Conforme os números anteriores desta
antologia, devo começar por indicar que, de uma maneira ou outra,
estamos envolvidos no seu processo de produção. Apesar de não
participarmos activamente neste novo número, quer com um artigo ou
uma banda desenhada, ou até mesmo com “exercícios” directos, o
nosso envolvimento enquanto docentes no Ar.Co leva a que, num caso ou
outro, haja um cruzamento prévio com peças de alguns dos alunos
envolvidos. (Mais)
Mais uma vez, esta antologia abre a
oportunidade, sobretudo para os mais jovens alunos, que agora dão os
seus primeiros passos na direcção da aprendizagem das disciplinas
da ilustração e banda desenhada, em puderem publicar uma pequena
peça, seja mesmo de apenas uma página ou de uma mão-cheia delas.
Isso em si mesmo é uma experiência que, relegada aos fanzines,
publicações “escolares”, ou modos online, é salutar e até
diríamos imperativo, nessa mesma aprendizagem. Mas o facto de poder
publicar num livro com outro nível de qualidade material, circulação
e distribuição e, mais importante, estar lado a lado de nomes mais
consagrados ou de pessoas com mais experiência, traz uma
visibilidade acrescida. É muito discutível, sobretudo neste
terceiro número, se a qualidade é tão sólida como nos casos
anteriores, pois existem alguns trabalhos que nos parecem soluções
apressadas, pouco desenvolvidas ou mesmo pouco felizes na sua
execução e até idealização, mas tal como afirmámos tantas vezes
no passado em relação a publicações de/com estudantes, vale
sempre a pena.
De um verdadeiro “veterano”,
encontraremos aqui uma peça confessional de Francisco Sousa Lobo, o
que, não sendo propriamente novo no seu projecto total, traz uma
inflexão mais clara da consciência meta-textual da sua obra.
Autores já publicados e com uma variedade de trabalho considerável,
e que aqui contribuem mais uma vez com pequenas histórias que trazem
um pequeno grão de diferença temos Tiago Baptista (com uma peça
que é tanto uma crítica musical como um pequeno ensaio sobre
desigualdades de género), Cecília Silveira (com uma observação
oblíqua dos preconceitos portugueses para com brasileiros, acima de
tudo), Inês Cóias (com uma desafiante adaptação de um dos “crimes
exemplares” de Max Aub), e Tiago Albuquerque (que apresenta um
exercício formal muito elegante e algo devedor às obras mais
gráficas de Richard McGuire).
Mais jovens, mas igualmente com provas
dadas em múltiplas plataformas, Rodolfo Mariano traz mais um
capítulo da sua obra “fantástica negra”, de um humor requintado
e absurdo em torno de tropos consabidos, e Vasco Ruivo apresenta uma
peça abstracta e experimental que mereceria ser cotejada com os
trabalhos dos cultores desta faceta da banda desenhada mundial.
Dos jovens autores que apenas aqui
publicam a sua primeira banda desenhada ou que apenas as fizeram
circular em publicações similares (números anteriores da
Pentângulo, publicações colectivas com colegas, zines
próprios, etc.), apresentam-se vários autores, com vários níveis
de domínio, beleza e substância narrativa. Destacaria Rosa
Francisco, pelo arrojo gráfico e cromático, Sara Boiça, melhorando
cada vez mais o seu cruzamento entre a ilustração poética e as
narrativas feéricas e semanticamente abertas (muito próximas de uma
constelação muito própria de referências, de Aidan Koch a Lee
JungHyoun), Anna Bouza, por uma complexa e eficaz mistura de poesia
visual, desenho caligramático e elipses visuais criando uma bela
peça gráfica, e Ana Dias, por parecer prometer uma visão
sarcástica e mordaz sobre os desequilibrados comportamentos
consumistas dos nossos dias.
A Pentângulo tem os
ingredientes certos para se manter como um projecto influente e
sólido, a longo prazo, mesmo que precise de reforçar os critérios
de produção e edição para que garanta esse mesmo papel.
Nota final: agradecimentos a todos os
editores, pela oferta do volume.
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