Permitam-nos
uma história enlatada das transformações da memória da banda
desenhada.
O
facto da banda desenhada se ter desenvolvido, numa larga fatia da sua
história, associada à imprensa, levou à noção de que ela mesma
seria uma forma de arte necessariamente efémera, ou essencialmente
constituída nessa sua efemeridade. À margem dos luxuosos álbuns
publicados na Europa do século XIX que marcaram a sua primeira
presença, e depois as acções de coleccionadores de tiras ou
páginas de jornais durante a primeira metade do século XX, e
algumas antologias em capas cartonadas, a esmagadora maioria da
produção era votada à leitura de um só dia, e não propriamente a
serem recompensadas pela possibilidade da releitura. Isso levou a que
durante muito tempo a banda desenhada fosse sofrendo de uma espécie
de amnésia, como escreveu Groensteen num seu livro, em que apenas
fãs especializados conhecessem algo para além da produção da sua
própria geração ou a anterior, muitas vezes até de modo diferente
dos autores. Com as transformações editoriais, económicas e
sobretudo estéticas que viriam a moldar uma nova vida da banda
desenhada sob os formatos de livro, essa existência passou a ter
outros contornos, mas a relação com o passado ainda se mantinha
algo complexa, desagregada, isolada. Apenas mais recentemente é que
uma tendência mais certeira tem assegurado uma recuperaçãoda memória,
sobretudo através do acesso a edições integrais de determinadas
séries, títulos ou autores. Mas a acessibilidade crescente aos
textos que compõem essa história também implica a obrigatoriedade
de um mapa. Comics,
a Global History,
é um desses mapas possíveis, e promete uma navegação suave e
lata. (Mais)