13 de maio de 2006

Mister I (& O). Lewis Trondheim (Vitamina BD)


Lewis Trondheim é talvez uma das grandes lições de humildade e perseverança na banda desenhada, alguém que transforma o ditado quem não tem cão, caça com gato numa verdade engana os caçadores da primeira categoria, dada a imensa e luxuosa caça que alcançou com os seus “gatos”... Reza a lenda (que nela cada vez mais se torna) que Trondheim não sabia desenhar e então se pôs a repetir um mesmo desenho vezes sem conta mudando apenas os balões (Psychanalyse), procurando assim uma nova forma de poder contar uma história, ou simplesmente desenhando e desenhando e desenhando e esperar que lá para a 500ª página começasse a surgir algum “estilo” (Lapinot). Ver uma bibliografia de Trondheim hoje é já em si um exercício de estudo do que é que isso de “estilo” significa, tal como “género”, “mercado”, “edição”, “linguagem” e as recorrentes fórmulas bicéfalas de “independente” vs. “comercial”, “artístico” vs. “reaccionário”, “experimental” vs. “clássico”, etc.
Esta é uma série que, como não podia deixar de ser, seguirá uma linha que lhe é muito particular. É interessante notar-se que o autor, no seu site, explique que Mister O, sendo uma encomenda, o tenha levado a criar um “gajo idiota” (machin idiot) e um “álbum extraterrestre”, e que não pensava criar um Mister I mas que “olha, mais um livro”... Este acidente leva-nos a pensar que a expectativas dos senhores A, E e U não deve ser extravagante, e cá estará a VitaminaBD para os editar. É curioso também o erro da nossa própria percepção, e li mal o que ele escreveu, tendo lido “máquina idiota” (machine idiote): mas, afinal, é disso o que se trata, tão sentido na obra de Trondheim, que as páginas e os exercícios a que ele se entrega quase que por acaso são de facto uma máquina de criar ideias, que rapidamente ganham um espaço próprio e vão colocando as regras que o autor depois deve seguir... e “olha, mais um livro”.
De facto, ambos os Mister são uma espécie de aproximação dos exercícios oubapianos ou de “variações musicais” sobre um mesmo tema – o qual já ocorria em desenhos animados, e penso sobretudo nas infindas derrotas do Coiote face ao Bipbip/Road Runner – a um território infantil. A personagem principal (cada uma fisicamente semelhante à forma da letra em questão) deseja fazer uma acção qualquer, é impedida por um obstáculo, tenta buscar soluções para ultrapassar esse obstáculo... e falha. A partir daqui, pode ser lançada em situações relativamente verosímeis no “mundo real” como nas mais disparatadas espatafurdices, cada uma delas cingindo-se a uma prancha de idênticas e regulares 60 vinhetas.
Se Mister O era divertido e “limpo” (e confessa-me uma pessoa que o “lia” aos seus filhos), já Mister I é um pouco estranho, por seguir precisamente a mesma fórmula narrativa, o mesmo traço, a mesma trama - lá deve vir a conversa do "minimalismo" outra vez -, mas diversa pela recorrente presença de uma visível morte, onde se nota sangue escorrendo, flutuando, emergindo, flutuando (já para não falar de toda a sorte de excrementos, o que leva à mesma pessoa citada a pensar duas vezes a “ler” estas histórias).
É quase como se face aos azares de Mister O nos pudéssemos rir despreocupados, com redondos e bem dispostos “Ho-ho-ho!”s, mas com as desgraças de Mister I só conseguíssemos uns nervosos e culpados “Hi-hi-hi!”s... Posted by Picasa

3 comentários:

PIL451 disse...

IT'S THE BEST AUTHOR OF COMIX !!!

Nuno Guronsan disse...

Fiquei curioso para ler este... Podes apontar aí que é para me emprestares ;)
Olha, já agora, e actualizações nos livros prósperos? E o regresso da Quinta do Aníbal?? Isso é que era...

Pedro Moura disse...

A Quinta do Aníbal foi fechada por falta de actividade e falta de interesse. Os livros prósperos são injustamente esquecidos... Lá iremos...