“Depois da casa roubada, trancas à porta”. No caso da Casterman deve este ditado ler-se, “depois de roubarmos casa alheia e vos roubarmos, trancamos a porta”. É necessário algum peso e medida em aceitar totalmente as palavras que Jean-Christophe Menu dedicou ao facto da Casterman e outras editoras terem “metido a foice em seara alheia” (hoje é dia de ditados) no território das editoras alternativas, mas não é sem total razão que houve uma aproximação dessas grandes casas a experiências editoriais e conceptuais estreadas por outras plataformas mais livres das regras (impositivas, redutoras) do mercado livreiro existente. A colecção Écritures é precisamente o osso de contenção que Menu apresentou em Plates-Bandes, e que agora, depois de uma relativamente interessante oferta de títulos chegou ao fim, anunciando-se porém a sua transformação – tal como, de certa forma, Écritures era uma transmutação de formato das sinergias anteriormente presentes na sua colecção Romans (A Suivre). Dessa oferta, nota-se um drástico menor destaque no que diz respeito à qualidade dos títulos franceses originais e contemporâneos do que as edições em francês de autores estrangeiros: um punhado de autores da Ásia, como os sul-coreanos Kim Dong-Hwa e Park Kun-Woong, vários títulos de Taniguchi, Hideji Oda, outros dos norte-americanos e canadianos Craig Thompson, Chester Brown, Seth, Ben Katchor e as primas Tamaki, a recuperação de vários títulos de Baru e do pulp L’Ombra, de Pratt e Ongaro. A excepção dos títulos contemporâneos franceses pertence, naturalmente, ao La Pluie, colaboração repetida de Lambé e De Pierpont, se bem que Mariko Parade, de Boilet e Takahama, não seja totalmente desprovido de interesse mas parece ser uma espécie de conquista lateral de públicos, uma vez que ambos poderiam estar na colecção Sakka.
Esta estratégia de ter um olho numa certa produção asiática, presente na Sakka e aqui, e a possibilidade de apelar à excelente rede organizacional das intituições políticas e culturais francesas (os serviços culturais das embaixadas e a Alliance Française), levou a que explorassem três momentos de relações internacionais pela banda desenhada: primeiro no Japão, depois na Coreia do Sul e finalmente na China.
Se já o título da Coreia apontava para um decréscimo do interesse dos trabalhos reunidos, por uma questão de se limitarem – quiçá por um menor conhecimento da diversidade local, quiçá por interesses comerciais nos autores que se prevêm editar na editora francesa – a autores de segunda linha, este volume acaba por nos ofertar com trabalhos ainda menos interessantes.
Os autores chineses oscilam muito entre aventuras rápidas com pequenos clichés de acção e humor, ficção histórica ou lições de cidadania, ou incursões numa mangá em segunda mão. As únicas excepções vêm pela mão de Zhang Xiao Yu (com outros títulos traduzidos em França), com uma pequena história que mistura o quotidiano rural chinês com um laivo de fantasia e uma certa ideia de banda desenhada contemporânea que nos fará recordar trabalhos da década de 70 e 80 nas várias revistas italianas e espanholas, e Chihoi, que, num estilo similar ao de Amanda Vahamaki, explora a complexa questão da liberdade nacionalista e democrática do povo de Taiwan, curiosamente apelando à sua herança pós-colonialista inglesa.
Quanto aos franceses, encontram-se exemplos de pequenos relatos da história da cidade visitada a pequenas parábolas, ora mais fantasiosas ora mais de “consciência política”, em torno da “vida chinesa”. Neste grupo de autores, as únicas excepções cabem Anne Simon (herdeira de Sfar), com uma pequena rábula de concubinas e eunucos abjectos, mas cujo estilo gráfico permite criar um estranho ambiente de leveza, e os irmãos Olivier e Denis Deprez, mas cuja história acaba por se tornar igualmente um exercício bastas vezes repetido: a impossibilidade de conhecer um país como a China em pouco tempo, as contradições políticas e culturais patentes, o choque entre as expectativas criadas pela ficção e pela distância e a realidade vista directamente com os olhos.
De facto, talvez o subtítulo da antologia seja mesmo correcto: “olhares cruzados”, mas não encontrados.
Esta estratégia de ter um olho numa certa produção asiática, presente na Sakka e aqui, e a possibilidade de apelar à excelente rede organizacional das intituições políticas e culturais francesas (os serviços culturais das embaixadas e a Alliance Française), levou a que explorassem três momentos de relações internacionais pela banda desenhada: primeiro no Japão, depois na Coreia do Sul e finalmente na China.
Se já o título da Coreia apontava para um decréscimo do interesse dos trabalhos reunidos, por uma questão de se limitarem – quiçá por um menor conhecimento da diversidade local, quiçá por interesses comerciais nos autores que se prevêm editar na editora francesa – a autores de segunda linha, este volume acaba por nos ofertar com trabalhos ainda menos interessantes.
Os autores chineses oscilam muito entre aventuras rápidas com pequenos clichés de acção e humor, ficção histórica ou lições de cidadania, ou incursões numa mangá em segunda mão. As únicas excepções vêm pela mão de Zhang Xiao Yu (com outros títulos traduzidos em França), com uma pequena história que mistura o quotidiano rural chinês com um laivo de fantasia e uma certa ideia de banda desenhada contemporânea que nos fará recordar trabalhos da década de 70 e 80 nas várias revistas italianas e espanholas, e Chihoi, que, num estilo similar ao de Amanda Vahamaki, explora a complexa questão da liberdade nacionalista e democrática do povo de Taiwan, curiosamente apelando à sua herança pós-colonialista inglesa.
Quanto aos franceses, encontram-se exemplos de pequenos relatos da história da cidade visitada a pequenas parábolas, ora mais fantasiosas ora mais de “consciência política”, em torno da “vida chinesa”. Neste grupo de autores, as únicas excepções cabem Anne Simon (herdeira de Sfar), com uma pequena rábula de concubinas e eunucos abjectos, mas cujo estilo gráfico permite criar um estranho ambiente de leveza, e os irmãos Olivier e Denis Deprez, mas cuja história acaba por se tornar igualmente um exercício bastas vezes repetido: a impossibilidade de conhecer um país como a China em pouco tempo, as contradições políticas e culturais patentes, o choque entre as expectativas criadas pela ficção e pela distância e a realidade vista directamente com os olhos.
De facto, talvez o subtítulo da antologia seja mesmo correcto: “olhares cruzados”, mas não encontrados.
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