Será difícil, face à incrível recepção mundial a que este livro foi votado, desde as suas primeiras repercussões mediáticas por volta de 2000, passando pela forma como a autora foi catapultada para um certo tipo de estrelato que atravessava o círculo da banda desenhada para preencher outros domínios (a literatura, o testemunho, a memória, a discussão política da tensão Ocidente-Islão, etc.), a adaptação animatográfica e as abordagens académicas - provavelmente, ao lado de Maus, de spiegelman, é este o livro que mais estudos, ensaios e papers recebeu; permitam-nos a nota pessoal que foi um dos case studies da nossa própria tese de mestrado, sobre a memória na banda desenhada francófona contemporânea -, adiantar algo de novo. No entanto, e como forma que não pode deixar de ser celebratória em relação a uma edição portuguesa cuidada e atenta a novas tendências desta área de expressão, tentemos, para começo, e tentativa de organização do pensamento, uma breve sinopse.
Persepolis conta a vida de Marjane Satrapi desde os seus dez anos, em 1980 em Teerão, ou seja, um ano depois da Revolução Islâmica (1979), até fins de 1994, quando, já uma mulher com um curso superior, e acabada de se divorciar do seu primeiro marido, resolve partir definitivamente para França. O livro dá conta da vida da criança e da adolescente tentando entender os eventos políticos que a rodeiam e alteram todo o mundo a que estivera habituada até então, as suas primeiras experiências enquanto jovem adulta, a possibilidade limitada da sua rebeldia, a partida para a Europa (Áustria) para prosseguir os estudos artísticos, o seu retorno ao Irão como mulher emancipada, o seu novo embate à realidade do país, e o exílio definitivo.
O sucesso da obra foi quase imediato, com o seu primeiro volume, e no momento em que ele “rasgou” o limite da publicação lida pelo público particular daquele território de banda desenhada alternativo, conquistou um espaço cada vez mais alargado e com repercussões que chegavam a públicos muito diferentes. Recordemos que cada um dos capítulos agem como pequenas histórias circunscritas (nunca mais de 9 pranchas), sem maior continuidade que a da cronologia. Aliás, nem sempre identificam claramente no texto o período exacto a que se reportam, sendo antes intitulados por uma palavra que remete ora para um objecto que tem um papel fulcral nesse relato específico, ou que descreve sucintamente a acção desse episódio, reforçando a ideia de se tratarem de souvenirs, isto é, reificações dos actos de rememoração de que Persepolis é feito. Ou, por outro lado, divisões “didácticas”, numa expressão de Maurice Halbwachs. Estes relatos, nessa ideia, saíram na revista da L’Association Lapin, sendo posteriormente reunidos em quatro volumes, publicados entre 2000 e 2003. O volume único, em francês, sairia apenas em 2008, um ano depois da versão norte-americana em um volume, e largo tempo depois da tal exposição ultra-mediatizada do trabalho. É muito discutível se esta é a sua forma ideal, mas estamos em crer que em relação a Persepolis a plataforma física em que se lê este “livro” é algo indiferente, já que a sensação de estarmos perante uma multiplicidade simultânea de vários níveis não é alterada. A sua leitura enquanto um livro único permite porém uma fruição particularmente cheia, por assim dizer, isto é, que aponta sobretudo a uma ideia de coesão, fechamento, fito ontológico completo, que a edição portuguesa da Contraponto, em boa hora (depois da experiência da Polvo, em 2003, em traduzir o primeiro volume, de quatro, da colecção Ciboulette, mas sem continuação) respeita, e que configura o livro enquanto essa formação genérica que dá pelo nome de Bildungsroman.
Ainda assim, é preciso sublinhar que Persepolis não é um relato contínuo, mas 39 pequenas narrativas que se constituem, posteriormente, em capítulos deste verdadeiro “romance de formação”, ainda que pautado pela diferença, face ao usual modelo, de se tratar de uma autobiografia de uma mulher, de uma iraniana, de uma não-alinhada, e de uma artista de banda desenhada. Mais do que isso, as deslocações progressivas que se verificam ao longo da obra dizem respeito ao encontro de Marjane com várias classes de Outros, contra os quais se vai definindo: como mulher perante os homens, como estudante face aos professores, como jovem rebelde face aos conservadores, como progressista e emancipada face aos fundamentalistas religiosos, como iraniana face aos europeus, e finalmente - ou sempre - como Marji/Marjane, já não contra, mas enquanto encontro, em relação às pessoas a quem ama, sobretudo a avó, figura fundamental, porque ancorada na realidade (ao contrário do tio Anouche, que é formado como uma espécie de fantasma ético, que ainda assim a marca para sempre). O seu desaparecimento, longe da representação visual, é o “preço”, como a narradora o propõe, que tem de pagar pela liberdade da passagem da pequena Marji do Irão para a adulta Marjane exilada na Europa.
Que a associação da vida pessoal, individual, singular de Marjane Satrapi se queira aliar à experiência cultural do seu povo, e até mesmo a uma memória cultural - que seguramente agirá como contraponto das versões oficiais do regime iraniano - não pode oferecer quaisquer dúvidas. Isso é visível quer nas capas originais dos quatro volumes da série, que mostrava quatro cavaleiros sucessivos da história do seu país, sendo a quarta a própria Marji, o título, que remete para raízes culturais anciãs, cultas e respeitadas, e através dos variadíssimos documentos extratextuais que a autora foi tecendo em torno do livro, inclusive o prefácio para a edição norte-americana, incluída nesta edição, onde se escreve “não devemos nunca esquecer”. Ora isto inscreve-se naqueles testemunhos (singulares, individuais, etc., mas que por isso mesmo são "inerentemente políticos e colectivos", numa expressão de Ruth Leys) que formam as suas próprias testemunhas (os leitores) e, assim, prestam um serviço aos discursos da esfera pública que têm um papel na formação, por sua vez, das memórias colectivas, seja numa circunstância mais imediata (iranianos, muçulmanos da diáspora, mulheres, etc.) seja numa esfera o mais alargada possível (os seres humanos). O alargamento progressivo e a repercussão social e colectiva são notórios desde os primeiros capítulos – “O véu”, “A Bicicleta”, “A cela de água”, “Persépolis”, “A carta” e “A festa” – , os quais, se estão relacionados directamente com a pequena Marji, remetem todos para acontecimentos de um contexto familiar e social bem mais alargado, que são sempre confundidas, uma vez que os membros da família de Satrapi estarão relacionados com a família do Xá, são alvos de perseguições e mesmo tortura, e quaisquer acções tomadas pela pequena criança se associam às alterações no tecido social do seu país.
Em todo o livro, Marjane Satrapi (em todos os três papéis de protagonista, narradora, autora) estabelece ou tenta estabelecer um saber genealógico, construindo uma memória e uma história, não apenas de si mesma, mas da família a que pertence, através das suas imagens como um saber etimológico, isto é, que a um só tempo dá a conhecer a origem cintilante de que parte e salienta a diferenciação, o afastamento que se constituiu entretanto.
A transformação por diferenciações internas da personagem é de facto progressiva. Se o livro se inicia aos seus dez anos, e o estilo da artista se coaduna com uma certa abordagem naïf, também permite - e esta é uma enorme influência de David B., com o qual aprendeu, digamos assim, os primeiros passos decisivos nesta área criativa - que as personagens que procedem da fantasia ou da imaginação ganhem de facto uma cidadania gráfica idêntica às das demais personagens. Deus é a figura mais vincada dessa representação, graças aos diálogos que a pequena Marji enceta com ele, mas depois da condenação e execução do seu tio Anouche essa “relação” é cortada e, consequentemente, a presença gráfica das fantasias e projecções. Outro preço do “crescimento”. O estilo do desenho vai sofrendo algumas alterações, notando-se no final uma maior segurança e plasticidade suave nas imagens, as figuras são mais alongadas e os cenários mais simplificados, e tira-se mais partido de planos aproximados e ditos “americanos”. No que diz respeito ao trabalho de composição, é mais contido, fazendo parte daquele trabalho a que Chavanne chamaria de semi-irregular (uma sub-divisão da prancha a partir de uma ideia de grelhas). Além do mais, a autora tira partido dos vários níveis de significado textual que é permitido pela presença, por vezes complementar, outras contraditórias, entre os balões de fala e os recitativos (e as imagens, claro está). Por vezes, as frases emitidas “ao vivo” não podem de forma alguma corresponder ao momento que a acção representa, mas são projecções retrospectivas, assinalando sobremaneira o grau de “reformulação” da memória que Persépolis opera.
Essas diferenciações levam também a que permanentemente se verifiquem deslocações da protagonista em relação às demais pessoas - família, amigos, colegas - ou espaços. Por exemplo, quando ela regressa já como jovem adulta a Teerão, e apesar da economia das representações regressar igualmente a distribuições idênticas da primeira parte, há diferenças suficientes para se perceber que Marjane não volta ao mesmo local, mas a um local que, a partir de então, existe apenas na sua memória. Dessa forma, Persépolis, enquanto acto, é uma reificação, preservação e homenagem a essa mesma memória. As tensões sociais estão sempre presentes neste livro, apesar de alguns críticos terem visto com alguma razão que Satrapi nunca explora suficientemente os seus próprios privilégios face à esmagadora maioria da população (chegando mesmo, em algumas entrevistas, a fazer comparações ahistóricas e transculturais insustentáveis entre os esforços das mulheres do Irão pela sua autodeterminação e a das mulheres ocidentais nas sociedades capitalistas). Isto é, a sua posição parte de vários privilégios que lhe são desde logo acessíveis, e muitas vezes não são alvo de uma auto-reflexão, levando antes à criação de uma ideia de uma “iraniana iluminada” (no seu mais profundo sentido eurocêntrico), em oposição às turbamultas dos fundamentalistas. De certo modo, o uso do contraste absoluto entre o preto e branco dos seus desenhos apenas sublinha essa dicotomia, raras vezes posta em causa. Confirmando a ideia de que não existe forma e conteúdo, mas um modo implicado, apesar de não existirem diferenças fundamentais entre o estilo deste primeiro livro e Broderies ou Poulet aux Prunes (mais belos e diversos nas suas estratégias visuais) o seu emprego aqui associa-se com maior vigor à ideia de testemunho e memória.
Seja como for, e apesar do sucesso ser em parte devido aos seus contornos sociais, não se pode de forma alguma escamotear a influência que viria a ter sobre novos autores (sendo o caso de Zeina Abirached gritante), sobre o tipo de receptividade dos meios de comunicação social à banda desenhada (mesmo que a certos tipos de produção), sobre a formação de verdadeiros novos públicos, sobretudo de adultos cultural e politicamente informados (portanto, sem cair na armadilha de se ter de começar pelos “mais novos” ou por coisas “fáceis” ou mais “apelativas” de um ponto de vista comercial), e até na fundação de novas abordagens ao mercado (em parte pode-se dizer que o decalque que a Casterman fez das estratégias da L’Association com a sua colecção Écritures é devida ao sucesso de Satrapi). Um autor dizia, não sem razão, que era por ser mulher e iraniana que Satrapi teve um sucesso estrondoso, apesar de na mesma editora estarem exercícios profundíssimos e incontornáveis da memória, com Baudoin, David B., Emmanuel Guibert, ou de autores de um novo encontro entre a narrativa e a visualização, como Anke Feuchtenberger, Aristophane ou Julie Doucet. No entanto, entender que existem sempre desequilíbrios, pontos cegos, e limitações na distribuição, circulação e apreciação da cultura é um facto que não pode dirimir o valor intrínseco, se assim se pode dizer, que uma obra terá. E Persépolis tê-lo-á, sem dúvida.
A razão pela qual este livro convida a uma leitura aturada, balizada e que esteja munida de vários instrumentos críticos é recompensadora. Vejamos um desses aspectos. É muito nítida a oposição entre os espaços interiores e exteriores, oposição que se inverte com precisão no momento em que Marjane viaja “para o exterior” (a parte da sua vida que se passa na Áustria, de que dão conta os capítulos compreendidos no volume 3, ou na primeira metade da 2ª parte). No Irão, sobretudo nas fases da sua infância e adolescência, os espaços interiores são os locais individuais e de protecção – com a família e a vida mais recatada, os amigos e as únicas festas onde certos prazeres são permitidos, e mesmo o seu curto casamento – e o exterior o da conformação social, e o confronto e medo com as normas políticas e religiosas. Por vezes, mesmo os locais interiores, sobretudo durante as festas, são ameaçados ou mesmo invadidos pelos agentes dessa conformação à Sharia, como acontece nos capítulos intitulados “O vinho” e “As meias”. As escolas são espaços ambíguos, que por vezes mesclam esses dois valores: em mais de uma ocasião, quer durante a infância quer durante a sua aprendizagem artística primeira (antes de viajar para a Áustria), quer ainda a sua segunda fase (depois de regressar), Marjane confronta sempre os poderes estabelecidos, pondo em causa este ou aquele princípio perante os colegas, professores ou tutoras, procurando sempre discutir através de princípios lógicos contra as regras islâmicas que parecem aleatórias e discriminatórias (sobretudo em relação às mulheres; e sê-lo-ão, sem dúvida, de um ponto de vista europeizante). No entanto, esse confronto torna as escolas em palcos da conformação total, onde esse conflito é limitado, chocando apenas quem a ouve mas nunca alterando o modo como funciona. Pelo contrário, na Europa verifica-se uma inversão da distribuição desses papéis. Os exteriores passam a ser o local no qual é possível a Marjane exercer a totalidade da sua individualidade, encontrando-se não só com os seus amigos e namorados mas também, como se costuma dizer, “consigo mesma”. Os espaços interiores, uma vez que se tratam de uma pousada religiosa (católica) ou quartos alugados em casas (onde as senhorias estão sempre presentes e ou fazem mil e uma exigências ou são negligentes), tornam-se os palcos onde os confrontos se dão, quase sempre alimentados por mal-entendidos e preconceitos para com Marjane (por ser iraniana, isto é, “inimiga”, “fundamentalista”, etc.): com as freiras, a professora Heller, as raparigas que escuta no café, a mãe de Markus. É até mesmo palco de vingança, como quando, depois de ser apalpada por um cliente num restaurante onde trabalha, a cozinheira jugoslava, como que para lhe restaurar a honra, cospe sobre o bife que servirá ao prevaricador (“O croissant”). O interior, neste caso em particular, onde se cruza com outra estrangeira, não deixa de ser um local do confronto, mais especificamente onde se repara a falta. No momento de rompimento total com a vida austríaca, causada por um desgosto de amor (ver abaixo, sobre Markus), Marjane passa a viver na rua a tempo inteiro. A rua passa a ser o seu espaço de vida, interior: segue-se a crise e o fim (dessa estada).
Outra dimensão é a das questões da representação do corpo, talvez sem surpresa presentes numa autora feminista (na verdade, Satrapi recusa esse apodo, mas possivelmente por um mal-entendido do que essa palavra quer dizer; seja como for, ela cita mesmo explicitamente O terceiro sexo, de Beauvoir, e tenta praticar algumas das lições, para sua frustração), contínuas e axiomáticas nas transformações da personagem. Noutro texto tivemos oportunidade de analisar detalhadamente o modo como essas menções funcionavam e que significado ganhavam na economia da história, mas bastará, nesta presente abordagem mais concisa, apontar algumas dessas cenas: veja-se, entre outras possíveis, a sua tentativa de imitação da tortura ao avô colocando-se numa banheira cheia de água, as brincadeiras derisórias que faz em relação aos mártires e aos rituais que deve cumprir na escola, o seu primeiro cigarro (“despedi-me da infância”, pg. 125 desta edição), a sua discussão com as Guardiãs da Revolução sobre as suas vestimentas e crachás de Michael Jackson, o primeiro beijo a um homem, as primeiras relações sexuais, até à doença pulmonar que desenvolve por viver na rua. O comentário que ela tece nesse momento, mais uma vez, reposiciona-a na história colectiva que jamais abandona: “Tinha sobrevivido a uma guerra que me tinha afastado do meu país e dos meus pais…// e foi uma banal história de amor que quase me levou” (251). O capítulo-chave dessa mesma transformação, porém, é “O vegetal”. Neste, a protagonista dá conta da “metamorfose física” que se seguiu à “transformação mental” (que sobreveio por ter urinado em pé, por visto comportamentos até então impensáveis para ela, etc.). Essa metamorfose, porém, é dupla, tanto interna como externa. Se ela se representa em primeiro lugar como um Mr. Hyde ou um Hulk em fase de expansão, e numa série de pequenas vinhetas mostra cada metamorfose específica do seu corpo em crescimento, na página seguinte apresenta uma grelha regular na qual ela própria exerce novas mudanças: Marjane corta o cabelo, maquilha-se, obtém nova roupa e bijutarias e assume um “look punk” (mais tarde, haverá uma outra inflexão dessas transformações auto-operadas, em “Esquiar” - v. pg. 284 - na qual Marjane alcança um outro estádio de beleza externa através da maquilhagem e da reinvenção social, numa cena reminiscente da tradição da banda desenhada por mulheres/feminista, pelo menos desde Aline Kominsky). O curioso é que essas operações levam a uma aceitação grande da parte de toda a comunidade escolar, muito desejada por Marjane, que chega mesmo a fingir uma série de comportamentos para melhor se integrar. É significativo que tenha de ser num “espaço onírico”, onde flutuam 13 cenas que havíamos observado anteriormente, que se vai instalar a coragem de Satrapi reivindicar a sua condição, e orgulho, de iraniana, alcançando assim uma das lições da avó que mais lhe haviam chegado ao coração. E é igualmente significativo, senão mais, sendo esse um dos nódulos mais fortes da reivindicação de si mesma, que essa integridade de si mesma seja mais importante que a integração local.
O final do volume encontra uma Marjane Satrapi dividida no seu papel identitário: “Era uma ocidental no Irão, uma iraniana no Ocidente. Não tinha identidade”. Chega mesmo a falar de máscaras… Tal como um outro autor fundamental na autobiografia em banda desenhada contemporânea, Fabrice Neaud, é por oposição aos Outros – a integração permanente é apenas reduzida à sua mais próxima família – que Marjane se vai encontrando a si mesma. É possível que seja sempre assim, por diferenciação, ou mesmo oposição, que a personalidade de cada pessoa se forma, mas Satrapi sublinha de modo muito vincado algumas das características que a afasta da maioria das pessoas das sociedades em que se encontra (situação que se viria a exacerbar na vida real por vários tipos de pressão, mesmo na ausência de uma clara fatwa). A “alteridade” da autora torna-se central para o modo como ela se vê a si mesma. A súbita descoberta de Marjane do seu próprio orgulho em ser iraniana só despertou no momento de confronto directo, da explosão de raiva, verbalizada, na cena do café na Áustria (pg. 207). Mas mesmo depois de regressar ao Irão, e aí casar (mas veja-se a cena da página 328 em que se mostra uma dissociação entre quem ela é e a expectativa de Reza, o primeiro marido), de descobrir pequenos empregos mais ou menos continuados e assíduos, tudo é sempre afinal temporário... A partida derradeira para a França (onde, compreendemos, lhe será possível criar a obra que agora lemos, apesar de não haver qualquer momento de referência directa e/ou metalinguística sobre o próprio processo do livro - nível que David B., Bechdel e Guibert exploram nas suas obras, garantindo-lhes uma faceta de maior complexidade) é apenas prova de que só nessa diferenciação, nesse estranhamento, é que Marjane, como estranha, se consegue definir a ela mesma.
Nota: agradecimentos à editora, pela oferta do livro. As nossas desculpas pela falta de qualidade das fotos, inevitável.
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