Apesar deste não ser um espaço de novidades, gostamos, dentro da
medida do possível, de ir seguindo o ritmo das publicações mais recentes,
alimentando uma atenção particular para com as novas tendências das linguagens
que nos interessam. Este livro foi publicado em 2014, mas tendo-nos escapado
entretanto, e graças à chamada de atenção de Domingos Isabelinho, esta é uma
daquelas oportunidades em que o “atraso” se justifica mais que o silêncio. Até
porque a importância e valor deste livro vem contribuir para os temas e
questões que mais têm alimentado o nosso trabalho pessoal, pesquisas académicas
e preocupações docentes: a linha diáfana entre os ditos “mundo da arte” e a
“banda desenhada”, e a maneira como as respirações de um a outra são bem mais
complexas do que usualmente se retrata e, mesmo ao contrário da vontade e
opinião dos guardiões das fronteiras estéticas, a transmissão e influência é
bem mais dual e completa do que se costuma mostrar. (Mais)
31 de março de 2017
30 de março de 2017
La bande dessinée au tournant. Thierry Groensteen (Les Impressions Nouvelles)
Estando nós particularmente “atrasados” em dar conta de
dezenas de novos livros teóricos, académicos e ensaísticos sobre a banda
desenhada e outras disciplinas, dado o nosso próprio percurso de investigação,
mas aos quais esperamos retornar em breve, mesmo que sumariamente, tentemos
porém regressar de forma sucinta e tímida, com este último opúsculo de
Groensteen. (Mais)
1 de Abril: Seminário Banda Desenhada e Pensamento Político: Sessão 5
O Seminário iniciado em finais de Novembro chega à sua quinta sessão, num ambiente bem diferente. Desta feita, encontrar-nos-emos na galeria Zaratan, espaço privilegiado de desassossego e interrogações estéticas de todos os azimutes, e os convidados são Marcos Farrajota, no seu papel de editor da Chili Com Carne e autor de bandas desenhadas de reportagem cultural, e José Smith Vargas, autor de banda desenhada que se tem "epecializado", se assim se pode dizer, em reportagens em torno de questões políticas, sobretudo na secção "Mapa Borrado" do jornal Mapa.
A discussão rondará o tema da "cidade e da multidão", tema particularmente baudelariano, mas esperamos que a nossa flânerie nos leve às questões que neste momento mais urgem na cidade de Lisboa, em Portugal ou mais além, num esforço de politizar a cidadania, e com a banda desenhada.
A discussão rondará o tema da "cidade e da multidão", tema particularmente baudelariano, mas esperamos que a nossa flânerie nos leve às questões que neste momento mais urgem na cidade de Lisboa, em Portugal ou mais além, num esforço de politizar a cidadania, e com a banda desenhada.
29 de março de 2017
Parker, vols. 2 e 3. Richard Stark e Darwyn Cooke (Devir)
Uma vez que já havíamos falado
alargadamente da estrutura literária e da forma dialogante entre a
adaptação em banda desenhada de Cooke e os romances de Stark,
passaremos à leitura imediata dos livros em si. Ficando ainda a nota
de homenagem ao artista, cuja morte foi uma surpresa triste há tempo
recente.
Cada um dos volumes de Parker
lê-se com efeito como uma novela centrando-se nos “trabalhos” a
que o criminoso se entrega. É curioso como apesar de o acompanharmos
e termos mesmo direito de ir compreendendo alguns dos mecanismos
psicológicos que o movem, e o tipo de “ética”, se assim se pode
dizer, que pautam o seu profissionalismo, há sempre um limite curto
desse mesmo conhecimento. Parker é ainda um homem misterioso,
silencioso, que não se deixa endrominar por explicações fáceis.
Todavia, essa distância com o leitor é também aquilo que impede
uma qualquer empatia ou simpatia total por uma personagem que não
esconde de forma alguma ser um sociopata (mesmo que isso seja fruto
das alterações mais violentas operadas por Cooke, e não as novelas
originais, mais de 20, datadas da década de 1960-1970): machista,
violento, ladrão, assassino, etc.. Mesmo os pequenos laivos de
“amizade máscula” que ele demonstra para com os seus colegas não
será suficiente para o redimir face a uma moralidade humana
societal. Mas as novelas policiais, já o havíamos dito, não são
habitadas por flores que se cheirem… e há criações tão famosas
com criminosos como personagens principais quanto com heróis e
justiceiros. (Mais)
27 de março de 2017
Mensur. Rafael Coutinho (Companhia das Letras)
Depois
de Cachalote, em colaboração com o escritor Daniel Galera, e
O beijo adolescente, a solo, Rafael Coutinho traz um novo
livro, num desses fôlegos que usualmente na circulação social da
banda desenhada é um garante de uma conquista particular junto à
atenção mediática mais normalizada. Para os seus leitores
contínuos, não haverá necessidade de recorrer a esse tipo de
musculatura e presença para demonstrar as suas capacidades
expressivas, mas sempre se cria uma impressão. (Mais)
25 de março de 2017
Bruma. Amanda Baeza (Chili Com Carne)
Quando falámos atempadamente do trabalho de Amanda Baeza,
ainda no interior de uma lógica de pequenos fanzines ou edições independentes
de uma circulação limitada, tínhamos perfeita noção de que mais tarde ou mais
cedo a acumulação desses trabalhos emergiria num corpo maior. Se ainda não é o
momento, talvez, de uma obra maior em si mesma, pelo menos a sua colação
permitirá chegar a um público mais alargado e, de resto, tem sido essa a missão
da colecção Mercantologia, da Chili Com Carne, nos últimos anos: a de
re-oferecer alguns dos melhores gestos da comunidade zinesca a uma circulação mais
lata. (Mais)
24 de março de 2017
Colaboração no The Comics Alternative: Stardust Nation, de Deborah Levy e Andrzej Klimowski
O que acontece quando os nossos sistemas de empatia ultrapassam as fronteiras do ego para começarmos a identificar-nos perigosamente com o outro, derrubando as fronteiras, abrindo a nossa experiência própria à alheia? E o que ocorre se essas passagens se elaboram no centro de vários triângulos de dramas psico-familiares?
Uma colaboração entre a dramaturga britânica Deborah Levy num pequeno e simples conto que recorda alguma da programação clássica do Channel 4, e com os desenhos, desta feita coloridos e algo domados, de Andrezj Klimowski, de quem havíamos falado antes, explora essa mesma intriga.
O texto em que o lemos está no The Comics Alternative, aqui.
Uma colaboração entre a dramaturga britânica Deborah Levy num pequeno e simples conto que recorda alguma da programação clássica do Channel 4, e com os desenhos, desta feita coloridos e algo domados, de Andrezj Klimowski, de quem havíamos falado antes, explora essa mesma intriga.
O texto em que o lemos está no The Comics Alternative, aqui.
23 de março de 2017
Science Comics, vários títulos. AAVV (First Second)
A ideia de usar a banda desenhada como um meio de transmissão de
informação, como meio de educação, não é de todo nova. Se englobarmos as
imagens Quentin nessa equação, ancoramo-nos mesmo nas origens populares e na
infantilização desta disciplina no século XIX. Mas poderíamos recuar ainda
mais, se se pensasse em questões dos livros ilustrados medievais, das
enciclopédias aos Musterbuchen, e a
inúmeras práticas. Usualmente, esta utilização é vista com alguma desconfiança
quando se parte de um ponto de vista estritamente estético, uma vez que os
instrumentos empregues por estes exemplos não serão aqueles que mais
preocupados estarão com a pesquisa da expressão, com a individualidade autoral,
mas antes subsumem-se a noções tais como as da legibilidade, da
inteligibilidade, da clareza de argumentação, etc. E muitas vezes acompanham-se
de um qualquer enquadramento moralista que é bem distinto da visão mais
progressiva. Não se pode, porém, negar que esse “uso”, não sendo artístico ou
literário ou politicamente relevante, ainda assim conseguirá conquistar de
quando em vez um qualquer grau de competência que a faz escapar de uma oferta
desapaixonada. (Mais)
19 de março de 2017
Cadernos de Viagem. Anotações e experiências do Psiconauta. Laudo Ferreira (Devir Brasil)
Este
livro é um gesto bem distinto no percurso do seu autor. Não se podendo assumir
totalmente como um gesto autobiográfico,
existem suficientes informações extratextuais – o prefácio de André Diniz, as
notas de agradecimento do autor, a sua própria foto, etc. – que apontam para a
sua construção enquanto bebendo dessa mesma experiência, lançando-a, portanto,
naquilo que Serge Doubrovsky definiu como “autoficção”. Um jogo de tensões e
espelhos que permite, a um só tempo, aproximar o que lemos de uma ideia, mesmo
que vaga, de que corresponderão à experiência real do seu autor, mas ao mesmo
tempo erguendo um intervalo suficientemente sólido para permitir alguma
distância e segurança. Se a própria autobiografia não nos dá a nós direito de
atravessar a linha que deve separar a arte do seu autor, a categoria da “autoficção”
redobra esses esforço. (Mais)
13 de março de 2017
Unfinished Mandarin. Gonçalo Pena (Mousse)
Segundo volume de recolha de desenhos
avulsos de Gonçalo Pena, seguem-se aqui as mesmas aporias do
anterior, em que a aparente ausência de um princípio organizativo
ou classificativo dos desenhos obrigará os leitores a criarem eles
mesmos as formas de associação interna. Pela sua existência
somente, todavia, o volume convida desde logo à consideração da
indisciplina do desenho como passível de ser repensada enquanto modo
de estabelecer um modo prático do pensamento. Franqueando
talvez de forma perigosa algumas questões da filosofia da arte, com
as quais seguramente Pena se digladia, é possível que estejamos a
incorrer numa interpretação vulgar de Hegel, ao crer na arte como
ideia demonstrável, mesmo que apenas enquanto aparência. Nesse caso
então, o “mandarim inacabado”, rosto pincelado com uma dezena de
traços, à la René Gruau, aponta de imediato às ideias
apresentadas ao longo destas centenas de páginas, todas elas sempre
com uma sombra de ilusão: “inacabado” porquê, afinal? Isto permitir-nos-ia encetar uma discussão sobre a incompletude como forma moderna do desenho (sob os auspícios de um estudo sobre os "interrupted sketches" de Joeph Pennell), mas ficaremos por uma abordagem mais superficial. (Mais)
6 de março de 2017
Le rapport de Brodeck. Manu Larcenet.
Nas suas Teses sobre a
Filosofia da História, Walter Benjamin escreveu “Nunca houve um documento
da civilização que não o fosse simultaneamente da barbárie”. Esta ideia
complexa associa-se à ideia materialista do filósofo alemão e mesmo ao trabalho
da sua crítica, que implicava jamais perder o rasto ao valor que as coisas
tinham pela passagem táctil, tangível, sofrível do ser humano, e não olhá-las
somente pelo seu suposto valor “eterno”, “universal”, “estético”. Le rapport de Brodeck é todo ele tecido
em torno do que o título indica, um documento escrito que quer dar conta de um
evento mas, na sua tessitura, desvela em si mesmo a barbárie que subjaz a cada
gesto humano. (Mais)