Depois do “sucesso” de Papá em África, não apenas em termos comerciais para a editora como
para a sua recepção-discussão no nosso país (o ruído e os
mal-entendidos são sempre fogo em caruma), o selo “para gente
bruta” resolveu publicar mais uma pequena colecção de algum
material do autor sul-africano. Provindo da sua parte, isto é, de
“Joe Dog”, na revista Bitterkomix, este caderno surge por
ocasião da presença de Anton Kannemeyer em Portugal na sua
exposição integrada no Festival da Amadora. Desta forma, este
pequeno volume serve de complemento à histórias do livro anterior,
e onde aquele era uma espécie de radiografia a um imaginário
interno e cultural partilhado, que tantas vezes reflecte igualmente
fantasmas dos seus leitores, estoutro é mais focado na experiência
própria do autor, como se houvesse a possibilidade de mostrar um
balanço da sua vida como fruto das consequências da educação. (Mais)
26 de novembro de 2016
25 de novembro de 2016
O astrágalo. Sarrazin, Pandolfo e Risbjerg (G. Floy)
Baseado no romance de uma literal
enfant terrible, e em muitos aspectos o seu molde original (se
bem que, em termos masculinos, se poderia apontar “Antoine Doinel”
ou os miúdos de Zéro de conduite – mas
esta apropriação de género não deixa de ser absurda, já que a
autora real foi longe nas suas acções e não foi longe na sua
vida), esta banda desenhada recupera de forma perene e vincada
a celebração de uma liberdade anti-burguesa que ainda hoje (ou
outra vez hoje) é difícil de enquadrar. O romance homónimo de
Albertine Sarrazin foi publicado em 1965. Curiosamente, o romance tornou-se novamente acessível [v. secção de comentários para nota sobre a primeira tradução] graças a uma edição portuguesa muito recente, publicada pela irrepreensível Antígona no mesmo ano da sua
segunda adaptação ao cinema, ainda que infeliz e nomeadamente de
uma forma negligenciável. Com efeito, esta versão planificada por
Anne-Caroline Pandolfo e desenhada por Terkel Risbjerg – que
constituem uma equipa com larga experiência – acaba por ser uma
devolução superior da palavra, do humor e da verve de Sarrazin. (Mais)
24 de novembro de 2016
Outro Mundo Ultra Tumba. Rodolfo Mariano (auto-edição)
Apesar de não conter uma lombada, este volume de mais de
quarenta páginas, todas elas ocupadas por matéria gráfica-narrativa,
constitui-se um verdadeiro álbum, apresentando uma narrativa organizada em
torno de um só núcleo. Conforme havia sido prometido em As Crónicas da Cemitéria, há todo um universo de referências que é repetido, como se o autor
trabalhasse sob a noção de “tema-e-repetição”, ou algo que equivalesse à
metáfora de melodias sobre um tema. De novo vemos o regresso da figura
antropomórfica da morte, ora sob a imagem de uma encapuzada de gadanha ora sob
a de uma caveira, guitarras clássicas, espadas, ampulhetas e garrafas falantes,
e personagens advindas de um caldo genérico de high fantasy e sword
& sorcery: guerreiros cimérios, princesas sedutoras, druidas, criaturas
maléficas, corvos, e acrescentando-se a este bestiário criaturas do espaço,
como Chewbaccas ferozes. (Mais)
21 de novembro de 2016
Mary Wept Over the Feet of Jesus. Chester Brown (Drawn & Quarterly)
Este pequeno e estreito livro não
chega a trezentas páginas, sendo menos de duzentas aquelas que
contêm banda desenhada propriamente dita. Como Brown já vinha
fazendo desde os seus primeiros livros “sérios”, The Playboy
e I Never Liked You, grande parte do volume é composto por
notas, fontes bibliográficas explanadas, ancoramento que serve para
reforçar ou re-contextualizar a sua obra banda desenhística.
Escusado será adiantar que “a obra vale por si”, ou argumentos
quejandos, já que este território tem espaço para toda a espécie
de práticas, inclusive, o que nos parece ter aqui lugar, a de nos
apresentar um “romance de tese”. Que tese será essa, já é um
pouco mais difuso ou diluído, mas arriscar-nos-íamos a afirmar que
se trataria de uma defesa da prostituição (ou alguma, se
preferirem) como não apenas uma expressão livre da sexualidade como
de um caminho legítimo para a assunção de poder da parte das
mulheres (em determinadas sociedades, para mais, a ocidental de
matriz judaico-cristã). (Mais)
20 de novembro de 2016
Rendez-vous em Phoenix. Tony Sandoval (Kingpin Books)
A travessia de fronteiras, em alguns casos, não é vista como
possível em termos de liberdade total, mas é ela que poderá determinar a
possibilidade de conquistar uma vontade que, sem o seu alcance, é esmagada na
inércia. Os Estados Unidos são vistos ainda, não sem razão, como um campo mais
aberto e preparado para sonhos que parecem inalcançáveis noutros contextos,
sobretudo se disserem respeito a vontades que vão bem para além da mera
sobrevivência e começam a ocupar áreas de criatividade artística, como a banda
desenhada. Ora, pelo menos em parte, era esse o fito que o artista Sandoval
tinha em querer emigrar para os Estados Unidos: a de que seria aí que o seu
sonho em se tornar autor de banda desenhada profissional se poderia cumprir.
Este livro inicia-se num momento em que está à espera do momento ideal para
atravessar a fronteira e tentar então nesse outro país a sua sorte. (Mais)
17 de novembro de 2016
26 de Novembro: Seminário Banda Desenhada e Pensamento Político: Sessão 1
Temos o prazer de anunciar o Seminário Banda Desenhada e Pensamento Político, a cuja coordenação temos a honra pertencer.
Trata-se de um ciclo de encontros, mesas-redondas, palestras académicas e conversas informais em torno da banda desenhada sob os signos de várias noções e princípios afectos a uma compreensão alargada da política. Utopia, cibernética, corpo, género/gender, cidade, são apenas algumas das palavras-chave a discutir, através de um corpus de banda desenhada o mais alargado possível, tornada ela no campo de objecto por excelência. Esta sessões decorrerão ao longo do resto de 2016 e durante o ano lectivo relativo a 2017, e anunciaremos cada sessão atempadamente.
Naturalmente, um foco na banda desenhada contemporânea portuguesa estará na linha da frente, e muitos dos encontros contarão com a presença dos ou das artistas para debater esses mesmos temas. A primeira sessão é já no dia 26 na Biblioteca Camões.
Agradecimentos aos co-organizadores, às instituições envolvidas e a Marco Mendes, pela disponibilização da imagem do cartaz.
Mais informações na página do Centro de Estudos Comparatistas, ao qual pertencemos, assim como na página de Facebook.
Mais informações na página do Centro de Estudos Comparatistas, ao qual pertencemos, assim como na página de Facebook.
15 de novembro de 2016
A chama e as cinzas. João Barrento (Bertrand), no Cadeirão Voltaire.
Como ocorreu em várias ocasiões anteriores, a crítica mais estritamente literária é remetida para o canto mais confortável e noutras companhias do Cadeirão Voltaire. A chama e as cinzas é um longo ensaio entre o concentrado e o descontraído, o teórico e o impressivo, entre o hausto longo e a recordação por marcos. O seu objecto é a mancha da literatura portuguesa que se alastrou em contínuas e cada vez mais abertas diferenças internas depois do 25 de Abril, verdadeira data que opera uma transição, mas sem que se torne fronteira absoluta. Associada a um gesto de mostrar "para fora" este estranho animal indomado, as lições de João Barrento, cujo peso no estudo da literatura portuguesa (e outras!) é indesmentível, são prenhes e necessárias, nestes tempos de distracções com coisas que podem ser muito sonantes, muito brilhantes mas não são mais que o reflexo do sol momentâneo sobre as espumas...
Texto aqui.
Texto aqui.
11 de novembro de 2016
Miracleman/Watchmen. Alan Moore et al. (Levoir/G. Floy)
A publicação destes dois livros no
mesmo ano, por dois projectos diferentes (mas que sabemos estarem
aliados por agentes comuns), vem repor uma das muitas falhas da banda
desenhada disponível em Portugal em língua portuguesa na norma
europeia. As relações de ambos os títulos partem da circunstância
de ambas partilharem o mesmo escritor, Alan Moore, e de fazerem parte
de um projecto que ele não tem abandonado, pois mais que o pareça
nas suas afirmações explícitas: a da reinscrição do género dos
super-heróis numa nova relação com a referencialidade real para, a
partir disso, interrogar o género mas também a fantasia, a
efectividade das utopias, a realidade política que nos assiste, etc.
E à distância de mais de trinta anos, não pode haver dúvidas de
que houve de facto uma transformação radical desse género
provocado pelo trabalho do escritor inglês. (Mais)
10 de novembro de 2016
Big Kids. Michael Deforge (Drawn & Quarterly)
Apesar do seu formato, um livrinho de
bolso de capa cartonada, esta é bem capaz de ser a maior obra até à
data do autor, confirmando-o não apenas como um inventor de novas
formas de criar banda desenhada em termos figurativos, de composição
e no uso das cores, o que já havíamos discutido a propósito de
vários dos seus títulos anteriores, como também a um nível de
dramatismo, exploração emotiva e relevância social. Deforge tem-se
revelado como um verdadeiro autor “completo”, não no sentido
clássico de “trabalhar sozinho”, mas antes de “moldar todos os
elementos passíveis de uso numa banda desenhada”. A leitura dos
seus projectos são de facto experiências cumulativas de atenção
para com todos os factores expressivos que ele acessa. De uma forma
sucinta, Big Kids é uma novela em torno da vida de um
adolescente e o momento em que, nessa fase da vida, se atravessam
transformações radicais a todos os níveis, não apenas físicas,
como em termos de consciência, relacionamento social, personalidade,
identidade. (Mais)
3 de novembro de 2016
Participação em "Os Livros"
Por lapso, o programa indicado anteriormente não foi para o ar, e será antes transmitido no dia 6, Domingo.
2 de novembro de 2016
Acédia. André Coelho (Chili Com Carne)
Livro curto, Acédia é o
primeiro trabalho de longo fôlego a solo de André Coelho que se
apresenta como uma narrativa coerente, e não colecção de desenhos
ou improviso em torno de um tema. Novela concentrada, negra,
lacónica, a escrita de Coelho espelha-se em todos os elementos que
compõem a narrativa e é necessário ler a sua forma e superfície
para libertar os seus significados. Tal qual o tema proposto, há uma
realidade que nos é apresentada mas cujo desvendamento se associa à
percepção do leitor e poderá mesmo ser intransmissível. (Mais)