), de Crumb (histórias curtas), de Osterheld-Breccia (relatos distintos, mesmo que haja uma história enquadradora), e mesmo que novela não tenha qualquer dimensão valorativa, a densidade psicológica e emocional dos livros de Rocha, Taniguchi, Baudoin, Tardi, e o imbróglio da colaboração de Jodorowski e Moebius também não assenta perfeitamente no uso desse termo.

Mas em segundo lugar está aquela dimensão “literária”, que tem também consequências em termos, lá está, valorativos e diferenciadores no seio de um mesmo meio, arte, linguagem, e que vai contra aspectos materiais e históricos desta disciplina. É levar alguns leitores a dizerem que “não lêem banda desenhada” mas sim “apenas romances/novelas gráficas”, como se existisse alguma distinção entre ambos em termos de estruturação dos seus modos de expressão e resultados afectivos por uma diferença de formato e circulação. Isso seria votar toda uma história de textos que não tiveram a fortuna de serem agregados entre duas capas duras a um esquecimento imerecido, como se tem verificado em tantos gestos daquilo que repetidamente temos chamado “recuperação da memória” da banda desenhada. Isso seria um gesto de demérito em relação a conquistas que certos títulos terão tido, por uma razão mais comercial, de circunstância, de contexto editorial, e que em nada expressa o seu valor intrínseco. É criar hierarquias construídas externamente e não uma compreensão matizada no interior da banda desenhada.

Quererá isto dizer que é esta colecção contribui para “erros categóricos”, para a construção de uma ilusão, em que a presença fulminante de determinados objectos apaga sequer a possibilidade de olhar para outros? De forma alguma. Pensar isso seria um disparate. Esta colecção vem colmatar falhar que não foram jamais endereçadas pelas plataformas mais comerciais que as deveriam ter respondido atempadamente, e não retira mérito algum a todas aquelas que haviam de facto contribuído para esse fim geral. E o panorama que oferecem é de uma diversidade verdadeiramente sentida, e que esperamos chegará a um público alargado, e não somente aquele já convencido “do que gosta”. Nada há de errado em colecções da Marvel, DC, Spirou ou outras, e haverá certamente muita coincidência de público (como nós mesmos, por exemplo). Mas estamos seguros também que esta colecção escapará a uma certa gravidade, e atingirá um público bem mais diverso – sobretudo quando tiver distribuição em livrarias, mais tarde - ou assim o esperamos. Para que a próxima tarefa de colectânea, como se reza neste campo, continue…

Amanhã (esperamos) deixaremos alguns comentários breves sobre cada um dos títulos.

Nota final: tendo feito o prólogo para três volumes desta colecção (a saber, A louca do sacré-coeur, A arte de voar e O diário do meu pai), deixamos aqui agradecimentos a José de Freitas e João Miguel Lameiras pelo convite e trabalho de edição dos textos. À editora, a oferta dos livros. Algumas das imagens colhidas na internet, uma das quais do blog de Lameiras. 

16 comentários:

  1. Coleção Romance Gráfico? :)

    ResponderEliminar
  2. Essa foi uma GRANDE discussão entre a equipa toda, com eu a lutar ferozmente por se utilizar Romance Gráfico, e o Lameiras (que vai ter que me ouvir até ao fim dos dias no sentido Bíblico do termo) a empurrar para Novela Gráfica. No final, como essa expressão já parece estar semi-consagrada, ficou Novela Gráfica.

    Dito isto, ainda no outro dia tive uma acesa discussão como Geraldes Lino, que acha eminentemente defensável que se use Novela, até porque o tamanho e tipo de histórias seja tão variado que autorize isso.

    Na minha opiniõa - completamente subjectiva - romance, romance... nesta colecção são mais ou menos metade: O Louca do Sacré-Coeur, o Arte de Voar, talvez o Beterraba, o Peter Pan, talvez o Diário do meu Pai, talvez (menos) o Bando de Dois. Os outros são... sei lá, outra coisa. Válida, claro, mas não "romance-romance".

    Finalmente, cabe-me a mim como um dos editores da colecção e seu coordenador, agradecer ao Pedro Vieira de Moura a prestabilidade, a inteligência e interesse dos textos que mandou, que enriquecem e muito os volumes em que saíram, e... a rapidez com que reagiu à nossa solicitação!

    ResponderEliminar
  3. Olá, José,
    Obrigado pelas palavras.
    Quando digo que "novela" é errado, apenas o digo em relação à passagem de "novel", nada mais. A opção de nomear a colecção é totalmente livre e vossa, e essas consagrações são sempre fruto de vários factores. Eu, pela minha parte, chamaria "Colecção Estruturas Narrativas em Banda Desenhada com Laivos Literários e Cruzamentos Genéricos Pós-Modernos mas Assinalando Categorias Clássicas", mas julgo que é por essa razão que não sou convidado a baptizar crianças.
    O que importa é a circulação e presença dos livros, e o debate não é vão, bem pelo contrário, é necessário. Se não houvesse discussões dessas, é que estava o caldo entornado, nos consensos moles...
    Até breve!
    Pedro

    ResponderEliminar
  4. Olá Pedro.
    A discussão Novela Gráfica/Romance Gráfico foi grande, mas a decisão final foi do Público, que achou que o termo Novela Gráfica era mais reconhecível. è óbvio que não é uma tradução correcta de Graphic Novel, mas também a expressão Banda Desenhada, que ninguém contesta, é uma má tradução do francês Bande Dessinée, pois Bande significa tira e a primeira vez que a expressão foi usada em França, foi num contrato da distribuidora Harmonia Mondi, referindo-se aos comic strips, as tiras de imprensa americanas, como "bandes dessinées".
    Mas isto parece-me uma questão acessória, pois já dizia o Shakespeare "thart wich we call a rose by any other name would smell as sweet".
    Abraço,

    ResponderEliminar
  5. Só mais uma coisa. Reconheço que falta uma BD de uma mulher nesta colecção, mas, como sabes, havia autoras de BD na lista inicial. Também a nível dos textos introdutórios gostaríamos de ter tido uma mulher a escrever, mas se isso não aconteceu, não foi por falta de vontade nossa...

    ResponderEliminar
  6. Acho que o Lameiras está a fugir com o rabo à seringa, e nesta questão vai MESMO ter de me ouvir até ao fim dos dias. ELE QUIS QUE FOSSE NOVELA!! Se ele me tivesse apoiado... hehehehe

    ResponderEliminar
  7. Estão de parabéns, fico a espera de uma segunda volta desta colecção, quem sabe desta com uma ou outra mulher. Pedro Moura apresentou aí uma lista de autoras femininas(tinha de ser).

    "Em termos da história alargada desta arte temos aqui finalmente acesso a livros que jamais devem estar ausentes de quaisquer listas de aprendizagem séria e balançada".

    Pedro Moura disseste e bem, estes livros significa acesso a um vasto público e numa escolha de qualidade, mostrando as potencialidades deste meio.

    Contribuiem concerteza para uma aprendizagem e reconhecimento desta arte.

    Citando mais uma das tuas frases Pedro.
    "A roda não tem de ser inventada, pois existem muitas, muitas rodas. Convém conhecê-las.

    Obrigado.

    ResponderEliminar
  8. Olá Pedro,
    Sou absolutamente a favor do termo "novela gráfica", que não pela sua justeza ou correcção, mas por novela ser um substantivo feminino que espero mais apelativo ao "belo sexo". Já fui sexista que chegue? A banda desenhada, apesar das listas que nos apresentes, é ainda um "man's man's man's world" e por isso lamento imenso que metade da humanidade esteja quase completamente arredada da bela arte. Quando sabemos que em Portugal, para literatura de ficção, o público feminino representa mais de 80% do total dos leitores, que bom seria ver as mulheres começarem a consumir bd nos mesmos valores e o mercado a aumentar proporcionalmente por 4 vezes. Não teríamos todos esperado tantos anos para ler estes e outros títulos de igual dimensão na língua portuguesa. Cotas? Pois claro que sou defensor, e não precisam de ser constituídas exclusivamente por mulheres, os temas também "cotam", basta lembrar o número de leitoras que autores como Neil Gaiman ou Alison Bechdel ;-DDD conseguiram trazer para a banda desenhada.
    Só espero que a atenção inusitada que esta colecção tem tido nos blogues e a enorme quantidade de comentários que tem provocado sempre que alguém a divulga queira significar a jusante um grande sucesso de vendas. De minha parte desejo "ardentemente" que esta colecção tenha continuidade e (quase) apetece deixar um apelo interessado a todos os "sócios" para que pela pechincha de 9,90 ofereçam estes livros às suas mulheres (e podem ser duas de cada vez:-). Excepto o do Crumb, por razões do domínio público, parece-me...
    Obrigado e um Abraço,
    José

    ResponderEliminar
  9. Olá a todos.
    João Miguel Lameiras, espero ter sido suficientemente claro no meu texto de que essa "ausência" não é fruto dos teus esforços e do José de Freitas, mas sim pelas circunstâncias em negociar os títulos. Isso que fique claro. No entanto, e como tu próprio o farias, é apenas uma das dimensões em que, feito o cômputo final do que foi possível fazer - nesta primeira leva, esperemos -, se nota algum desequilíbrio. E acho que é mais importante do que comparar esta colecção particular com aquelas que fazem lombadas com desenhos completos, ou dedicadas a personagens específicas de armas nas mãos e máscaras espectaculares.
    Quanto ao termo, a tradução de "bd" é muito bem-indicada, e é verdade que a história das línguas, e a portuguesa não é excepção, é feita de desvios de muitas das normas. Ainda assim, terá de haver pessoas a fazer o papel de convervadores e outros de inovadores. Neste caso específico, faço de conservador, como é evidente. Mas, por outro lado, como mesmo no trabalho académico mais seco utilizo o termo "banda desenhada", tenho uma opção, não é?
    Caro PDSF e JS, obrigado pelas vossas palavras, mas o que interesse aqui é ler estes títulos e fazê-los circular o melhor possível. Sabendo que existem várias pessoas com o desejo de integrar o estudo da banda desenhada de uma maneira mais culturalmente sólida em vários circuitos, esta colecção traz uma barrigada de opções (a juntar a algumas das coisas que já estavam antes disponíveis, como é evidente).
    Faltam coisas? O que não falta, num país destes?
    Abraços,
    Pedro Moura

    ResponderEliminar
  10. Eu e o pedordinissantosferreira expressamos o nosso total apoio a esta colecção e à presença de mulheres na BD. Pela tua resposta parece que nos queixamos da colecção e que discordamos da tua crónica. Lê lá com mais atenção, por favor :-DDD.
    Não falta nada a esta colecção (nem mesmo os teus brilhates textos) e só espero que não faltem leitores.

    ResponderEliminar
  11. Espero que não entremos num turbilhão de "sim, mas". Eu percebi que há o apoio, claro. Só estava a querer sublinhar que todas as questões apontadas, sendo necessárias a um diálogo sólido - de forma a de facto contribuirmos para o facto de haver algo a dizer sobre a banda desenhada -, não invalidam a atenção dada directamente à colecção. Com o Baudoin, Toppi, Oesterheld-Breccia, Tardi, Taniguchi, estamos bem servidos...
    Pedro

    ResponderEliminar
  12. Pois eu dispensava bem o Taniguchi. O ponto fraco desta excelente coleção para mim. Eu digo isto sendo Gekiga a minha paixão maior dentro da BD. Mas este Taniguichi é deslavado até no desenho, uma coisa mesmo sem ponta de vida.
    Eu sei que há muitos condicionalismos, e que não poderíamos ter um Tsuge ou um Takita Yu, mas no meu caso é mesmo, tudo menos Taniguichi.

    ResponderEliminar
  13. Caro Anti-herói,
    Todos nós temos as nossas preferências, o que é natural. E não quero defender a colecção como se não houvesse amanhã, mas compreendo muitos dos condicionalismos e também o escopo das escolhas necessárias num projecto deste cariz comercial. Eu também gostava de ver uma edição portuguesa de "The Cage" ou "Conte démoniaque", mas não seria através desta plataforma.
    Além disso, não gosto de criar hierarquias entre coisas incomparáveis, mas não compreendo como é que "O diário do meu pai" poderá provocar urticária onde não esteja presente também alguma reticência face a "Bando de dois" ou mesmo a obra de Jodorowski e Moebius, ou o melodrama de "Um contrato com deus". É tudo muito distinto.
    Dito isto, que venha o Tsuge, naturalmente.
    Pedro Moura

    ResponderEliminar
  14. Olá a todos.

    Pedro, parabéns pelos textos que vais publicando.

    Tenho andado ocupado com assuntos não-bedéfilos e chego tarde a esta caixa de comentários, mas quero parabenizar o José Freitas e o João Miguel Lameiras pela iniciativa da bela colecção que organizaram: excelente!

    Entretanto, sobre a dicotomia "romance gráfico" ou "novela gráfica", não sou fã de nenhuma das designações, mas nenhuma me choca. Também não gosto da designação "banda desenhada" e uso-a sem problemas, porque, enfim, é o nome mais reconhecível. Porém, prefiro recuar até ao Rodolphe Töpffer e utilizar a designação que ele inventou: literatura gráfica -- acho que desse modo se resolve a questão da dimensão das obras a designar (se são curtas, se são longas) ou se são, por outro lado, bandas desenhadas de pendor "tradicional", diga-se assim, ou de recorte mais experimentalista. Ou seja, "literatura gráfica" engloba todos os casos. (Penso que o Töpffer, a dada altura, também falou em "novela gráfica" ou em "romance gráfico"; irei mergulhar nas camadas mais fundas das estantes em busca desse material.)
    É um contributo que deixo para a conversa sobre este tema que nós todos gostamos.

    Abraços a todos.
    David Soares

    ResponderEliminar
  15. Olá, David,
    Sei que tens estado ocupadíssimo claro, e tenho pena de não poder ir assistir às Sextas com ou sem sustos, mas eu também tenho tido as da Oficina do Cego. Ha, e parabéns! :)
    Quanto ao termo: é verdade: nenhum dos temas é particularmente feliz, e como recordou o João Miguel Lameiras, a própria designação "banda desenhada" é, da nossa parte, um galicismo de uma tradução selvagem/literal do inglês. Realmente, "histórias aos quadradinhos", soando menos nobre, era mais consistente. A verdade é que os termos vão sendo tentados, mas há um uso forte sobre cada um deles associados a jogos sociais diferenciados. Eu também uso "banda desenhada" e "comics" sem pestanejar, uma vez que, no caso do primeiro, pertenço a uma geração que foi exposto a ele, o termo, de uma forma quase consolidada, e no segundo, através do mundo académico, precisamente por uma tomada de posição mais englobante, desembaraçada de hierarquias e juízos de valor a priori que o termo "graphic novel" parece implicar.
    O Töpffer empregara o termo "littérature en estampes" logo no início, quer na correspondência quer no seu ensaio, e em vários passos tentou perceber em que medida era inovadora a forma como ele se propunha a reinventar a possibilidade de contar histórias com imagens (e texto, no seu caso). O Harry Morgan, teórico e crítico francês, fala mesmo de "literatura desenhada", mas engloba nesse termo outras produções, tal como o Pierre Fresnault-Deruelle tentou variadíssimas construções que ora juntam a banda desenhada a este tipo de produções de imagem ora a outras.
    Na verdade, e no fundo, essa é a maneira mais interessante. É usar as palavras e vários momentos ou modos de descrição, e ir vendo os mesmos objectos de várias perspectivas.
    Volto a repetir uma ideia: não estou a indicar que o uso do termo "novela gráfica" seja o ditame do projecto. Bem pelo contrário, até poderia ser chamada "Colecção Gelatina de Choco-Chucrute" que continuaria a ser a mesma fileira de objectos a ler - se bem que levaria a outra discussão sobre nomenclaturas.
    Tenho notícias de que o sucesso comercial tem sido satisfatório, por isso só posso desejar que, mesmo que não sejam os "meus" títulos preferidos (pois isso não interessa a não ser a mim mesmo), eles abram espaço a novos leitores, a uma eventual segunda fornada, e isto possa contribuir à diversidade da tipologia da nov... banda desenhada entre nós.
    Abraços,
    pedro

    ResponderEliminar
  16. uma nota solta

    o JML no seu prefácio ao mort cinder refere e cita-se " superior qualidade de reprodução "

    não achei....

    no livro do Toppi mesmo reparo

    as edições do Baudoin e do Miguel Rocha bastante inferiores às edições da Seuil e da Polvo

    escolha do papel talvez...

    ResponderEliminar