6 de novembro de 2005

Metamorfina. Miguel Mocho e João Sequeira (Bedeteca de Lisboa)


Já era largo o tempo que separava o último LX Comics deste novo, apresentado com um novo design (se bem que a diferença não seja assombrosa). Não me atrevo a afirmá-lo de forma cabal, mas parece-me que a falta de mais números se reparte por problemas de cariz institucional por um lado (e a crise que nos cabe a todos) mas também pela falta de propostas realmente apetecíveis de editar. Este é um projecto interessante, aberto a quem bem entender se lançar numa primeira obra ou num projecto mais controlado, mas nem sempre os autores existentes parecem querer agarrar essa oportunidade.
Metamorfina não destoa dos restantes Lx Comics, mas também não me arece se destacar substancialmente. Inscrevendo-se numa certa continuidade da estética choque e bruta de toda uma escola já provecta da banda desenhada independente (não só portuguesa), assistimos ao problema de um homem e do seu maldito pé. Comédia Negra, Horror Diluído, Teatro do Absurdo, são alguns dos epítetos passíveis de utilizar ao nos referirmos à sua diegese. Os desenhos (uma vez que Miguel Mocho e João Sequeira não são associados a nenhuma das "metades" da criação e eu não perguntei, presumo serem ambos os autores de tudo) são apresentados de uma forma excessiva, teatral, com focos como que em "lente olho de peixe", o corpo abusado nas suas formas, de cabelos esvoaçantes e gestos hiperbólicos... aumentando assim o frenesim e a rapidez com que as acções se sucedem umas às outras. O texto é falsamente "literariazado", ora curvando sobre construções cuidadas ora despojando-se num grito mais vernacular: "O cutelo jazia no chão, junto a um resto de tecido das minhas calças e ao sapato ensopado em sangue. Dentro deste, ainda palpitava o que fora o meu pé". E apesar de usualmente não gostar de letragem mecânica, o uso de letras dactilografadas apenas aumenta o peso e a distância absurda deste texto, sublinhando sempre o aspecto negramente cómico da situação.
O texto de apresentação fala de "kafkiano" mas, mais uma vez, isso é falso e obriga-me a invectivar as pessoas a (re)ler Kafka com atenção. O obsceno e o violento sempre foi apresentado com razões diferidas ou entregues a uma fugidia instância. Metamorfina é mais chão e directo nesse aspecto, e volto a indicar a tradição em que se inscreve. Posted by Picasa

1 comentário:

Miguel Mocho disse...

Nem sei como é que aqui vim dar, mas foi uma surpresa.
Vou visitar o blog com mais frequência!