8 de dezembro de 2015

Partida/Outono. André Letria (Pato Lógico).


Estes dois livros fazem parte de uma série, ou colecção, que Letria tem explorado na sua editora. Chamada Desconcertina, até à data os seus títulos partilham os mesmos princípios formais mas, mais importante, um mesmo espírito, que eleva estes livros de meros objectos de entretenimento infantil a instrumentos ideais para pensar. (Mais)

Os livros em acordeão, ou leporello, têm 12 pranchas, não existindo, por isso, qualquer “desperdício”. Aqui não há lombadas, guardas, folhas de título: cada parte do livro é já uma unidade das suas narrativas respectivas (como sempre podem fazer mas, muitas vezes, não o fazem). Temos as capas-invólucros, é verdade, que servem de suporte e protecção física mas também comportando o cólofon. Formato utilizado sobretudo para a coordenação cumulativa, mas não necessariamente sequencial, narrativa, de imagens (fotografias, paisagens, retratos de indivíduos ou grupos, etc.), quer no Ocidente quer na Ásia, sempre que é empregue para esses fins há usualmente uma exploração particular dessas relações. Letria cria um progresso simples. Linear, focado, centrado, e com recursos gráficos reduzidos (figuras afastadas e no meio da paisagem, movimentos mínimos ou esquematizados, exacerbação de espaços internos em acção versus partes estáticas, ausência de texto, título de uma só palavra, e paleta a preto ou cinzento, duas gradações de uma cor, e tirando partido do branco, que de “vazio” passa a “pesado”, emprego de um efeito de livro usado), a velocidade da curta intriga e a súbita revelação na última imagem é o centro de todo o gesto.

Em Outono vemos as folhas de uma árvore a cair. Terá efeitos em quem as observa? E é esse um efeito real, emotivo ou metafórico? Em Partida estamos numa plataforma de gelo, e um jovem inuíte cria uma máquina gelo que lhe permite explorar outros locais. Não sabemos quais nem o acompanharemos, apenas o seu processo de preparação.

Porque estão estas personagens isoladas? Porque o permanecem, sem que haja um “final feliz”? Isso é discutível, contudo, já que num caso (Partida) a promessa é cumprida e a história só aí começa, e no outro (Outono) ela decorre até um fim claro, se bem que, elíptico que é, obriga a começar outro tipo de aventura. O da interpretação.

Se em ambos os casos, fechados na sua história, o fim é sempre uma pequena “surpresa!”, só depois de ler é que se desempacotará a verdadeira surpresa.
Nota final: agradecimentos à editora, pela oferta dos dois volumes.

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