29 de maio de 2015

Em terra de cus, quem tem rei é cego. Miguel Carneiro e convidados (Oficina Arara)

O trabalho de Miguel Carneiro tem sofrido inflexões sucessivas no traço desde os seus primeiros tempos de produção de banda desenhada e ilustração. Se o autor iniciara a sua “carreira” em pintura, e desde logo em territórios em que o controlo absoluto de certas técnicas se aliava a um humor corrosivo que pregava rasteiras na percepção e no posicionamento do espectador, as primeiras histórias publicadas pelo pequeno colectivo A Mula (co-fundado com Marco Mendes, mas contando sempre com uma mão-cheia de colaboradores recorrentes) remetiam não apenas a um imaginário semi-popular como a um desenho de aparente natureza tosca, como se se tratassem de um encontro, pouco fortuito de resto, entre aqueles desenhos de cartoons e gags dos anos 1950 em revistinhas cómicas e o rabisco de casa de banho. Urgente, tremido, directo, franco, servia que nem uma luva aos breves chistes, cobertos de trocadilhos, dislates, traduções selvagens e filosofia de pacotilha, ou lições de vida profunda interrompidas por flatulências, matéria perfeita para a eterna galeria de personagens que se foram mantendo: o Sr. Pinhão, o cego cantor, o dinossáurio que corria, o homem com cabeça de galinha, a zebra, a catatua (ou seria arara?), as mulheres agravadas, e por aí fora... (Mais)

24 de maio de 2015

"Mester, Papel e Ofício", na colecção Abstrusa (Oficina do Cego)


Neste domingo solarengo, gostaríamos de anunciar - para os interessados - que a Oficina do Cego acaba de dar à luz um dos últimos pequenos volumes da colecção Abstrusa, Mester, Papel e Ofício. 

Trata-se de uma colecção de oito octetos octossílabos escritos numa linguagem de sabor antigo, gongóricos, talvez. As "ilustrações" são padrões de fundo tipográfico feitos por João "Papeleiro Louco" Sebastian.

A tiragem é de 51 exemplares e estará à venda no próximo fim-de-semana no Atelier Re.Al, integrado no encontro O que um livro pode, co-organizado pela Oficina. 

"Lançamento" oficial será daqui a umas semanas. 

23 de maio de 2015

Colaboração no du9. Here, de Richard McGuire.


Serve o presente post para indicar que está disponível no du9, em francês e inglês, um pequeno ensaio sobre Here, de Richard McGuire, o corolário em forma de livro de um projecto que o autor tem revisitado de vários modos desde 1989, nas páginas da 2ª edição da Raw.

Se a história curta se tornou rapidamente um dos mais altos expoentes da abertura conceptual da banda desenhada, admirada pelos mais diversos autores, a sua extensão enquanto um livro levanta várias outras questões, não sendo a menor até que ponto um "exercício" pode ser revisitado e transformado. Um livro a um só tempo simples e complexo, leve e denso, linear e multidimensional, Here é um daqueles livros que raramente rasga as fronteiras deste território.

Poderão aceder ao texto aqui. Aproveitem para ler a entrevista conduzida por Xavier Guibert. 

Agradecimentos a Benoît Crucifix, pela troca de ideias e a tradução paciente.

20 de maio de 2015

Fatale, Tony Chu, Saga. AAVV (G. Floy)

Uma vez que não acreditamos em causalidades simplistas (as quais implicam que o consumo de certas substâncias só poderá levar a uma sua escalada, que existe uma correlação entre o uso de um determinado tipo de jogos, livros ou música a um comportamento também determinado, etc.), mas antes numa fenomenologia social complexa que toma em conta os mais variados factores, num contexto sócio-económico, relacional, familiar, alargado, também não acreditamos numa necessidade de cadeias de leituras fechadas. Isto é, a chegada de um leitor a certos textos poderá advir dos mais variados quadrantes. Todavia, penso que não será muito errado imaginar que a existência de alguma variedade editorial num país, isto é, a fabricação de um “mercado”, poderá contribuir para uma consolidação da circulação de textos, leitores, e até mesmo recepção, crítica ou outra. (Mais) 

18 de maio de 2015

Comment naissent les araignées. Marion Laurent (Casterman)

A produção da Casterman é imparável, não se tratasse esta de uma das principais casas editoras da banda desenhada francófona, se não mesmo a mais importante editora belga da actualidade em termos de presença no mercado. No entanto, para que essa máquina esteja sempre alimentada, essa produção precisa de ser mais intensa e diversificada em quantidade, o que leva também a que nem todos os seus momentos sejam particularmente fortes. De quando em vez, porém, existem projectos que mesmo no interior dos seus territórios comerciais ou de negociação entre o alternativo e o genérico, o contemporâneo e o convencional, conseguem conquistar algum espaço crítico. É o caso deste volume de Marion Laurent, o seu primeiro livro longo a solo. (Mais) 

15 de maio de 2015

Outras Literaturas: Próximo Futuro é hoje.

Serve o presente post para recordar que a mesa-redonda que havíamos anunciado aqui, integrada no programa da Gulbenkian, e coordenado e moderada por este vosso criado, terá lugar hoje das 15h às 18h.

Uma oportunidade única para conhecer três autores bem distintos - (na foto: Marcelo D'Salete, Posy Simmonds e Anton Kannemeyer) -, mas todos eles com um trabalho interpelante no que diz respeito ao modo como a banda desenhada questiona a noção de identidade, e a sua integração social.

14 de maio de 2015

Cumbe no Próximo Futuro.

Serve o presente post para indicar aos interessados que a edição portuguesa de Cumbe, do artista brasileiro Marcelo D'Salete, estará amanhã à venda em estreia absoluta na Fundação Calouste Gulbenkian, com a presença do autor. (Mais)

12 de maio de 2015

Janus. Lala Albert (Breakdown Press)

Esta nova etapa de Lala Albert vai um pouco mais longe dos dois últimos títulos de que faláramos, mas ainda assim não podemos crer que a autora alguma vez deseje mergulhar nas águas confortáveis das narrativas convencionais. Na verdade, Janus permite fazer o exercício de apresentar uma sinopse que pareceria “natural”, quer na sua estrutura quer na psicologização das suas personagens, mas perder-se-ia certamente a tradução da sua ambientação aberta, as estranhas emoções e o permanente questionamento das suas linhas mais profundas. (Mais) 

11 de maio de 2015

Fanzines e outros animais.



Os fanzines estão de viva saúde e recomendam-se. A Feira Morta – tal como Festival de Beja e outros momentos - continua a ser um excelente ponto de partida e de encontro para a produção actual, e é curioso notar o surgimento de novos projectos quer de novos agentes quer de veteranos, mas onde a circulação tem o mesmo peso. Existem outros canais de distribuição destes objectos, é claro, sendo a correspondência um dos principais, mas estamos em crer que a organização de certames específicos leva as coisas a melhor porto. Remetendo a experiências anteriores neste espaço, faremos aqui algumas considerações sobre alguns títulos que nos chegaram às mãos, ora na Feira Morta, ora por outras vias. Diferentes entre si, criam também uma comunidade alargada que explicitará o que antes já expuséramos (há muito!) em “Um fanzine é…” (Mais) 

8 de maio de 2015

"Sem mutantes nem convervantes", no Buala.


Mais uma vez, gostaria de recordar os leitores do LerBD que na próxima Sexta-feira, pelas 15h, terá lugar uma mesa-redonda com alguns autores de banda desenhada internacionais.

Serve este post, porém, para partilhar o texto escrito para o jornal do Próximo Futuro, e que foi também publicado no site Buala. Fica aqui a ligação.

6 de maio de 2015

Moi, René Tardi, prisonnier de guerre au Stalag II B, Vols. 1 e 2. Jacques Tardi (Casterman)


Jacques Tardi é um dos autores que, nos anos 1970, ajudou ao desenvolvimento do que seria visto depois como a “veia literária” da banda desenhada. O seu trabalho teve, quase desde o início, contornos explicitamente políticos, de esquerda, em que procura estudar os fenómenos de injustiça, sobretudo aqueles que têm repercussões na construção da identidade nacional. Em parte, é isso o que justifica a sua particular atenção para com períodos precisos históricos da França. (Mais)

4 de maio de 2015

Três títulos. Francisco Sousa Lobo (várias editoras)


Como já havíamos discutido a propósito dos seus trabalhos anteriores, Francisco Sousa Lobo parece ser um daqueles autores que, como Baudoin e Marco Mendes, entre outros, transforma todo e qualquer passo do seu percurso em pequenas partes de um todo perfeitamente integrável. Para repetirmos as mesmas ideias anteriormente esboçadas, não se trata somente de agregar os trabalhos num conceito quantitativo como “obra”, muito menos o de reduzir cada título a “episódios” de uma “série”, etc. É compreender que existe um pulso e uma intensidade em continuidade em cada trabalho, seja ele um livro (e seja que género formal for, “novela”, “romance”, “autobiografia”, “ensaio”), revista ou curta numa antologia. No caso de Lobo, aquilo se verifica é uma exploração em torno de questões de identidade, sobretudo uma identidade em crise por assaltos de ordem psicológica, muitas vezes clínica, e que se endereça às questões levantadas pelo projecto do momento. (Mais) 

1 de maio de 2015

Calculus Cat. Hunt Emerson (Knockabout)

Se bem que seja possível estarmos a reduzir a produção de Hunt Emerson a pouca coisa, diríamos que este autor tem como seus principais territórios temáticos o humor desabrido e o erotismo, ainda que este último, seja sob a forma da série Firkin, the Cat ou as adaptações literárias (sendo Lady Chatterley's Lover o primeiro e de maior reconhecimento), esteja muito formado por uma abordagem igualmente humorística. E, também sendo possível estarmos a incorrer numa redução injusta, é Calculus Cat a sua personagem mais famosa, icónica e que terá surgido em mais locais, tendo começado numa publicação americana, na verdade. (Mais)