Ora, é como antídoto dessas sensações de fastio que surgem
projectos como este. Pequenas pílulas breves de piadas breijeiras, brutas,
violentas que são um bálsamo à candura que tentas vezes se tem de mimetizar
junto aos mais pequenos. Nem sempre se poderá mesmo falar de bons trocadilhos, por vezes é mesmo bruto. Fantasias que nos ocorrem ao ler a história dos três
porquinhos e salivamos junto com o lobo, ou ao pensar na canção da Capuchinho
Vermelho e nos fazem salivar com o lobo, ou ao ver o filme das princesas e nos
fazem salivar com o lobo. “Salivar com o lobo” poderia muito bem ser um título
ou descritor para descrever estes objectos. Bad
Little Children’s Books é um livro supostamente constituído por capas
alternativas de vários livros infantis criadas por Arthur C. Gackley, que teria
vivido na década de 1960 e 1970 fechado numa cave a burilar pacientemente estes
desvios. Munido de instrumentos como tesoura e cola (ou mais provavelmente, o
Photoshop), reconhecem-se as matérias-primas originais que foram por ele conspurcadas
para criar promessas de histórias em que todas as personagens de crianças
delicadas, animais respeitosos e projectos didácticos eram raptadas para
territórios mais… perigosos. Grande parte do humor destas imagens parte do lado
negro da correcção, naturalmente, do choque, do limite do decoro transposto, do
prazer malévolo em destruir um brinquedo. Se dar um pontapé num castelo de
areia ou esmagar uma torre de legos ou esborrachar um boneco de chantili num
bolo é uma atitude infantil, não deixa de ser o prazer que com isso se sente da
mesma natureza dos sorrisos que cada uma destas capas libertará.
Aparentado como livro de Adam Mansbach, Go the F**k to sleep, traduzido entre nós como Vai dormir, f*da-se, de que falámos a propósito do La famille de Vivès [e também com o Gémeas marotas, ver secção de comentários], Bad Little Children’s Books é uma
espécie de détournement dos textos
originais mas que pouca intenção tem em que se ponderem os problemas inerentes
deles para chegar a um sentido mais iluminado. Não quer isto dizer que não se
possam “descobrir” significados ocultos que estavam desde logo previstos nos
textos originais, sobretudo aqueles que escondiam uma certa ambivalência
racial, a violência social, as discrepâncias entre os sexos, etc., que se
verificariam nas sociedades que deram origem a esses livros, mas isso quase que
ocorre por acaso. É uma mais-valia de um gesto que apenas quer atirar lama,
senão coisa pior, á cara dos leitores.
Todavia, é mesmo essa libertação da canga social, uma espécie
de regresso (regressão) enfática a uma expressividade bruta, que encerra o
divertimento que ele tem.
Nota
final: agradecimentos à editora, pela oferta do livro.
3 comentários:
não te esqueças das Gémeas marotas, publicadas em Portugal sabe-se lá por quem...
:)
http://chilicomcarne.blogspot.pt/2015/12/as-gemeas-marotas.html
Na verdade, lembrei-me imediatamente desse livro, mas como estupidamente o não comprei na altura, não tenho a certeza se o conseguirei caçar novamente (presumo que sim). Mas é verdade que pertence à mesma família... uma badalhoquice!
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