Kong
é, em larga medida, um devaneio do seu autor pelas terras da
homenagem a um dos mais famosos ícones do cinema popular
norte-americano de todos os tempos. Mas Kong,
the King não
é propriamente uma adaptação de um outro texto (fílmica): é
apenas a plataforma textual que o autor emprega para fazer valer os
seus próprios instrumentos. Se o rugido do imenso gorila era o
grande símbolo da outra personagem, a “mudez” deste livro mostra
em grande parte a tranquilidade pedida por Medina. (Mais)
30 de dezembro de 2015
29 de dezembro de 2015
Amanhã: participação no "Sociedade Civil" (RTP2)
Serve o presente post para indicar que amanhã, pelas 14h, na RTP2, será transmitido o programa Sociedade Civil, com apresentação e moderação de Luís de Castro, dedicado à banda desenhada. São convidados o autor António Jorge Gonçalves e este vosso criado, num bad beard day. Para quem não nos conhece, somos o que faz cosplay de Haddock.
Estará presente ainda uma jovem artista, Sofia Telo, a desenhar todo o espaço do programa.
A conversa é amena, vogando águas calmas e consabidas, mas lá se tentam algumas ondas diferentes. Esperemos que abra um pouco o panorama aos que não acompanham este território...
Para quem não tiver oportunidade, sempre há o podcast no site da RTP ou na página do programa no Facebook.
Um obrigado a toda a equipa de produção e um particular voto de boa sorte à Sofia!
Dispositivo de Circulação de Imagem. Fernando Lindote (auto-edição)
Este
rápido post (mas quem queremos enganar?) vem na esteira da leitura e diálogo com Pedro
Franz, a propósito do seu último trabalho e dissertação de
Mestrado. No envio desses mesmos materiais, o artista teve a
gentileza de agregar ainda outras publicações, como o último
número do jornal Suplemento, e o primeiro de Altamira. Mas a grande
surpresa foi o envio de três pequens publicações do artista
Fernando Lindote. Para todos os efeitos, estes três cadernos são
trabalhos de uma banda desenhada “explodida” por dentro,
não-narrativa, não-sequencial, onde por vezes mesmo a figuração
entra em crise, mas nem por isso abdica de estudar a potencialidade
das séries formais ou conceptuais, e as variações/mutações
internas. (Mais)
28 de dezembro de 2015
Incidente em Tunguska. Pedro Franz (auto-edição)
Gostaríamos que ficasse claro que a leitura deste projecto de
Pedro Franz é feita dentro de uma constelação que se coordenou num espaço de
tempo comum: Dispossession, de Simon
Grennan, e Unflattened, de Nick
Sousanis. Se leremos cada um desses títulos, e este agora, de forma autónoma,
eles unem-se na medida em que são todos trabalhos que são criados num ambiente
e esforço articulado com, ao mesmo tempo, uma pesquisa mais académica da parte
dos autores. Muitas vezes, acredita-se na ideia – repetida até à exaustão até
perder o seu valor explicativo e passar a ser uma fórmula esvaziada de sentido
– de que “uns criam” e “outros criticam”, em que os primeiros fugiriam como o
diabo da cruz de discursos segundos, reflectores, académicos, de pensamento, e
os segundos seriam vistos como estando desligados de uma suposta intuição ou
capacidade criativas. Nada poderia estar mais longe da verdade. O que existe é
um espectro extremamente alargado de criação e seu relacionamento com um
pensamento “ao quadrado”: há aqueles autores que poderão não exercer qualquer
tipo de discurso secundário sobre os seus trabalhos, e aqueles que apenas
retrabalhando conceitos mais intelectuais são capazes de mergulhar na matéria
do trabalho criativo. Porém, não se pode pensar em qualquer tipo de hierarquia,
pois os que “não reflectem” sob a forma de discurso poderão criar obras que
elas mesmas são profundas reflexões sobre o próprio acto criativo, ao passo que
os que botam discurso podem falhar nas abordagens mais primárias a esse
exercício. (Mais)
26 de dezembro de 2015
The Fall of the House of West. Paul Pope, JT Petty, David Rubin (First Second)
Numa abordagem extremamente concentrada, como digestão de
leituras maiores, serve o presente post
para dar conta da recepção do segundo volume da prequela da saga de Battling Boy, de Pope e companheiros. Este
segundo volume continua a acompanhar a demanda de Aurora West pela sorte da sua
mãe, levando-a a oposições ao seu pai, o herói Haggard West, e a fortuna de
Arcopolis, lentamente tombando nas mãos dos pesadelos. (Mais)
24 de dezembro de 2015
O poema morre. David Soares e Sónia Oliveira (Kingpin Books)
Imaginemos um Sísifo ao contrário. Não alguém que tenha sido
condenado a ter de colocar uma pedra rolante no cume de uma montanha, e veja o
seu hercúleo esforço descontado pelo regresso da pedra ao ponto de partida, lá
em baixo, mas antes alguém que encontra sempre a pedra no alto e a faz rolar
encosta abaixo. Por vontade, e até prazer. Mas ao mesmo tempo sem que esteja
totalmente consciente dos gestos que o fizeram empurrar essa pedra, por isso
mantém uma certa candura (jamais inocência, porém!) ao ver a queda e a subida.
Como se tudo ocorresse fora da sua
vontade. Não: é ele o centro das acções. (Mais)
23 de dezembro de 2015
Roturas e ligamentos. Rita Taborda Duarte e André da Loba (Abysmo)
André
da Loba não concorda com Rita Taborda Duarte. “Concorda” deriva
do latim concors,
concordis,
isto é, “coração” (cor)”
+ juntos” (com-).
O coração de Loba não está junto ao coração de Duarte. Por essa
razão, talvez, este Rotura
e ligamentos,
que poderia ser descrito apressada e sumariamente como “volume de
poesia ilustrada”, são na verdade dois volumes, um de poesia de
Taborda Duarte, outro de desenhos de da Loba, encadernados de maneira
a perfazerem um só volume, um corpo geminado, siamês. Caberá ao
leitor ou leitora manipular o livro de maneira a que, lendo os poemas
e vendo os desenhos, acerte o ritmo de cada um desses corações e,
com os ritmos resultantes, chegue a resultados harmónicos, díspares,
contrastantes, complementares, dissonantes, coincidentes. Há aqui um
Tristão e uma Isolda, como veremos, resta saber se há noite que os
una. (Mais)
22 de dezembro de 2015
Os acrobatas. Marcos Trindade (Mmmnnnrrrg)
Este pequeno livrinho em acordeão
é a marca de surgimento do primeiro heterónimo português do autor Tiago Manuel.
Num formatinho pequeno, faria recordar uma espécie daqueles foles de postais
que se vendiam há uns anos, junto a monumentos ou paragens pitorescas,
ofertando várias perspectivas ou facetas do que o título apresentasse. Os acrobatas,
se for lido assim, oferece então várias faces de uma realidade hodierna da
nossa sociedade, a de uma classe de pessoas que ocupa a paisagem social e a
tingem com uma cor difícil de lavar. (Mais)
20 de dezembro de 2015
Jim Del Mónaco: O cemitério dos elefantes. Tozé Simões e Luís Louro (ASA).
Antes de entrarmos na leitura propriamente dita do livro temos de fazer um pequeno desvio teórico, já que não se pode ler este volume no vazio.
A técnica de leitura crítica
mais comum na ciência literária durante o século XX é o que se chama “close
reading”, isto é, para seguir uma das suas definições, uma “observação cuidada,
a leitura sustentada e concentrada de um texto” (Matthew Jockers), procurando
compreender os mecanismos do seu funcionamento, construção de sentido, estilo,
etc. Esta foi uma técnica empregue desde os anos 1930, com o surgimento do
chamado Novo Criticismo, mas atravessaria várias instâncias e transformações à
medida que foi informado pela desconstrução, os estudos culturais, o feminismo,
os estudos pós-culturais, etc., cada qual expandindo a forma de atenção e a
sensibilidade de como um texto respondia à textura social e cultural em que se
integrava (em sistemas concêntricos sucessivos: cultura local, regional,
nacional, linguística, artística, europeia, global, etc.). Estas questões, é
preciso dizê-lo desde já, não são de todo impertinentes em relação à banda
desenhada, uma vez que enquanto disciplina artística e texto, ela faz parte da
esfera pública. Para mais, a ciência literária é uma das áreas que mais tem
influenciado a crítica de banda desenhada, aspecto que nós assumimos
pessoalmente, sendo essa precisamente a nossa formação (não perdendo porém a
ideia de que sendo uma disciplina específica, e visual, tem instrumentos
distintos da literatura). (Mais)
19 de dezembro de 2015
Três livros de jogos ópticos: apagar para ver.
Uma parte importante da história da ilustração para a
infância, ou da literatura ilustrada para a infância, é constituída por
exemplos de livros-jogo. Objectos que, cumprindo todas as condições materiais e
conceptuais do livro, providenciam uma dimensão interactiva, no sentido mais
imediato do termo, que lhe altera a forma, desdobra sentidos semi-ocultos, o
coloca num qualquer movimento. Os três livros que trazemos aqui à colação são
unidos por um mesmo princípio muito geral: o de empregar filtros de celofane
colorido de modo a revelar (mas curiosamente, ao “contrário”, como veremos) as
imagens ocultas. (Mais)
18 de dezembro de 2015
Com 3 Novelos (O mundo dá muitas voltas). Henriqueta Cristina e Yara Kono (Planeta Tangerina)
A produção de livros
ilustrados, sobretudo aqueles que se dirigem em especial, mas não
exclusivamente, a um público infantil, em Portugal, tem conhecido nos últimos
anos, como se sabe, uma curva ascendente no que diz respeito à sua qualidade
global. Há uma cultura visual que se tem tornado cada vez mais premente, uma
dedicação ao burilar do texto atenta às várias dimensões sociais complexas da
contemporaneidade, alianças mais cuidada entre texto e imagem ou à articulação
das imagens na sua possibilidade de leitura, a materialidade dos próprios
livros, a coordenação de políticas editoriais e de colecções mais coerentes,
assim como a fundação de uma cultura no seu pleno sentido. Se as condições de
trabalho, profissionais e financeiras, se alteraram, imaginamos que com dificuldades
ainda sentidas, em termos de recepção crítica e da fundação de uma “comunidade
imaginária” apreciadora é garantida. E os balanços podem ser positivos, se
seguirmos as atentas palavras e ideias críticas
de Andreia Brites, no seu artigo “O perigo do eterno retorno”, na revista Blimunda (no. 32, de Janeiro deste ano). (Mais)
16 de dezembro de 2015
Bending Steel. Aldo J. Regalado (University Press of Mississippi)
Para Regalado, os super-heróis são
“seres da imaginação”. Nesse sentido, eles não possuem em si
mesmos princípios ideológicos ou culturais absolutos, mas são
antes figuras que são empregues em vários usos e contextos. Este
autor não olha para estas personagens como figuras salvíficas, à la Grant Morrison, uma vez que entende de modo sério as limitações
intrínsecas às criações da cultura em relação ao poder
sistémico, como ele diz. Sendo a modernidade entendida como uns
grilhões de aço, porém, essas figuras são metáforas “com
criatividade, inteligência, sensibilidade, inclusividade e dedicação
suficiente” para as dobrar (228). Mas para entender os instrumentos
com que o farão, e o modo como têm respondido ao curso da história,
é preciso percorrer os passos para trás e ter uma visão de
conjunto. (Mais)
15 de dezembro de 2015
Quero a minha cabeça! António Jorge Gonçalves (Pato Lógico)
Este é o segundo livro do autor nas mesmas circunstâncias que Barriga da baleia, isto é, um livro a
solo, dirigido ao público infantil, e numa mesma preocupação ou geminação material
com os livros criados na Pato Lógico. Não se estabelecendo de forma alguma com Barriga da baleia para criar uma “série”,
partilhará porém alguns princípios comuns com aquele outro projecto, começando
pela protagonista, uma menina pequena que se isola da família para mergulhar
numa viagem solitária e algo melancólica de, a um só tempo, procura de si mesma
e de regresso à vida familiar com uma nova perspectiva. (Mais)
12 de dezembro de 2015
Blog bd - Sous l'eau-Sous la terre/O professor Astrogato nas fronteiras do espaço. Dominic Walliman e Ben Newman/Aleksandra Mizielinska e Daniel Mizielinski (Rue du Monde/Mini Orfeu)
Estes dois imensos livros fazem remontar os seus princípios
à famosa noção de Cícero, na busca de discursos de perfeição em que a tarefa da
instrução se articule da forma mais entrelaçada com os movimentos do deleite. Isto
é, estimulando o entendimento cognitivo sobre uma área qualquer de
conhecimentos, procura-se ao mesmo tempo que haja um decisivo estímulo dos
sentidos e de inclinar os afectos. (Mais)
11 de dezembro de 2015
Amores de família. Carla Maia de Almeida e Marta Monteiro (Caminho)
Na vida diária, na linguagem quotidiana, muitas palavras são
empregues de modo despreocupado, sem que o peso da sua etimologia ou do seu uso
particular e informado por uma perspectiva específica tenha aí papel. Mas noutros
contextos, elas distinguem-se, por meio de subtilezas ou concretudes teóricas,
cujo objectivo não é tanto alterar a natureza do seu emprego diário, mas antes
ajudar a pensar, em contexto especial, de modo mais cuidado. A área difusa a
que se tem dado o nome de “Teoria dos Afectos” , um campo interdisciplinar que
nasce da psicanálise mas se entrosa por outros territórios, distingue sentimentos, emoções e afectos. Estes últimos
são como que reacções corporais pré-cognitivas, isto é, pré-pessoais, e são
depois estudadas como categorias específicas. Os sentimentos estão associados,
como que bordados, na tessitura do pessoal, do biográfico. As emoções, por sua
vez, são sociais, aprendidas, construídas ou tecidas, nunca na solidão. (Mais)
10 de dezembro de 2015
O Dicionário do menino Andersen. Gonçalo M. Tavares e Madalena Matoso (Planeta Tangerina)
Nem sempre os dicionários têm
simplesmente de funcionar como um espelho do estado da língua.
Alguns actuam como prontuários e tomam mesmo decisões novas que
depois ganham a força da lei. Esses podem por vezes “mijar fora do
penico”. O Dicionário dito da Academia, por exemplo, define
bengala como um “Objecto de madeira ou cana, em forma de
haste terminada por um punho, que serve para apoiar a mão quando se
anda”, deixando de lado todas e quaisquer bengalas feitas de outros
materiais (que passam a ter de procurar outro nome), e centralizando
a sua função na mão e não na marcha e todo o corpo (como que
desviando todo o peso). Depois existem os dicionários
especializados, das gírias, que nos ensinam a diferença entre um
batoque e um bidé, os especializados profissionais,
que nos identificam as alhetas e o molinete, e os
etimológicos, que nos recuperam a palavra célico. (Mais).
Worse Things Happen at Sea/ Beyond the Surface. Kellie Strøm/Nicolas André (Nobrow Press)
Nem por acaso, havíamos falado de dois
volumes “em biombo” que dois títulos da colecção Leporello da
NoBrow nos chegaram às mãos. Um dos livros “colecciona” ataques
de criaturas monstruosas nos altos mares, mostrando desde criaturas
mais ou menos generalistas, como dragões, narvais e lulas gigantes,
a figuras possivelmente específicas, como Cila, a tartaruga Zaratan ou o
pássaro Gandaberunda, e mostrando navios de vários momentos da
história, de gregos a vikings, de barcos mercantis holandeses a
hidroaviões franceses, de paddle steamers a juncos chineses.
O outro sobe uma montanha, de faces coberta de neve, do sopé ao
pico, e desce pelo interior da terra, escavando um buraco até ao
momento em que se encontram as profundezas do oceano. (Mais)
8 de dezembro de 2015
Partida/Outono. André Letria (Pato Lógico).
Estes dois livros fazem parte de uma série, ou colecção, que
Letria tem explorado na sua editora. Chamada Desconcertina, até à data os seus títulos partilham os mesmos
princípios formais mas, mais importante, um mesmo espírito, que eleva estes
livros de meros objectos de entretenimento infantil a instrumentos ideais para
pensar. (Mais)
7 de dezembro de 2015
Private Eye. Brian K. Vaughan e Marcos Martín (Panel Syndicate/Image)
Em
termos de género (literário), a descrição desta banda desenhada é
bastante simples e, por essa mesma razão, não se está a ser
redutor (a menos que partamos da ideia, não totalmente errada, de
que a própria categorização é redutora, e levanta problemas em si
mesma). Private
Eye
é uma novela (aqui, no preciso sentido da palavra, de concisão
narrativa e concentração actancial) de ambiente de ficção
científica de intriga policial. Até à data, surgiram dois volumes
(digitais) perfazendo uma história. (Mais)
5 de dezembro de 2015
Pacote da Big Planet/Retrofit Comics.
Se bem que a grande revolução da banda desenhada alternativa
dos anos 1990 já tenha tido o seu momento de maior glória, não apenas no que
diz respeito à própria produção, mas circulação, distribuição, apreciação
crítica, mas de certa forma também no que diz respeito à criação dos textos em
si, isso não significa que não existam momentos de quando em vez de maiores
picos de novos agentes. É provavelmente
a distância e a idade que faz com que os entusiasmos se transformem em relação
a novos títulos, autores e estilos, porque as coisas são vistas numa
perspectiva mais alargada do que se se estivesse “inscrito” no momento (como se
passou precisamente na década de 1990 para nós). Mesmo assim, é saudável tentar
compreender algumas coisas mesmo que de uma forma necessariamente aproximativa
e geral. É o que se passa com os livros produzidos pelas lojas Big Planet em
parceria com a pequena editora Retrofit. (Mais)
4 de dezembro de 2015
Las Meninas. Santiago García e Javier Olivares (Astiberri)
Poderíamos começar este texto da
mesma forma que o anterior, já que também Javier Olivares foi alvo
da nossa atenção há quase uma década, e que são apenas
circunstâncias algo superficiais que nos colocam de novo frente a um
seu trabalho. Por outro lado, este volume estabelece algumas linhas
de relação com o de Auladell, menos por características comuns de
pertença social do que pela forma como ambos entram em diálogo com
a pintura ocidental. Auladell numa óptica de re-utilização
dramática, Olivares e García numa de pesquisa. (Mais)
3 de dezembro de 2015
El paraíso perdido de John Milton. Pablo Auladell (Sexto Piso)
Como é natural, acompanhar todos e
quaisquer livros produzidos nos últimos anos de vários quadrantes
geográficos e estilísticos não é possível, mesmo que haja razões
para, ao nos interessarmos por um determinado autor, ser desejável
acompanhar de maneira sustentada o seu percurso. Há quase dez anos,
faláramos de La Torre Blanca, de Pablo Auladell. E apesar de
nos cruzarmos aqui e ali com o seu trabalho de ilustrador e de autor
de bandas desenhadas, foi preciso atravessar um deserto para ter a
oportunidade de desembocar num projecto de grande fôlego. Este
volume com mais de 300 páginas é uma adaptação livre do famoso
poema de John Milton. Tendo começado num momento que se veria
interrompido, e fruto de transformações internas, esta é a sua
forma final. Desta feita então, Auladell empresta as suas figuras
quasi-andróginas, pequenos títeres de grafite, para dar corpo a uma
encenação que ronda a vontade e autonomia, o amor e a entrega, a
glória e a solidão, a distribuição de poder e o sonho, ou até
mesmo a mais profunda natureza humana, levada a cabo por seres que,
em princípio, estariam longe das suas paixões. (Mais)
29 de novembro de 2015
Conversa em Pontevedra.
A convite dos Departamentos de Português das Escolas Oficiais de Idiomas de Pontevedra e de Vila Garcia, na Galiza, estarei amanhã, Segunda, e depois de amanhã, Terça, a falar de banda desenhada portuguesa. O propósito tem mais a ver com a conhecer a realidade da língua portuguesa, mas espero ter oportunidade de despertar o interesse de novos leitores pelos trabalhos existentes na nossa "cena contemporânea", sejam livros mais críticos da nossa sociedade e atentos à situação económica-social, sejam livros que procurem de alguma forma criar ficções bem-dispostas, ou mesmo aqueles autores que viverão em espaços intermédios em termos de forma e conteúdo.
Se estiverem com vontade de comer uns chipirones e botá-los abaixo com um branco numa cunca, apareçam.
Agradecimentos a María J. Sola Bravo e Carlos Alhegue Leira, pelo convite, a Conceição Pereira, pelo contacto, e Carlos Pinheiro, pelo uso da imagem (de Sobrevida).
Se estiverem com vontade de comer uns chipirones e botá-los abaixo com um branco numa cunca, apareçam.
Agradecimentos a María J. Sola Bravo e Carlos Alhegue Leira, pelo convite, a Conceição Pereira, pelo contacto, e Carlos Pinheiro, pelo uso da imagem (de Sobrevida).
26 de novembro de 2015
Graphic Novel. An Introduction. Hugo Frey e Jan Baetens (Cambridge University Press)
Começaríamos por
afirmar uma declaração de interesses, uma vez que, sendo Jan
Baetens o nosso orientador académico, e mentor de longa data com
muitos dos seus escritos, que nos vemos forçados a afirmar a
superioridade desta obra sobre todas e quaisquer outras que possam
ter surgido sobre a mesma temática. De uma forma cabal, única e
derradeira, eis a última palavra a dizer sobre esse fenómeno da
“graphic novel” e, por atacado, sobre a banda desenhada. Boa
noite, e obrigado.
Se as coisas
pudessem seguir esses trilhos assim fáceis, a vida sorriria a todos
os momentos, mas a realidade é bem distinta. (Mais)
23 de novembro de 2015
28 NOV | 16h00 | Conferência com José Marmeleira: "Um olhar plural sobre as imagens."
Como forma de retomar algum ritmo de trabalho neste espaço, serve o presente para dar a conhecer o seguinte encontro:
"Integrada na programação complementar da Exposição SemConsenso, Banda Desenhada, Ilustração e Política, patente no Museu do Neo-Realismo até 20 de Março de 2016, realiza-se no próximo dia 28 de Novembro, pelas 16h00, a Conferência Um olhar plural sobre as imagens.
"A Conferência conta com a presença de Pedro Moura, Curador da Exposição e de José Marmeleira, jornalista e crítico nas áreas da música pop e da arte contemporânea, colaborador no jornal Público, na revista de arte Contemporânea, nas publicações Ler e Time Out Lisboa, professor de Fundamentos do Jornalismo na Universidade Europeia e doutorando em Filosofia da Arte na Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa (FC-UL).
"Entrada livre.
"Contamos com a sua presença."
Imagem: Carlos Pinheiro, em Sobrevida (com Nuno Sousa. Imprensa Canalha: 2012)
15 de novembro de 2015
PARIS: 15 de Novembro/Catharsis. Luz (Futuropolis)
A escrita
deste texto escapará às regras mais ou menos instituídas deste
espaço. Usualmente parece-me importante apagar-me da cena, já que
não é a minha pessoa que conta na leitura, mas sim um entendimento
– com que podem ou não concordar os leitores – de uma série de
instrumentos e metodologias de leitura dos livros, os quais devem ter
uma natureza própria, ainda que nunca descontextualizada. Assim
sendo, este texto é mais uma crónica, que valerá pouco no campo da
crítica, mas é necessária. (Mais)
13 de novembro de 2015
Rodapé: 20-22 de Novembro.
Serve o presente post para anunciar que no próximo fim-de-semana de 20-22 de Novembro terá lugar a edição do encontro O que um livro pode, co-organizado pela Oficina do Cego, à qual pertencemos. Este ano os encontros terão lugar no edifício/projecto Rua das Gaivotas 6 (que é também, obviamente, o seu endereço) e são exclusivamente dedicados aos livros para a infância. Durante esses dias, haverá lançamentos de novos livros, conversas e mesas-redondas, apresentações breves, leituras e mostras, e uma feira de edição de livros para os putos (óptimo para Natais alternativos).
No âmbito desse encontro, terá lugar uma exposição ou mostra de ilustração para a infância, intitulada Rodapé, e que foi coordenada por nós, contando com trabalhos de Afonso Cruz, Ana Biscaia, André Letria, António Jorge Gonçalves, Bernardo de Carvalho, Catarina Sobral, Daniel Silvestre da Silva, Gonçalo Viana, João Fazenda, Madalena Moniz, Madalena Matoso, Marta Monteiro, Richard Câmara, Susa Monteiro e Yara Kono. Esta exposição tenta escapar da lógica "white cube" das exposições, e, utilizando meios muito simples e limitados, é pensada para os visitantes mais jovens. Para além das imagens expostas, a exposição conterá o "arquipélago do Faztu", constituído por quatro mesas-ilhas-atelier, nas quais os visitantes poderão encontrar objectos para desenhar, fazer postais, brincar, preencher paisagens, etc. numa relação interactiva com a criatividade de todos. Este arquipélago é coordenado por Alexandra Baudouin e por nós. É, portanto, uma óptima oportunidade para trazer os miúdos para um fim-de-semana fora de casa.
Estamos ainda responsáveis por uma mesa-redonda que terá lugar no Domingo, dia 22, pelas 17h00, em torno dos processos de edição dos livros ilustrados infantis, moderando a conversa com André Letria, Catarina Sobral e José Oliveira. Esta conversa já é para os mais graúdos.
Aqui ficam os agradecimentos aos organizadores do evento pelo convite feito, a todos os artistas que responderam positivamente ao projecto e a toda a malta que ajudou. Até lá.
No âmbito desse encontro, terá lugar uma exposição ou mostra de ilustração para a infância, intitulada Rodapé, e que foi coordenada por nós, contando com trabalhos de Afonso Cruz, Ana Biscaia, André Letria, António Jorge Gonçalves, Bernardo de Carvalho, Catarina Sobral, Daniel Silvestre da Silva, Gonçalo Viana, João Fazenda, Madalena Moniz, Madalena Matoso, Marta Monteiro, Richard Câmara, Susa Monteiro e Yara Kono. Esta exposição tenta escapar da lógica "white cube" das exposições, e, utilizando meios muito simples e limitados, é pensada para os visitantes mais jovens. Para além das imagens expostas, a exposição conterá o "arquipélago do Faztu", constituído por quatro mesas-ilhas-atelier, nas quais os visitantes poderão encontrar objectos para desenhar, fazer postais, brincar, preencher paisagens, etc. numa relação interactiva com a criatividade de todos. Este arquipélago é coordenado por Alexandra Baudouin e por nós. É, portanto, uma óptima oportunidade para trazer os miúdos para um fim-de-semana fora de casa.
Estamos ainda responsáveis por uma mesa-redonda que terá lugar no Domingo, dia 22, pelas 17h00, em torno dos processos de edição dos livros ilustrados infantis, moderando a conversa com André Letria, Catarina Sobral e José Oliveira. Esta conversa já é para os mais graúdos.
Aqui ficam os agradecimentos aos organizadores do evento pelo convite feito, a todos os artistas que responderam positivamente ao projecto e a toda a malta que ajudou. Até lá.
8 de novembro de 2015
Esquadrão da Luz/Fell. Tomasi e Snejberg/Ellis e Templesmith (G. Floy)
Enquanto a G. Floy vai dando continuidade aos títulos mainstream da Image que têm construído o
cânone actual dos “clássicos contemporâneos”, como Saga ou Fatale, é de
notar como também não deixa de apostar em outros títulos sem continuidade, mas que alargam o acesso a esses mesmos pólos de
produção do mainstream que não dos
super-heróis. No caso presente, gostarísmos de nos debruçar brevemente num
título novo, relativamente simples, que mistura vários géneros consabidos num
projecto de alguma leveza, Esquadrão da
Luz, e outro, já publicado há alguns anos, que mistura a novela de
detectives a uma espécie de horror existencialista ou niilista, Fell: Cidade Selvagem. (Mais)
6 de novembro de 2015
Poemas do conta-gotas. João Pedro Mésseder e Ana Biscaia (Xerefé)
Talvez tenha a ver com a economia das palavras, que tem
menos a ver com o minimalismo ou alguma estratégia de “simplicidade” imaginada que
as crianças necessitam, mas a poesia de Mésseder recorda-nos a de Francis Ponge
ou de René Char. Sobretudo por se manter um certo lirismo, tantas vezes
abandonado em nome de uma suposta imitação do quotidiano e um aproximar da
realidade mais imediata da expressão política. Porém, esse abandono não
significa necessariamente uma maior aproximação à expressão da ética, precisamente
como demonstraria a dimensão desses dois poetas citados. (Mais)
5 de novembro de 2015
SemConsenso: um manifesto.
Agora que a exposição está patente no Museu do Neo-Realismo (até 20 de Março de 2016), é tempo de convidar todos os interessados a visitarem-na, não apenas pelas razões pessoais que daí possam advir mas sobretudo por acreditarmos que esta pode ser uma forma de ver estes trabalhos de uma nova perspectiva, mas também uma maneira de re-eletrificar a matéria conceptual e política que eles implicam, assim como as das obras do próprio museu.
Deixamos aqui o texto que lemos no dia da abertura (com ligeiras modificações), esperando que complemente todos os outros materiais textuais disponíveis (o panfleto à entrada, o jornal da exposição). "Manifesto" aqui deverá estar quer no seu sentido dissertativo como no de declaração de carga, digamos assim. As fotografias foram disponibilizadas pelos serviços do museu, e espero que sirvam para abrir o apetite. (Mais)
Deixamos aqui o texto que lemos no dia da abertura (com ligeiras modificações), esperando que complemente todos os outros materiais textuais disponíveis (o panfleto à entrada, o jornal da exposição). "Manifesto" aqui deverá estar quer no seu sentido dissertativo como no de declaração de carga, digamos assim. As fotografias foram disponibilizadas pelos serviços do museu, e espero que sirvam para abrir o apetite. (Mais)
4 de novembro de 2015
L.L. de Mars/ Steve Aylett. Judex/Johnny Viable and his terse friends (La cinquième couche/Floating World Comics)
Brevemente, queremos dar conta de dois
projectos que, de uma forma muito distinta, operam sobre um mesmo
princípio e, desta forma, também contribuem para um entendimento
cada vez mais alargado da banda desenhada enquanto disciplina
artística. Apesar da oferta de textos, canais de distribuição e
até sectores de prática serem cada vez mais múltiplos, ainda
existe uma ideia muito forte que confunde a validade do gesto com a
de um juízo de valor sobre a obra em questão e o respeito (ou falta
dele) para com as formatações existentes. Repetimos uma ideia já
há muito apresentada: a de que se se quer acreditar na banda
desenhada enquanto disciplina artística, tem de se deixar que ela
persiga precisamente as justezas heterógeneas que a arte, enquanto
conceito, exige. (Mais)
1 de novembro de 2015
Ambient Comics/Infusion. Nadine Redlich/Pascal Matthey (Rotopolpress/Habeas Corpus)
Será possível ter uma categoria constituída de uma só
instância? Poderá uma nomenclatura criada para um título alertar-nos para
outros exemplos anteriores que passam a fazer parte dessa mesma categoria?
Poderá, ao isolar-se uma prática corrente, subsumida a programas mais
convencionais de narratividade e representação, re-fundi-la de um modo mais
autónomo? (Mais)
24 de outubro de 2015
Museu do Neo-Realismo: SemConsenso.
Serve o presente post para finalmente anunciar que no próximo Sábado, no Museu do Neo-Realismo, em Vila Franca de Xira, inaugurará a exposição
SemConsenso.
Banda desenhada, ilustração e política.
Trata-se de uma mostra de trabalhos que compreenderá banda desenhada publicada em livros, jornais, revistas, publicações de vário cariz, assim como ilustrações editoriais, cartoons, e outros objectos menos comuns que, de uma forma ou outra, "abrem um novo espaço da política" (o texto costumeiro de comissário teorizará mais, a incluir na publicação a lançar, mas aqui sejamos mais curtos). É uma constelação que não tem respostas nem pretende seguir os caminhos já trilhados ou pré-preparados para a "discussão séria". Bem pelo contrário, são colocadas muitas perguntas.
Esta exposição contará com a presença de trabalhos dos seguintes autores, de forma mais alargada ou mais concentrada:
Alice Geirinhas
Álvaro Santos
Amanda Baeza
António Jorge Gonçalves
Bruno Borges
Carlos Pinheiro
Cristina Sampaio
Daniel Seabra Lopes
João Fazenda
José Feitor
José Smith Vargas
Jucifer
Marco Mendes
Marcos Farrajota
Marriette Tosel
Miguel Carneiro
Miguel Rocha
Nuno Saraiva
Nuno Sousa
Pepedelrey
Tiago Baptista
e ainda mural de Pepedelrey & André Lemos.
A entrada, para além de grátis, é livre. Seria muito bom ter a vossa presença.
Nota final: ver "manifesto".
23 de outubro de 2015
Gothic in Comics and Graphic Novels. Julia Round (McFarland)
Este livro de Julia Round já há muito
tempo que estava prometido, dado o incansável trabalho da autora, em vários
artigos, não somente no estudo narratológico da banda desenhada como de facto
abordando tópicos agregáveis sob esta designação: o gótico. Este livro
apresenta novas abordagens críticas, e engloba-o não somente de uma forma
histórica e literária, como procurando os seus desenvolvimentos posteriores em
várias frentes criativas e a sua influência mais alargada em termos culturais.
No que diz respeito à banda desenhada em particular, a sua importância está
menos até no tema em si – que pode ou não interessar a um público mais alargado
– mas na forma excelente através da qual a autora consegue integrar, numa
estrutura inconsútil, todos os domínios analisáveis desta disciplina. (Mais)
18 de outubro de 2015
Títulos brasileiros vários.
Para fechar este breve ciclo concentrado na produção
contemporânea brasileira, que esperamos ter demonstrado uma parcela da
diversidade existente – temos notícias de muitos outros trabalhos a que,
infelizmente, não tivemos acesso – terminaremos com textos curtos sobre uma
mão-cheia de títulos individuais. O tratamento colectivo não deve ser entendido
em detrimento dos mesmos, por oposição aos trabalhos anteriores, mas
tão-somente uma estratégia de gestão do nosso trabalho.
Falaremos de dois livros de uma editora brasileira, a Veneta,
que é precisamente aquela que publicou Tungstênio, de Quintanilha, e de
uma portuguesa, a Polvo, também tendo publicado esse título. Se a Veneta é uma
editora de objectos multifacetados que vai conquistando espaço, no que à banda
desenhada diz respeito, no seu país, num panorama já de si bastante
diversificado, mas que tem dado mostras de crescimento e amplitude, a Polvo é
uma veterana da banda desenhada (mas não só) em Portugal, e que tem aberto espaço a uma “translação” de trabalhos
brasileiros para que sejam apresentados ao público nacional, deste lado do
lago. A Polvo não iniciou a sua série de títulos brasileiros de uma forma em
que a pensasse enquanto colecção, como se pode ver pelos seus índices, mas mais
recentemente esse esforço, concertado e planeado a médio e longo prazo
reflecte-se na organização do catálogo.
No final, revisitaremos uma editora
consolidada, a Companhia das Letras, que volta a sua atenção para o património
recente da HQ nacional. (Mais)
16 de outubro de 2015
Afiar a língua no Porto.
Serve o presente para indicar que estaremos amanhã nos encontros Ilusão de movimento, organizados pela Casa da Animação, para uma conversa a três em torno da actividade do argumentista para várias disciplinas. A quem interessar e se puder, apareçam, para charlar.
15 de outubro de 2015
Yeshuah (3 vols.). Laudo Ferreira e Omar Viñole (Devir Brasil)
Esta trilogia é uma verdadeira empreitada do autor, e um livro
que mereceria uma atenção particular que ultrapassasse, não a “mera” leitura –
uma vez que toda a leitura jamais é
“mera”, mas bem pelo contrário necessária e central -, mas a breve opinião, ou
o encómio superficial e célere, ou até mesmo a despreocupação como que se
entrega um prémio, porventura, sem que se coloquem perguntas mais prementes aos
seus mecanismos. É possível que essa importância se acresça pelo facto de ter
uma matéria que é, a um só tempo, tão premente quando deveria ser secundária,
talvez. Afinal de contas, vivemos hoje num tempo e em sociedades
suficientemente laicas para que qualquer revisitação da vida e missão de Jesus
da Nazaré não seja vista de imediato como um anátema, mas antes como uma
interrogação que nascerá de uma vontade genuína. A situação do Brasil é talvez
diferente da de Portugal, no aspecto religioso, mas seriam necessários outros
instrumentos, ancorados numa perspectiva sociológica séria, para dar conta
desse recado. Estranhamente, entre nós, é mais imediata a controvérsia em torno
de Fátima do que debelar a figura do Cristo que causaria mais imediata celeuma,
o que desde logo revela os substratos bem diversos que informam o nada
heterogéneo Catolicismo (nem falemos do Cristianismo), mais matizado do que a
Igreja Católica o quer pintar. (Mais)
12 de outubro de 2015
Tungsténio. Marcello Quintanilha (Veneta/Polvo)
Em
todos os momentos da nossa vida, não vivemos apenas no presente. A
qualquer momento da nossa experiência, decorrente da duração a que
pertencemos, arrastamos connosco fantasmas do tempo passado, assim
como do futuro. Encaixadas numa experiência humana do tempo, e na
nossa inscrição física nesse fluido, pressupõem-se um passado
havido e um futuro a vir. Como escreve Henri Bergson no seu
incontornável Matéria
e Memória,
“Por mais breve que se suponha uma percepção, com efeito, ela
ocupa sempre uma certa duração, e exige consequentemente um esforço
de memória, que prolonga, uns nos outros, uma pluralidade de
momentos”. (Mais)
10 de outubro de 2015
Graphic MSP: 2º fase. AAVV (Panini Comics)
Tendo discorrido
longamente sobre a 1º fase da ditas “novelas gráficas” que reempregaram as
famosas personagens criadas por Maurício de Sousa em novos enquadramentos
criativos – e o emprego desta palavra, “fase”, não é de forma alguma alheio às
estratégias de progressiva editorialização dos seus conteúdos pela Marvel;
afinal, estes títulos são encomendas num contexto, e não fruto somente de uma
vontade autónoma dos autores envolvidos, se bem que haja muitos movidos pelo
desejo de “brincar com estes brinquedos” -, convido os leitores do Lerbd a
remeterem-se a esses outros textos para regressarmos às mesmas considerações
que conduzem aos novos títulos. Desta feita, a criação de expectativas faz-se
de uma forma dupla, mas nenhum delas sobre uma ausência. Em primeiro lugar,
tendo existido já uma experiência anterior, isto permite que se crie um
horizonte de expectativas, para usar a expressão famosa de Jauss, mais
pormenorizado. As regras do jogo, digamos assim, estão compreendidas, logo a
parada é maior. Por outro, tendo em conta que de quatro títulos, dois repescam
as mesmas personagens com a mesma equipa criativa, e outros dão início a um
passo inédito, há uma perfeita distribuição do efeito de novidade e do de
continuidade. (Mais)
8 de outubro de 2015
Dois irmãos. Fábio Moon, Gabriel Bá, Milton Hatoum (Quadrinhos na Cia.)
Tal como sucedera
com The Divine,
também este livro junta dois gémeos para
tecerem a história de outros dois gémeos. No caso presente,
trata-se de uma adaptação do romance Dois
irmãos vem de Milton Hatoum, publicado
em Portugal como Dois irmãos,
na excelente colecção Sabiá da Cotovia, que nos tem permitido
conhecer toda uma geração de escritores brasileiros contemporâneos
(e inclusive outros títulos do autor). (Mais)
6 de outubro de 2015
Vários títulos. AAVV (Cachalote)
Introdução: No
espaço desta e da próxima semana, colocaremos neste espaço uma
série de textos sobre banda desenhada brasileira contemporânea que,
por sorte e esforço, nos tem chegado às mãos. Atravessaremos
vários géneros, estilos, territórios e mercados, mas esperamos que
isto permita, por um lado, aos leitores portugueses (ou outros), uma
maior aproximação à pujante produção do Brasil e, por outro, aos
leitores brasileiros, uma perspectiva não-local, que esperamos sirva
para algum diálogo transatlântico.
Este
primeiro texto(s) será curto, pois remeteremos os leitores para a apresentação que já fizéramos deste projecto, o 1000, face ao
qual a nova colecção, Franca, é quase uma pequena variação. Se
aquela se apresenta como um caderno de uma dezena de páginas,
impressas a preto sobre papel colorido, e sem qualquer matéria
verbal para incentivar outro tipo de pesquisa na organização
estrutural das imagens enquanto forma narrativa (ou não-narrativa),
a Franca apresenta-se como uma mais clássica publicação, a
preto-e-branco, com uma sobrecapa, mas onde o conteúdo se pode
alinhavar por princípios mais convencionais, ou não, da relação
entre texto e imagens. Este é um grupo de pequenos, mas
significativos gestos na diversidade da paisagem editorial
brasileira, já que não se conformam à ideia de “novela gráfica”,
“adaptação”, “livro”, os quais, com maior ou menor
felicidade, conquistarão de imediato uma maior atenção,
automática. (Mais)
5 de outubro de 2015
Participação na ACME Speaker Series.
Para os interessados e disponíveis, amanhã será um dia cheio (para nós) em Liège, Bélgica, integrados que estaremos numa série de conversas do grupo de investigação ACME.
Em primeiro lugar, terá lugar uma conversa a dois de manhã com o artista suíço, radicado em Bruxelas, Pascal Mathey. Falaremos da sua obra e o seu caminho pela experimentação, desde o seu início por obras mais convencionais, como por exemplo Pascal est enfoncé, os vários projectos de fanzines colectivos (Soap, We All Go Down) e finalmente o tour de force de colagem abstracta 978. Esperamos fazer uma radiografia não apenas do seu percurso pessoal, mas compreender igualmente os processos de trabalho e a vontade inerente a essa disciplina cada vez mais estranha.
Da parte da tarde, já da nossa responsabilidade exclusiva, faremos uma apresentação-discussão em torno de um tema que nos é caro e temos procurado melhorar a cada instância: a experimentação, ou experimentalismo, se preferirem, no campo da banda desenhada. Será apresenta uma base teórica da sua discussão, uma tipologia de identificação e uma larga panóplia de exemplos que atravessam momentos históricos, geografias, géneros e estilos e formas autorais e materiais.
O grupo ACME já publicou volumes dedicados à L'Association, à noção de dissidência na banda desenhada, e prepara um novo volume sobre Spirou, no qual, como indicado já anteriormente, estamos a participar. Estes encontros informais visam colocar à discussão e polinização colectiva toda uma série de assuntos que se associem a esta área quer do ponto de vista formal, cultural, social ou, preferivelmente, onde tudo faça coordenação produtiva.
Ficam aqui os agradecimentos a Aarnoud Rommens e Benoît Crucifix, responsáveis principais por esta organização e convite.
Mais informações sobre o grupo, aqui.
Em primeiro lugar, terá lugar uma conversa a dois de manhã com o artista suíço, radicado em Bruxelas, Pascal Mathey. Falaremos da sua obra e o seu caminho pela experimentação, desde o seu início por obras mais convencionais, como por exemplo Pascal est enfoncé, os vários projectos de fanzines colectivos (Soap, We All Go Down) e finalmente o tour de force de colagem abstracta 978. Esperamos fazer uma radiografia não apenas do seu percurso pessoal, mas compreender igualmente os processos de trabalho e a vontade inerente a essa disciplina cada vez mais estranha.
Da parte da tarde, já da nossa responsabilidade exclusiva, faremos uma apresentação-discussão em torno de um tema que nos é caro e temos procurado melhorar a cada instância: a experimentação, ou experimentalismo, se preferirem, no campo da banda desenhada. Será apresenta uma base teórica da sua discussão, uma tipologia de identificação e uma larga panóplia de exemplos que atravessam momentos históricos, geografias, géneros e estilos e formas autorais e materiais.
O grupo ACME já publicou volumes dedicados à L'Association, à noção de dissidência na banda desenhada, e prepara um novo volume sobre Spirou, no qual, como indicado já anteriormente, estamos a participar. Estes encontros informais visam colocar à discussão e polinização colectiva toda uma série de assuntos que se associem a esta área quer do ponto de vista formal, cultural, social ou, preferivelmente, onde tudo faça coordenação produtiva.
Ficam aqui os agradecimentos a Aarnoud Rommens e Benoît Crucifix, responsáveis principais por esta organização e convite.
Mais informações sobre o grupo, aqui.
4 de outubro de 2015
Sandman, Overture # 06. Neil Gaiman e J. H. Williams III (Vertigo)
Desde o seu lançamento que se
adivinhava que o último número que encerra esta prequela à saga
Sandman, de Neil Gaiman, et al., teria um fecho directa e
organicamente associado ao início da história da personagem. O
próprio título ou sub-título da obra o implicava, até com os seus
laivos de interpretação musical, uma veia de interpretação quiçá
produtiva: um prólogo “fora da acção” do texto principal, mas
que poderá apresentar tematicamente alguns dos seus elementos
estruturais. Aliás, a maneira como cada um dos números tem
revisitado, en passant, muitas das personagens, temas ou
episódios da saga maior, fará recordar precisamente a estrutura de
um ritornello, tal como a apresentação física das páginas
e a fluidez dos desenhos, na sua heterogenia gráfica, a torna
flexível nessa revisitação. (Mais)
3 de outubro de 2015
VERBD. Episódio 4.
Outro atraso, mas outra chegada. O quarto episódio terá como objecto "a importância de ser publicado", e será muito interessante ver o que se alterou nestes sete anos. Dos fanzines como primeiras escolas para muitos autores aos livros que vão montando a diversidade, e uma ideia sobre o que é ou pode ser o "mercado editorial" português (em alguns aspectos muito diferente, noutros idêntico), os "nossos" autores, e outros convidados, discorrem sobre as suas experiências.
Episódio 1.
Episódio 2.
Episódio 3.
Episódio 5.
1 de outubro de 2015
Participação em Traumatic and Haunting Images.
Serve apenas para informar os interessados, se por acaso passarem amanhã por Ghent, Bélgica, que participarei num workshop dedicado aos Estudos do Trauma, no qual apresentarei uma comunicação em torno de um conceito afecto à banda desenhada. O objecto de estudo é Binky Brown, a autobiografia/ficção de Justin Green, mas há mais a debater.
Apareçam. Mais informações, aqui.
Apareçam. Mais informações, aqui.
30 de setembro de 2015
Gustave Doré. Twelve Comic Strips. David Kunzle (UP Mississippi)
Na esteira do
trabalho do próprio historiador David Kunzle, que abriu as condições para uma
verdadeira investigação do objecto da banda desenhada sob a perspectiva
disciplinar e rigorosa da história, como quase ninguém antes dele, e muitos
poucos depois dele (não sem a possibilidade de perspectivas críticas sobre esse
mesmo trabalho, claro), eis que surge mais um desses objectos incontornáveis na
construção de um complexo, matizado e ainda por definir edifício. (Mais)
29 de setembro de 2015
The Realist. Asaf Hanuka (Boom Studios/Archaia)
Conforme indicámos
no texto sobre The Divine, a leitura de The Realist foi feita no
mesmo enquadramento de expectativas informadas pela leitura, longínqua no tempo
mas presente na memória, da antologia dos dois irmãos Hanuka, a publicação Bipolar.
O que essas leituras cruzadas ou permanentes representam é a ideia de que estes
autores explorariam territórios que se encontrariam entre a tendência, então
emergente, da nova banda desenhada alternativa internacional e alguns
interesses por uma pesquisa específica da fantasia embrenhada no realismo de
maneira a torná-la mais premente, no que diz respeito às experiências do
desejo, fantasia, sonho, sexualidade, anseios, afectos, ou sentimentos que
encontrariam alguma dificuldade em serem expressos de maneira “objectiva”. Uma
tendência que parece informar alguma literatura contemporânea, se tomarmos como
modelos Junot Díaz, Jonatham Lethem, Haruki Murakami, Jonathan Frazen, Tom
McCarthy, e outros, assim como Etgar Keret, autor israelita adaptado por Asaf
Hanuka à banda desenhada na publicação indicada. (Mais)
28 de setembro de 2015
Colaboração no The Comics Alternative: The Divine. Asaf Hanuka, Tomer Hanuka, and Boaz Lavie (First Second)
Remetemos os leitores interessados a mais um texto escrito em exclusivo para The Comics Alternative. Este é dedicado ao mais recente projecto, finalmente em conjunto, dos irmãos gémeos Hanuka, que havíamos acompanhado nos anos 1990 na revista Bipolar. O regresso faz-se em torno de um projecto em colaboração com o argumentista Boz Lavie e que parte da realidade para escapar, sem desculpas, para a fantasia, não sem isso devolver algo da vida real.
No texto refiro-me ao também recente livro a solo de Asaf, The Realist, de que falaremos amanhã.
Ligação directa aqui.
Nota final: agradecimentos à editora, pelo envio do livro em formato digital.
No texto refiro-me ao também recente livro a solo de Asaf, The Realist, de que falaremos amanhã.
Ligação directa aqui.
Nota final: agradecimentos à editora, pelo envio do livro em formato digital.
23 de setembro de 2015
Graphesis. Johanna Drucker (Harvard University Press)
Tal como no caso de TheVisible Text, também este livro, de uma das mais conhecidas teóricas de
livros de artista, mas também da teoria visual e textual e seus cruzamentos mais estimulantes e perturbadores, terá determinados
elementos que se podem tornar interpelantes e úteis para a reflexão sobre o
papel da banda desenhada, ilustração e outras áreas contíguas
na paisagem editorial e da materialidade das artes do livro. Bebendo do design,
da estética, da história editorial, da história da ilustração ou da imagem, e
da sua poderosa relação com o objecto-livro e a cultura do texto, e
subintitulado Visual Forms of Knowledge Production, este volume não é
tanto um conjunto de novas ideias ou propostas de Drucker, mas uma espécie de
curto balanço de algum do seu trabalho dos últimos anos, que se concentra na
conjunção da visualização do conhecimento, ou como é que a apresentação visual
de elementos conduz necessariamente à produção de conhecimento determinado. Por
outras palavras, a escolha formal em relação ao conhecimento a
apresentar é, logo, determinante da natureza desse mesmo conhecimento. (Mais)
22 de setembro de 2015
The Visible Text. Thomas A. Bredehoft (Oxford Textual Perspectives)
A atenção para com um outro tipo de
produção teórica que não necessária e exclusivamente focada na
banda desenhada é método fundamental para garantir não apenas a
saúde da produção de saber afecta a esta área artística, como
medida de controlo da qualidade desse mesmo pensamento. Afinal de
contas, e como temos repetido a propósito de outras esferas e
circunstâncias, se queremos pensar na banda desenhada como uma área
de produção e invenção artística, literária, cultural, ou
outra, tão digna como as demais, devemos compreender que ela é
cultivada no seio de um panorama bastante alargado e que deve ser
atento às múltiplas dimensões do pensamento humano. (Mais)
9 de setembro de 2015
Mould Map 3. AAVV (Landfill Editions)
Qual
a genealogia de um projecto desta natureza? Quando a banda desenhada
é discutida nos nossos dias como um género de literatura – um
erro de palmatória em termos de categorização, mas mais grave
ainda em termos de construção de territórios próprios -, a
característica que mais se salienta é aquela que a aproximará
precisamente à da literatura, a saber, a da sua literariedade.
Mas a atenção para com a “coisa literária” – fabricação
das personagens, psicologização da intriga, estruturação
crono-espacial, a capacidade dos eventos revestirem-se de valores
metafóricos ou metonímicos, as impressões emocionais, etc. –
leva muitas vezes a que se diminua a possibilidade da exploração a
nível artístico: formal, plástico, cromático, material,
espacial-direccional, específico ao sítio, mediático, processual… (Mais) [atenção: imagem pornográfica adiante]