3 de setembro de 2006

Tres Viajes. Miguel Gallardo (Edicions De Ponent)


Este é um livrinho surpreendentemente simples, de uma inventabilidade cândida, mas que por isso mesmo ganha direitos de cidadania numa prateleira atenta a este campo da criação. Miguel Gallardo é um artista com um percurso interessante, que emprega um estilo aparentemente simples e até “pop” para histórias absurdas, tendo pertencido ao grupo espanhol que dinamizou a cena a partir dos anos 80 (a “línea chunga”, El Víbora, etc.).
Neste livro Gallardo opta por uma sublimação das suas aproximações gráficas, reduzindo as personagens humanas a um conjunto simples e directo de traços mínimos que estabelecem um “retrato” quase icónico, e os objectos a uma representação quase infográfica, que passa pela referência ao desenho infantil ou ao símbolo. Compreender-se-á essa opção pelo facto deste livro, no formato, na textura da capa, as guardas e outros pormenores, recordar um passaporte. Tres Viajes é um diário de não obstante o título, quatro viagens: a Tel Aviv, Buenos Aires e Turim, como indicado na capa, mas ainda um curto apontamento sobre Nova Iorque. Nessas páginas, registam-se os percursos e mapas, os encontros e as idiossincrasias das gentes, as comidas e as compras, pequenas anedotas ou observações... Sempre terminado com um pequeno glossário “de sobrevivência” que revela mais um humor tortuoso do que preocupações linguísticas. A impressão a duas cores ajuda a um salientar muito singelo de alguns dos aspectos testemunhados nas viagens, se bem que não reestruture a leitura e percepção do que se apresenta (como acontece, por exemplo, em alguns trabalhos de João Fazenda e de Paulo Patrício).
Não sendo um exercício de introspecção como o pretende ser o Carnet de Voyage de C. Thompson, nem um profundo olhar sobre uma cultura diversa como a obra de Guy Deslile, Tres Viajes está mais próximo de Japon 17, abrindo um espaço de um olhar cheio de humor sobre o “outro”...
Nota: mais uma vez, o scan da capa do livro não deixa entender os reflexos dourados das letras sobre o papel azul conqueror; mais, agradecimentos a Richard Câmara por ter tido o trabalho de mo comprar e carregar até mim. Posted by Picasa

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