Tendo sido este livro editado já há algum tempo, e estando prevista a sua edição em língua portuguesa para breve, é possível que a nossa consideração esteja algo desfasada da sua oportuna e mais alargada recepção. Todavia, tendo em conta que a nossa tarefa é menos a de divulgação do que um qualquer grau de atenção analítica, e movidos por uma certa desconfiança de unanimidades face às fortunas críticas de certos títulos, a pertinência não é totalmente vã. Abster-nos-emos de apresentações sumárias, facilmente recuperáveis noutros locais, e iremos ao âmago do que a sua leitura nos suscita.
Uma das características – não obrigatórias, atenção, mas muito recorrentes ao ponto de parecerem estruturais – da autobiografia (e a autoficção seria aqui englobada, caso que parece ser o deste livro) é a relativa concentração dos instrumentos diegéticos no protagonista, não apenas da perspectiva sobre os acontecimentos retratados no intervalo temporal a que a diegese dirá respeito, mas também das emoções, das sensações, dos juízos de valor sobre os factores todos, etc. Por outras palavras, partindo a história de uma voz/olhar, ela obedecerá ou respeitará os limites dessa mesma voz/olhar. Portugal é diferente nesse aspecto. Algumas vezes seguimos outras personagens nos seus diálogos, a que Simon não teria acesso, nem sequer depois do facto, ou seguimos uma gestão mais próxima da omnisciência narrativa do que a limitação expectável. Não é que essa opção esteja “errada” ou desvirtue um determinado género – afinal, a criatividade, literária ou outra, faz-se precisamente pelos desvios imaginativos que se operam sobre as expectativas dos leitores -, e Pedrosa pode perfeitamente explorar as vozes dos “outros” para criar um espaço de inscrição à voz do seu próprio avatar. O que acontece, porém, é que essas opções – é o que se verifica na visita ao campo para o casamento da prima Agnès – fazem antes o livro aproximar-se de outros géneros mais convencionais, com um grupo maior de personagens, as vontades e acções destes coordenadas num tecido maior e coerente, quando a vida de uma só pessoa nunca é coerente. Ou seja, há uma claríssima imposição de ordem e fechamento narrativo que não se coaduna com o tipo de crises usualmente exploradas pelas autobiografias, mormente aquelas que têm pautado a competência e riqueza particulares no campo da banda desenhada.
É nesse sentido que Portugal tem uma fortuna particular junto a um público mais vasto, não somente pelas suas condições de distribuição económica, claro, mas também pela sua própria estratégia narrativa, já que providencia uma espécie de claro arco conclusivo e apaziguador da vida do protagonista, em claro contraste com outros exemplos, quiçá mais angustiantes – por exemplo Marco Mendes, Alison Bechdel, Debbie Drechsler - mas por isso mesmo mais próximos da condição humana e menos do acto (convencional) literário. Pensamos, então, que a inscrição deste livro de Cyril Pedrosa estará mais perto de outro género: o do melodrama.
O melodrama, sobretudo associado ao meio cinematográfico, foi estudado por Thomas Elsaesser (“Tales of Sound and Fury”, de 1972, é o estudo decisivo) . Tentemos uma sua descrição (utilizando a súmula de S. Bukatman em The Poetics of Slumberland, pgs. 169 e ss.). No mundo do melodrama, encontraremos personagens que habitam um mundo precário, sobre o qual não têm qualquer controlo, ou o qual se apresenta com uma grande resistência aos seus esforços de compreensão e mudança. Essas personagens mostram essa falta de controlo, por exemplo, através de uma inarticulação ou insuficiência da linguagem. No que diz respeito à, digamos, superfície da representação, esse mundo é objectificado através de um excesso estético e de performance: tudo é estilizado, exagerado, as emoções estão à flor da pele. Uma vez que a linguagem não se consegue articular, uma vez que esse veículo claro da razão (sem entrarmos agora no domínio estruturalista ou pós-estruturalista de que a linguagem pode ser tudo menos clara a racional), há duas ou três hipóteses: ou a linguagem se reduz ao balbucio, ao discurso interrompido, ou explode numa torrente incontrolável mas que não é de forma alguma uma transmissão clara. Ou então é através de um excesso de performatividade, quer dos corpos dos actores/personagens quer através das técnicas formais da linguagem em causa (se no cinema falaríamos de cenografia, trabalho de câmara, fotografia, uso de música, etc., na banda desenhada falar-se-á de composição, expressividade dos personagens, a dimensão cromática, etc.). Ao mesmo tempo, ainda sob a influência de Elsaesser, no que diz respeito às representações de sexos, a ideia de uma masculinidade assertiva, confiante, controladora é posta em causa nesse género, e essa ansiedade sexual é demonstrada de uma forma específica ao (mega)género. Bukatman diz que no noir essa ansiedade tem lugar nas figuras da femme fatale, uma “ameaça” exteriorizada, ao passo que no melodrama ela é “interiorizada, criando protagonistas muito mais atormentados e contraditórios” (Poetics, 169). É verdade que o melodrama acabou por ganhar uma presença tão alargada (Hollywood, telenovelas, etc.) que hoje poderá surgir como um cliché, um estilo esvaziado, formulaico e sem qualquer hipótese de ter um verdadeiro impacto, surgindo como um género antirealista, cuja superfície visual, de estilo, de composição é intensificada e mima os estados emocionais e subjectivos dos protagonistas. No entanto, e ainda para seguirmos as citações de Bukatman, desta feita em torno das cartas de Van Gogh (que informam o filme por ele analisado), podem verificar-se de facto essas “inexactidões” mas que se verificarão “mais verdadeiras que a verdade literal”, auscultando as tensões emocionais, as repercussões sobre o ânimo, o espírito, etc.
Pensamos que é claro onde esta ordem de ideias levará. Portugal está mais próximo dessa economia de meios associada ao melodrama do que ao género da autobiografia, que diz respeito antes a instrumentos expressivos e estilos mais próximos dos círculos “alternativos” contemporâneos. Ou então, outro modo de o ver, Portugal é a oportunidade precisa daquilo que em inglês se chama “co-opt” desse mesmo género (a autobiografia) pelos agentes do mainstream: uma incorporação, então, a um só tempo neutralizadora dos traços mais radicais do género – questões de auto-representação do corpo, crises de organização temporal ou até mesmo de personalidade, confronto entre a genuinidade e as fronteiras éticas (veja-se Neaud para uma reflexão profunda desse aspecto no interior da obra de banda desenhada) – e naturalizadora – a exploração do “eu” torna-se uma “história bem contada”, ou algum descritivo frouxo desse tipo.
Simon encontra-se num “mundo precário”, que se reflecte ou expressa através das suas crises de trabalho – não publica há muito tempo, não consegue produzir – , amorosas – a relação com Claire encontra-se num impasse – e familiares –a relação com o pai é feita de encontros casuais e inconsequentes, em que ambos evitam conservar verdadeiramente. Esta personagem mostra uma vontade débil no que diz respeito a compreender de facto esta(s) situação(ões), e apesar de haver sinais da necessária mudança, não há qualquer passo dado. Afinal, é o convite a um festival de banda desenhada a Portugal (Sobreda) que espoletará esse movimento de aproximação de um “centro” que não apenas era deslocado como totalmente desconhecido – ou reprimido – em relação a Simon. Seguir-se-á então o inevitável movimento de aproximação e crise (obedecendo à mais ortodoxa das “estruturas de três actos”).
O livro organiza-se por capítulos claramente delineados em torno de movimentos, não apenas espaciais como temporais e até mesmo de vozes. Cada capítulo é intitulado “segundo”, associando-se depois aos nomes sucessivos de filho-protagonista, Simon, o pai Jean e o avô Abel. No entanto, não se julgue que estamos perante acessos directos às vozes internas, às memórias dessas personagens: Simon é a camada do tempo presente em que tudo ocorre, em que tudo encontra o seu nexo. Não temos acesso ao(s) passado(s) propriamente dito(s), mas antes à impressão desse passado como experienciado por Simon. Não há, portanto aqui, grandes crises de organização temporal. Poderá parecer paradoxal termos falado de acesso a mais que uma perspectiva de personagem e agora falarmos de uma subsunção de todas á voz de Simon, mas referimo-nos a duas instâncias diferentes dessa dimensão: no primeiro caso falamos na superfície actancial, narrativa, dos episódios, no segundo à focalização geral do livro, à sua respiração ética, se quiserem.
Simon não é aquela figura assertiva indicada acima, ainda que tampouco seja uma sua redução ultra-emotiva (como se verifica, por exemplo, em Jeffrey Brown ou o Craig Thompson de Blankets). Se no início o seu traço é a apatia, é de uma forma muito calma que ele se vai expressando e desabrochando enquanto personagem: as mais das vezes através de narrações externas, de “pensamento”, ou de acções silenciosas. Se consideramos os dois grandes objectos de contenda emocional de Simon – a ex-namorada e a sua relação com as raízes portuguesas – verificaremos com facilidade onde se encontram os momentos do silêncio/ balbuciar (as discussões evitadas, a fantasia do “mergulho”, o livro que não se segue, a procrastinação do trabalho, a manca aprendizagem do português, mas também a falta de diálogo com o pai, a ausência da figura materna) e os da explosão não-comunicativa (o telefonema a Claire quando está bêbado, os blocos que se enchem de desenhos nas festas e servem de modo de sedução – uma vez falhando, outra acertando -, mas também a entrega a certos prazeres físicos, desde o consumo de álcool e cigarros ao libertador passeio de bicicleta).
É raro que o círculo da impressão seja ultrapassado para dar lugar à presença dos demais de forma mais moldada. Até a opção em povoar algumas das cenas com corpos apenas delineados e transparentes faz compreender uma redução dos outros a meros complementos circunstanciais dos ambientes retratados, ganhando apenas maior substância quando a interacção com o protagonista a isso obriga. Esse impressionismo perpassa igualmente o tratamento do país “exótico” visitado pelo artista francês. O livro faz menção, como não podia deixar de ser, a toda uma geração que emigrou de Portugal em condições miserabilistas e adversas, mas sem nunca tornar isso na matéria principal da sua estrutura ou discurso. Isto é, no fundo, a dimensão política é apenas reduzida à experiência imediata de quem lhe é familiar, um outro tipo de silêncio que ainda hoje é corrente (ou só lentamente se começa a quebrar).
A representação de Portugal não deixa, com efeito, de ser algo exoticizida. As questões da língua não estar representada de forma sempre correcta é, francamente, de somenos (se bem que, para o leitor português, pelo menos, esse factor, aliado ao tratamento fugidio e semi-fictício aos locais atravessados pelo protagonista, estilhaça o “efeito de realidade” que se poderia - e desejaria? - formar). Mais preocupante parece-nos ser o retrato de um Portugal eternamente ruralista, tradicional (até o primo Alessandro – Alexandre? -, professor de filosofia, frequenta “benzedeiras”) e de uma felicidade fácil – todos falam francês, todos vivem da terra e do sol. Ou da banda desenhada. Se bem que se poderia dizer que o tratamento caricatural é algo constante ao longo do livro, são as personagens portuguesas – o primo Alessandro, sobretudo, mas também as velhinhas na Marinha da Costa – que atravessam um tratamento à Goscinny/Uderzo. Mesmo a rapariga portuguesa que Simon seduz na terceira parte, durante o São João, não tem direito a uma só palavra, o que apenas a torna ainda mais objectificada. E Simon abandona-se a interpretações - que ele chama mesmo “deveras pessoais, suficiente e vagamente esboçadas” (245), mas que não têm jamais um contraponto. O tratamento das tais matérias representacionais – históricas, materiais, económicas – sempre deixadas em esboço confirmam esse tratamento algo nebuloso, impressionista, ensimesmado.
A questão da identidade – não apenas de Simon, que se pretende “redescobrir” ou “reinventar” graças ao encontro catalisador com Portugal e as suas raízes pessoais, mas também do avô Abel que se define como ele mesmo na carta final, à margem da nacionalidade, e eventualmente toda a família que dele descende e aqui participa – é apenas uma espécie de vaga referência, sem nunca se tornar uma marca verdadeiramente estruturante do relato, nem se constituir numa espécie de ferida, vinco, mancha que tintasse toda a experiência que se vê desenvolvida ao longo das páginas. Afinal, torna-se apenas uma pequena escusa, um pretexto que não é constitutivo do texto.
Não se entenda de maneira alguma que esta leitura se pauta por qualquer tipo de defesa da cultura portuguesa em particular, o que seria irrelevante na abordagem crítica. Trata-se tão-somente de, mais do que sentir qualquer tipo de “vergonha” ou “orgulho”, colocar a questão se Portugal, este livro de banda desenhada de Cyril Pedrosa, se apresenta de facto com instrumentos estruturais, estilísticos, narrativos e ambientais que o tornem significativo enquanto obra de banda desenhada – já que em termos de mitologia local, é óbvio ter conquistado as praças costumeiras.
Temos, neste nosso espaço, repetido a seguinte citação (ou imagem) de Jorge Luís Borges. No prólogo ao seu livro de poemas Os Conjurados, escreve o seguinte: “…a beleza, tal como a felicidade, é frequente. Não se passa um dia em que não estejamos, um instante, no paraíso. Não há poeta, por medíocre que seja, que não tenha escrito o melhor verso da literatura”. Ela serve-nos como uma espécie de utensílio conceptual que nos deve obrigar sempre à busca, na leitura de um livro qualquer, de qual o seu “melhor verso”, qual o momento em que consegue proporcionar o instante de paraíso. A nosso ver isso ocorre neste livro nas páginas 154 e 155, que se encontram lado a lado, mas não compõem uma unidade visual nem narrativa, mas tampouco um contraste absoluto entre si. Quer dizer, são apenas dois momentos isolados – ou isoláveis analiticamente - entre si, com algumas linhas de união naturalmente (que decorrem da própria diegese e da psicologia insuflada no protagonista e suas circunstâncias), mas podem ser lidos individualmente como “máquinas menores” de criação de significado.
A primeira mostra “um instante de paraíso” tal como experienciado por Simon, que lhe serve para desistir de se apegar a uma forma de melancolia, isto é, de se relacionar com o passado. Até aquele momento, o (imediato) passado era uma canga para ele, pela maneira como se havia separado de Claire. Esse peso é literalmente “jogado fora” com o bonequinho que ele aperta, e que lhe servia de uma espécie de dispositivo de defesa em relação aos confrontos, evitados, com Claire. Ao mesmo tempo, esse acto servirá de eixo para finalmente se dirigir a ela de maneira adulta e conclusiva (o telefonema que se decide a fazer na página seguinte, e que é contraponto de um outro telefonema, estúpido, que lhe havia feito bêbado e insultuoso). O “paraíso” imiscui-se nesta página pela forma controlada como começamos com uma cena panorâmica que encima toda a página, afastada do protagonista, mas cuja dimensão sonora lança uma linha de associação. Segue-se-lhe a “caixa” de oito vinhetas, de composição retórica, que voga em torno de Simon e as vacas no riacho, e o trajecto do bonequinho: quando regressamos a uma visão panorâmica, já Simon a abandonou. O modo como o meganarrador cria um diálogo somente entre as onomatopeias entre o bonequinho e o mugir das vacas faz também surgir uma ideia de comunicabilidade – cujas falhas é tema de Portugal – que vai para além do verbo.
A segunda página não deixa de estabelecer uma relação com a comunicação verbal também, mas desta feita optando-se por um discurso claro, nítido, contínuo e fluido, mas que se destaca incorporeamente dos “quadros” visuais a que temos acesso. Formalmente, esta prancha é simples – uma grelha regular (3 x 4) – mas efectiva. Uma enfermeira fala com a tia de Simon a propósito da saúde da sua mãe (que vemos a assoar-se no sofá), e esse diálogo continua até que ela se vai embora da casa no carro (na 10ª vinheta), seguindo-se duas vinhetas “silenciosas”. Mas entre a primeira e a última vinheta da enfermeira, atravessamos oito cenas em que nenhuma das personagens envolvidas no diálogo surge, optando-se antes por vogarmos em torno da casa junto aos outros membros familiares, com uma clara concentração em Simon, cujas acções de dilatam ao longo da coluna central (vertebral?) da página. Existem palavras invisíveis – que dizem as outras personagens nos seus diálogos, que gritam as crianças no rio? - e existem acções invisíveis, e é no cruzamento dessas linhas visíveis e invisíveis que a decisão de Simon – telefonar a Claire, pôr um ponto final da sua história amorosa, avançar na sua vida – se torna mais significativa. Poderíamos simplesmente ler as palavras que são ditas como “comentários laterais” à própria situação de Simon (uma técnica que encontramos utilizada de forma acabada em Watchmen, por exemplo). Mas essa disrupção entre o verbo e a imagem poderá ter uma dimensão ontológica moderna, que terá a ver com a tal diluição das certezas, da absoluta confiança nos sistemas de representação (de que o discurso verbal, e até racional, faz parte). Até o facto de na quinta vinheta vermos Simon a subir para a esquerda e de costas da cena, algo que intuitivamente vai “contra” o sentido da leitura, sublinha a natureza melancólica e melodramática a que temos aludido ao longo do texto.
Cyril Pedrosa pertence a toda uma nova geração de autores franceses cuja prestação do desenho é muito manual, caligráfica, como não temos deixado de repetir a propósito de Sfar e outros autores. Nesse aspecto Pedrosa integra-se perfeitamente numa escola contemporânea do seu país, e não se destaca particularmente, apesar dos encómios que se tecem nesse sentido. A qualidade das cores, por exemplo, com filtragens luminosas, nimbos, jogos cromáticos que diferenciam a figura do fundo, alteram contrastes e subsumem tudo a um “ambiente” coeso – ora naturalista, respeitando-se a forma como uma fogueira iluminaria os corpos à noite, ora fantasioso, como os verdes dos “mergulhos oníricos” do protagonista – trabalho esse provavelmente feito através de recursos digitais, sublinha uma certa qualidade próxima da do cinema de animação, como se se tratassem de tintas sobre acetato, ou um daqueles livros utilizam os stills dos filmes para criar uma versão em papel. Até mesmo o estilo alongado dos corpos desenhados por Pedrosa, aliado às finíssimas linhas que os compõem, figuras esquálidas, expressivas e plásticas, são aproximáveis do de um Silvain Chomet. Há casos de aguarelas belas, muito visíveis, mas em menos momentos das liberdades expressivas que ela permite do que se pensa – talvez no soberbo jardim outonal em Marinha da Costa (página 241, em baixo), ou na página ilustrada da carta de Abel, na sua tradução final – e as mais das vezes são competentes, acabadas, conseguidas, mas jamais audazes (não estamos a falar da exuberância de um Sfar, de um Baudoin ou um Guibert, afinal, nem tampouco do lirismo de um Pratt ou a mestria férrea de um Emmanuel Lepage). A escolha em colocar legendas externas, do protagonista-narrador, em “cartuchos” transparente e com letras mecânicas é visualmente pobre, destoando sobremaneira com a gestualidade fina e célere que parece regular todo o trabalho do autor. Regressando às lições de Elsaesser sobre o melodrama, aos elementos que ele aponta – que acreditamos estarem patentes em relação a esta obra – é nestes aspectos que encontramos um certo “excesso de performatividade”, ou melhor, uma certa desvinculação entre o fundo e a figura, o conteúdo e a forma, a matéria e o tema: exuberante visualmente, talvez, mas seguro, senão mesmo inócuo, nas outras frentes.
Por outras palavras, esta obra é competente (o domínio das ferramentas estruturais e narrativas da banda desenhada, pelo autor, é inegável, mas mais uma vez esse é apanágio do tal “excesso”), mas não é, de todo, uma reflexão e uma crise profunda (como o será, por exemplo, o novo livro de Bechdel, Are You My Mother?). Se nos permitem um jogo transparente de conceitos, quer na sua origem quer no seu efeito, este livro proporcionará uma boa leitura-movimento mas não uma complexa leitura-pensamento.
Nota: agradecimentos a Frederico Duarte, pela oferta do livro, e a sua insistência.
27 de junho de 2012
Portugal. Pedrosa (Dupuis)
Publicada por Pedro Moura à(s) 10:19 da manhã
Etiquetas: Autobiografia, França-Bélgica
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2 comentários:
Bom trabalho gráfico + narrativa bocejo?
ou a bd bedófila nouvelle vague comme il faut?
para Portugal está bem, mais que isso säo modernices
Excelente texto, como sempre. Surpreendente neste livro é o sucesso estrondoso que obteve, com todo hype mediático, etc. Algo funciona na cabeça dos portugueses como um clic, quando um artista estrangeiro fala de nós. Aqui tão sozinhos... Na verdade não passa de um livro medíocre, um enlatado como tantos outros, para vender nos escaparates dos nossos hiper-mercados. Abraço!
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