17 de agosto de 2006
Après la Guerre. Luc Brunschwig, Freddy Martin e Étienne le Roux (Futuropolis)
Menu que me perdoe, mas fiquei curioso quando encontrei à venda estes objectos enormes – são finas publicações de 23 x 32,5 cm, com mais de 30 páginas, em papel de grande qualidade e capa em cartão flexível -, ainda para mais quando está indicado na capa serem um primeiro episódio de uma série a continuar. Trata-se da ‘Futuropolis 32’, uma colecção dirigida por um dos seus autores, Luc Brunschwig, autor de uma dezena de livros, e cuja premissa é a seguinte: editar por episódios, de forma regular, estes livros com 32 pranchas a cor (daí o nome, apesar de Guerres Civiles ter 40), apresentando-se dessa forma como um projecto editorial relativamente inédito em França-Bélgica. O objectivo, portanto, é mais associado a um programa comercial, de marcar a diferença pela presença material do que qualquer outra coisa. É isso o que leva ao ódio de Menu, esta “nova” Futuropolis ser um braço da Gallimard, editora generalista – não obstante a qualidade das suas edições -, aventurar-se no mercado da banda desenhada com dinheiros provindos da Soleil, editora cujo catálogo é sobretudo ocupado por high-fantasy, ficção científica, traduções de comics americanos (The Spirit é a jóia da coroa), de banda desenhada japonesa e coreana (inclusive os títulos infantis de Tezuka), mas tudo, quase tudo, sob o signo de um público juvenil ou infantil... O problema é açambarcarem-se do nome de uma das melhores editoras de tempos idos em França, a antiga Futuropolis, que foi a casa de edição de autores ou jovens ou no auge nessa época como Moebius, Tardi, Montpellier, Villem, Francis Masse, etc. Editam David B. e Tardi, é certo, mas o restante catálogo é fracote e nivela-se por uma fasquia medianeira.
Porque o problema reside aí mesmo: o objectivo está estipulado nesses limites formais e comerciais, e não numa vontade interior à obra que mova os autores. Bom, poderia ainda assim estarmos perante um bom exemplo de banda desenhada comercial – como o estamos com Donjon, uma série de títulos do Batman, a obra de Barks... Mas não é o caso. Après la Guerre vive num espaço de clichés da FC: num futuro distópico, em que existe um Governo da ONU, mas no qual nunca nos apercebemos bem porque é que é mais caótico que o nosso, recebemos notícia de que em um ano seremos visitados por alienígenas, e há que nos prepararmos para a guerra. Se bem que isto possa recordar de imediato El Eternauta, de Oesterheld e Solano López, a história é mais clara nos press-release e notas de edição do que propriamente no livro que se nos apresenta, e isso revela desde já uma debilidade grave. Mais, a moral presente recai mais uma vez num maniqueísmo pouco explícito – isto é, é mas finge não ser - e a catadupa de mecha, imitando muitos dos estratagemas da mangá, também não ajudam a montar uma narrativa coesa e adulta. A presença das leituras de Judge Dredd e outros títulos quejandos é muito presente, e não ajuda a criar uma história de ficção científica ou futurologia sequer surpreendente. Outro problema é a total ausência de humor. Nesse (e noutros) aspecto, a Viagem da Virgem é muito mais forte. A arte de Martin já foi chamada de “glauca”, mas isso não deve ser visto como um elogio, pois apenas sublinha o ambiente vago que é criado neste livro. Afinal, se é para se editarem episódios separados numa cadência regular, poderiam ter aprendido com os americanos a fazê-los contendo um manancial de informação problemática que “nos prendesse às cadeiras” e nos fizesse, de facto, ansiar por mais (como ocorre na nova série de Batman escrita por Grant Morrisson, por exemplo)... Não é o que acontece neste caso. E sabendo que Après la Guerre se esticará por 15 episódios, talvez a paciência não...
A colecção é vendida como sendo dinâmica, jovem, arriscada, devido à presença da violência, de uma expressão sem limitações, etc. Mas não entendo: desde quando a presença da violência é sinal de “maturidade”? As milhentas invasões dos Skrulls e os massacres em Donjon mostram, de formas radicalmente diferentes – isto é, sem e com ironia – como isso não é verdade. E pelos vistos os livros de Baudoin são “imaturos” nessa perspectiva? Menu pode ter-me perdoado por ter agarrado nos livros, mas deve-se rebolar a rir com um “bem te disse!”.
Sem comentários:
Enviar um comentário