Como já havíamos debatido a propósito de obras tais como Dragon Head, Blame!, Defier, ou outras com que as havíamos comparado, também este curto (36 pranchas) episódio de uma história maior (que apenas no site descobrimos terá um segundo e último volume) lança o leitor de imediato no meio de uma acção frenética a desenrolar-se, para apenas mais tarde ter uma breve oportunidade de encontrar um recuo temporal que permite construir um contexto maior, mas nunca uma explicação final. Isto é, esse recuo afinal apenas nos confunde e nada explana. Um homem foge de uma criatura tremenda, monstruosa, que outros homens haviam guardado. No entanto, não nos parece que esses mesmos homens tenham qualquer controlo efectivo sobre essa criatura, e parte dessa falta de efectivo domínio passa por um sacrifício físico que não é visível no desenho da capa - a qual, na verdade, oculta esse sacrifício. Mais, esses outros homens parecem instigar o protagonista à fuga, que ocupa a maior parte do livro, mas também participam nela.

Há uma urgência no desenho que mima ou segue a urgência do protagonista. Essa palavra surge-nos de ímpeto, obrigando-nos a percorrê-la na sua exactidão, como a que mais se coaduna ao trabalho gestual de Luca Conca - etimologicamente ela relaciona-se com uma pressão exercida, que por sua vez devolve à ideia de trabalho. Conca é pintor, numa nova cena figurativa da Itália contemporânea, e tem-se dedicado à banda desenhada mais recentemente, tendo saído um livro anterior a este em colaboração, mas que desconhecemos (Il Ritratto). Daí poderemos inferir que se encontra munido com instrumentos precisos no que diz respeito à figuração, às escolhas composicionais e a cromatismos, mesmo que queiram ver na academia um sarilho de espartilhos. Desenganem-se, porém, se pretenderem ver na urgência exercida, e que sublinhamos, neste livro - que não pode de forma alguma ser visto como “um campo de descontracção do pintor”, ou coisa que o valha - a ideia de uma sumária abordagem da inscrição dos traços, de uma pressa impensada ou irreflectida, ou sequer de uma procura tacteante, ao acaso, das formas que depois emergiriam: cada vinheta apresenta uma profusão de riscos justapostos, cruzados e mesclados que denotam um aturado e ponderado trabalho, quase zen talvez, que visita as formas e os melhores modos de as transmitir em linhas num papel, até mesmo de acordo com princípios de um virtuosismo académico que se vê assegurado mas abandonado onde necessário, ou desviado onde necessário, e que depois se consubstancia numa veloz

A vertigem densa e a urgência é dele.
Nota final: agradecimentos a Jorge Coelho, pelo empréstimo do seu livro.
5 comentários:
o horror na bd consegue no máximo um sorriso; näo funciona
Concordo, sobretudo quando nos rimos às gargalhadas com o "horror" de certos trabalhos... Não é?
:)
Rabanadas!
näo tem nada a ver com o "horror" dos trabalhos, tem a ver com as limitacöes do papel ...pensei que dava para entender à primeira
muchas gracias!
De nada, obrigado eu!
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